Tristeza, por favor, vá embora. Por Silvia Zaclis
… Falo sim da tristeza entranhada, uma tristeza cívica que tem atacado tanta gente. Uma tristeza que perpassa fronteiras e gerações…
Uma vez me disseram que quando alguém está deprimido, realmente deprimido, ou sofre com síndrome do pânico, esses males que vêm infernizando a vida das pessoas.
Não, nada disso. Vou começar de novo: certa vez, um médico neurologista me disse que a pior coisa que um deprimido pode fazer é entrar em um clima de “puxa, eu tenho uma vida ótima, não me falta nada, tanta gente com problemas terríveis, eu não tenho direito de estar assim…” Segundo ele, essa é uma culpa boba porque só piora a condição geral da pessoa. Mas vou pular essa parte, não tem muito a ver com o que eu quero dizer.
Falo sim da tristeza entranhada, uma tristeza cívica que tem atacado tanta gente. Uma tristeza que perpassa fronteiras e gerações.
Ao contrário dos estados químico-emocionais que citei acima, esse é um sentimento plenamente explicável, justificável, algo com que nem os laboratórios químicos conseguem lidar.
Ah, como estou triste com a situação política do país! Ah, como estou triste ao sentir que a divisão entre “nós e os outros” está afetando os relacionamentos, mesmo os que envolvem amizades de toda uma vida, e até amor.
Se esquecermos as pessoas dos candidatos e pensarmos no governo que eles podem formar, uma coisa é certa: “Nunca dantes na história desse país” reunimos em um mesmo mandato criaturas tão inadequadas para as funções que assumiram: um ministro do meio ambiente que destrói o que deveria preservar; uma ministra da família antifeminista, retrógrada e intelectualmente desonesta; um ministro da Saúde que combate a máscara e a vacina em plena pandemia; que não exigiu do governo uma atitude firme que, atestam infectologistas, poderia ter salvo muitos dos mais de seiscentos mil mortos que a Covid levou, coisa de 8 Maracanãs lotados…
Ao atual governo falta compaixão, competência, visão histórica, seriedade e, sobretudo, empatia com o povo. O povo? Ora o povo!
Hoje ouvi uma frase atribuída ao atual presidente no tempo em ainda que era deputado: “Só tem uma utilidade o pobre em nosso país: votar. Título de eleitor na mão e diploma de burro no bolso.”
Por tudo isso, a essa altura do campeonato, com sessenta e poucos anos, votei no Lula no primeiro turno e farei o mesmo no segundo. Houvesse terceiro, ainda votaria nele. Votaria em qualquer outro adversário do atual presidente.
É uma questão tão clara para mim! Pela primeira vez na vida sinto que o tecido da nossa sociedade está se esgarçando. Também acredito que o PT tenha grande parcela de culpa pela vitória meteórica do capitão, e deve ser cobrado por isto. E que uma autocrítica também cairia bem. Tudo isso precisa ser discutido. Só que não agora.
O que me parece essencial neste momento é garantir nossa democracia. Mesmo imperfeita, ela é o único cenário que permite levar uma vida constitucional, a salvo do tacão da ditadura.
Não creio que haja, costumo ser bastante cuidadosa com as informações, mas caso você encontre alguma notícia falsa nesse texto é porque está na moda, OK?
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SILVIA ZACLIS – É JORNALISTA