tapinha no ombro

Tapinha no ombro. Por Aylê-Salassié Filgueiras Quintão

Ex-presidente chinês Congresso do Partido Comunista da China

Conformado ou surpreso, Hu Jintao deu um tapinha no ombro de Li Keqiang como se dissesse não se assuste. O ex-presidente da República Popular da China (2003 a 2013), e ex-secretário geral do partido Comunista, Hu Jintao, estava sendo retirado do Grande Salão, onde se realizava na semana passada, o Congresso Nacional do Povo, que decidia os caminhos da China para o futuro próximo. E, parece que a herança de Hu Jintao, um reformista, vai para as prateleiras da História. Há indícios de que os padrões vigentes vão ser totalmente alterados. Do Congresso está surgindo um novo “timoneiro”, como foi apelidado o líder comunista Mao Tsé Tung, que morreu no Poder (1949-1976).

 Aqui, quando Bolsonaro colocou a mão no ombro de Lula, durante um debate televisivo, nada amistoso, Lula perdeu a fala. Foi aconselhado depois a tomar banho de sal grosso. A nossa colega jornalista viu no ato de Bolsonaro uma atitude de escárnio, “violência passiva agressiva”. Estaria ele mostrando uma superioridade física (1,88 m para 1,68m) e pretendendo, metaforicamente, dizer que podia contemplá-lo, sem temores, de cima para baixo. Uma grosseira analogia da visita de Mussolini (1,69 m), da Itália, a Hitler (1,75m), à Alemanha. Uma tentativa de humilhar. Lula ficou sem reação, da mesma forma como o ditador fascista Mussolini sentiu-se incomodado com os artifícios cerimoniais do ditador nazista. No debate televisivo do dia 28 próximo está proibida qualquer aproximação entre debatedores.

Veja-se. Mão no ombro de Lula, Bolsonaro usou sua  suposta integridade  para  explicitamente acusar o ex-presidente de, em sua gestão na Presidência da República,  ter  endividado o Tesouro com mais  R$ 900 bilhões, de ter feito investimentos em refinarias que nunca foram concluídas,  de ter comprado outra sucateada em Pasadena (EUA), além de acuá-lo de  entregar, gratuitamente, duas refinarias brasileiras para o ex-presidente da Bolívia, Evo Morales.

Irritado, o ex-presidente respondeu que era mentira. Em seguida, pediu para ele olhar para a câmera, e repetir para os filhos dele ouvirem.  Bolsonaro se aproximou, e encostou nele, dizendo. “Os meus filhos me acompanham”, e colocou novamente a mão no ombro de Lula. Tomando conhecimento do acontecido, um dos filhos de Lula respondeu, depois: “Eu tenho de trabalhar”.

Polêmicas de nível tão baixo e extravagâncias à parte, quem gostava dessas intimidades antiprotocolares era Muamar Khadafi, o ditador da Líbia, morto dramaticamente numa revolução popular em seu país. Uma fotografia dele com Fidel Castro mostra Khadafi arrumando, licenciosamente, a gola da jaqueta de Fidel. Poucos ficavam à vontade com as suas excentricidades que – sabia-se – escondiam, atrás das batas espetaculosas e uniformes cheio de medalhas, um sujeito de caráter duvidoso. Reagan era louco para derrubá-lo.  Numa atitude dúbia, Bolsonaro aparece também cumprimentando, com certa intimidade, Vladimir Putin, cinco dias antes do russo invadir a Ucrânia.

Embora Barack Obama (1m90) gostasse também de conversar com a mão no ombro do interlocutor, seus assessores explicavam que aquilo era natural dele. Era algo meio professoral, meio intimista com aqueles por quem tinha uma certa simpatia. Contudo, segundo seus assessores, arrependeu-se algumas vezes.

No caso chinês, o “tapinha no ombro do primeiro ministro” parecia espelhar uma situação grave. Li Keqiang (9 nos na função) e outros três membros remanescentes dos tempos de Hu Jintao estavam sendo também destituídos da condição de membros do Comitê Central do Partido (PCCH). Eles consolidaram a abertura da China para o exterior – suas fronteiras ficaram fechadas por 45 anos – desencadeada por Deng Xiao Ping, o que significava o envolvimento da China no processo de globalização. Com Xi Jinping ele, Jintao e companheiros estão perdendo o direito à voz. Xi Jiping, o atual presidente, está sendo reeleito para um terceiro mandato. Antes da eleição, ele mudou a constituição, abrindo para si mesmo o direito de se reeleger indefinidamente. O novo Comitê Central do PCCH registra uma renovação de 65%, mais de 200 novos delegados ligados a Jiping.

