A pesquisa da pesquisa. Coluna Carlos Brickmann
EDIÇÃO DOS JORNAIS DE QUARTA-FEIRA, 5 DE OUTUBRO DE 2022
Dizem que errar é humano, mas tudo tem limites. O erro tem de servir para ser corrigido. Não é impossível que haja pesquisas nacionais compradas, mas é improvável: é muita gente envolvida, coordenação entre diversas empresas, dificílima viabilidade. E, pior ainda, as empresas reduzem sua credibilidade perante o mercado. O mais provável é o erro.
Relembrando: a Ford, inconformada com a perda da liderança do mercado para a GM, decidiu lançar um carro imbatível. Fez uma pesquisa nacional e apurou que os consumidores queriam um carro discreto, econômico, familiar. Lançou o Edsel, com o nome do herdeiro da empresa. Um notável fracasso: o pesquisado respondia àquilo que imaginava ser o que se esperava dele, mas na verdade queria um carrão chamativo, de alta potência, símbolo de sucesso, de status.
A empresa de pesquisas Gallup passou a usar perguntas que indicavam contradições entre o desejo real e a resposta, digamos, politicamente correta. Houve também as pesquisas que indicavam a vitória do candidato republicano Thomas Dewey contra o presidente Truman, com vantagem tão grande que houve jornais que cravaram Dewey presidente. De novo, houve modificações na metodologia das pesquisas.
Aqui está na hora de fazer isso. Pode ter havido mudanças de última hora, é verdade; é parte do jogo. Mas voto envergonhado, resposta contraditória, tudo tem de ser detectado. A confiabilidade exige uma reformulação.
Por falar nisso
E hoje à noite sai a primeira pesquisa do segundo turno, elaborada pelo Ipec a pedido da Globo. A margem de erro prevista é de 2 pontos percentuais.
A batalha dos apoios
A pesquisa que não erra, a das urnas, coloca Lula com seis milhões de votos à frente de Bolsonaro. Mas Bolsonaro demonstrou muito mais força do que se esperava e está em campanha pesada. É jogo aberto. Conseguiu o apoio dos governadores de Minas e do Rio, eleitos no primeiro turno, rachou o PSDB de São Paulo.
Lula conseguiu o apoio de Ciro Gomes e de Simone Tebet, aproximou-se de parte do empresariado. Mas há dois fatos inegáveis: o primeiro, Bolsonaro bateu Lula em São Paulo, berço político do petista e do PT; segundo, o surpreendente desempenho de Bolsonaro coincidiu com a maior queda do dólar desde 2018 e a Bolsa teve seu melhor dia em dois anos.
Mais do que coincidência, isso indica que o mercado viu com bons olhos a alta do bolsonarismo. E, aparentemente, a chuva de apoios ao voto útil em Lula não rendeu muito em termo de votos.
Cartas na mesa
É provável que o mercado não seja tão bolsonarista quanto parece, e sinta também a necessidade de entender melhor o que Lula pretende fazer na área econômica. “La garantía soy yo” é pouco. Agora, Lula precisa mostrar quais são seus planos, tornar-se mais previsível, abrir-se para conversas sobre o que pensa sobre gastos, inflação, desestatizações, agronegócios e coisas semelhantes.
Bolsonaro não é mistério: seu governo é assim mesmo.
Quem tem a força
O PL, partido de Bolsonaro, ampliou muito sua bancada federal, outros partidos de sua base também cresceram, mas que ninguém se iluda: a força do bolsonarismo é o próprio Bolsonaro, não os partidos. Foi ele que elegeu candidatos que jamais atuaram em política, como o general Eduardo Pazuello, o general Mourão, a ministra Damares, o filho Eduardo. Muitos dos que romperam com ele foram vítimas de campanhas cruéis de destruição de imagem e perderam centenas de milhares de votos, como Janaína Pascoal, Joice Hasselmann, Alexandre Frota, general Santos Cruz, Abraham Weintraub – todos derrotados na eleição. Sérgio Moro está com Bolsonaro.
A humilhação
O governador de São Paulo ofereceu o apoio a Tarcisio de Freitas, que vai disputar o segundo turno contra Fernando Haddad, do PT. Tarcisio aceitou o apoio, mas rejeitou a presença do governador em seu palanque. Em resumo, pode articular, negociar, mas não diga nada ao eleitor.
No muro, invisível
O PSDB, pela primeira vez, ficou fora do segundo turno presidencial; pela primeira vez desde 1994, perdeu o governo de São Paulo e não foi nem para o segundo turno. Não tomou posição como partido e ficou em cima do muro. E rachou: Tasso Jereissati, Aloysio Nunes, os “cabeças brancas” estão com Lula, os mais jovens fecham com Bolsonaro. José Serra, símbolo do partido, não se elegeu. Eduardo Leite por pouco não fica fora do segundo turno no Rio Grande do Sul. Vai disputar com Onyx Lorenzoni.
A verdade dos fatos
Ganhe quem ganhar, já se sabe quem vai governar: o Centrão. E cada vez mais poderoso, seja com Bolsonaro, a quem apoia, seja com Lula, a quem pode apoiar. O Centrão não tem preconceitos. Acerta direito e apoia.