Jiping projeta um inocente aumento do consumo interno para mais de 400 milhões de chineses. Ele quer vê-los consumindo produtos com maior valor agregado, uma postura nacionalista. Deve ser uma resposta a Trump: “o futuro não pertence aos globalistas, mas aos patriotas”.  Pretende nacionalizar gradualmente toda a indústria sobretudo os segmentos tecnológicos, energéticos e de produção de alimentos. E está administrando estrategicamente uma política de retomada de velhos territórios (Xijiang Huighur, Tibet, Mongólia, Hong Kong, territórios considerados autônomos), tidos como chineses, a exemplo do que faz a Rússia com os velhos aliados da União Soviética. Caminham no mesmo sentido: vagarosamente, em direção ao Ocidente.

 Aparentemente, na China, nada será como antes.  Xi Jiping (69 anos) não aprontou nenhum confronto bélico por aqui, mas, parece, claramente, pretender confrontar-se com os Estados Unidos e com a Europa. Segunda economia do mundo, a China quer assumir a vanguarda do Poder planetária do no novo Milênio, e vai disseminando lentamente pelo mundo suas tecnologias, – diria – tentando inibir o apetite do empresariado norte-americano. No momento, o que ela quer mesmo é se apossar das indústrias de semicondutores de Taiwan. Ainda não se sentiu estável suficientemente para invadir a Ilha, território considerado também chinês. Mas, o plano de ocupar Taiwan não parece descartado. Há sempre uma advertência dissimulada. Taiwan detém os segredos da fabricação de semicondutores (proveniente do silício:  elemento químico, em estado sólido, de número atômico 14 com massa atômica igual a 28 u), que move o desenvolvimento tecnológico no mundo, inclusive a indústria bélica.  Jiping, não vai descansar enquanto não ocupar Taiwan. Algo politicamente diferente vai acontecer aí na frente.

Veja o perigo de um “tapinha nas costas” no mundo político. A mão no ombro não é diferente.  Então, o que se deve esperar de Lula ou de Bolsonaro? Com Bolsonaro não vejo essa história de ditadura – não é um Peron -, mas provavelmente haveria um freio sobre o Judiciário que, mesmo sem um único voto da população, tenta governar no lugar do Executivo. As bancadas de centro no Congresso e a de Bolsonaro são grandes.

Com Lula, vejo uma reintegração política no continente, nem bem por iniciativa dele, mas dos países que viriam compor essa coalisão que se se reúne no Foro e São Paulo, na UNASUL, na Celac, na Alba que, sem ele no Poder no Brasil, tendem a entrar em falência. Cristina e Martinez na Argentina estão ansiosos para os argentinos voltarem a ter churrasco na mesa, evidentemente com dinheiro brasileiro ou chinês.

Deve-se temer mesmo, como adverte Lygia Fagundes Teles, no conto “Seminário dos Ratos” é que, ao final, ” invadam a casa e devorem tudo”.

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Aylê-Salassié F. Quintão – Jornalista, professor, doutor em História Cultural. Vive em Brasília. Autor de “Pinguela: a maldição do Vice”. Brasília: Otimismo, 2018

 E autor de Lanternas Flutuantes:

Português –   LANTERNA FLUTUANTES, habitando poeticamente o mundo
Alemão – Schwimmende-laternen-1508  (Ominia Scriptum, Alemanha)
Inglês – Floating Lanterns  
Polonês – Pływające latarnie  – poetycko zamieszkiwać świat  
Tailandês – Loi Kathong (ลอยกระทง) 

2 thoughts on “Tapinha no ombro. Por Aylê-Salassié Filgueiras Quintão

  1. Amigos Bolsonaristas e Petistas não conhecem o “Chumbo Gordo “. Leio e raramente faço comentários. Mas seus escritos de hoje são Tragédia Anunciada em se tratando de China e nossa combalida América do Sul. Ou do México ao Uruguai. O Google tem a “invasão “ da China na África e na EMBRAPA desde 2004 e no Brasil desde 2008. Quantas indústrias brasileiras foram fechadas desde 2008? Notadamente em São Paulo? A decadência do nosso ensino médio público no século XXI já alcançou os resultados traçados pela política educacional de Lula e Dilma Rosskoff. A violência urbana adolescente e juvenil agradece como matar vários coelhos com apenas um cajado.

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