Escrevi uma coluna baseado nas pesquisas de intenção de voto, com que trabalhei durante todo o tempo. Nelas havia a possibilidade de vitória de Lula no primeiro turno. Mas não havia nenhuma indicação de vitória de Jair Bolsonaro.
Não me guiava apenas pelas pesquisas, mas pela intuição. Pesquisas tratam de recortes, por gênero, renda, lugar de moradia, religião. Pensava nas pessoas em sua totalidade, no ser humano, e achava que um presidente que disse que não era coveiro na pandemia e riu de quem tinha falta de ar jamais seria aceito pela maioria do povo brasileiro. Era uma intuição que as pesquisas confirmavam: 52% dos entrevistados rejeitavam Bolsonaro.
As urnas começaram a ser abertas, e as expectativas foram se transformando. São Paulo, sobretudo ali onde há uma grande concentração de eleitores, apresentava no início um resultado diferente do esperado.
Da mesma forma, ao longo do Brasil foram aparecendo resultados favoráveis a Bolsonaro, principalmente em estados em que já era apontado como vencedor. Mas havia alguma coisa estranha no ar. Ventos do Sul indicavam uma situação inesperada. O inesperado, se consideramos a pesquisa, começou a se instalar nos resultados.
… Pelo menos, posso dizer que a vida me deu uma luta para concluir os dias e ficarei por aqui, ao lado de tantos outros, tentando defender a democracia, evitar que destruam as florestas, dizimem os povos originários, enfim, evitar também que coloquem em risco a própria sorte do clima no planeta, dada a importância de nossos biomas…
Estava preparado para escrever uma coluna apenas com a vitória de Lula, ainda que a decisão fosse adiada para o segundo turno. Qualquer outro resultado me surpreenderia e me obrigaria a aceitar que minha intuição sobre os brasileiros falhou, assim como falharam as pesquisas sobre a rejeição de Bolsonaro.
O que fazer diante disso? Nunca tive dúvidas de que continuaria resistindo. Sair do Brasil por um tempo, apenas para visitar a filha querida. Fora isso, continuarei em minha trincheira e, se preciso, cavarei outras.
Pelo menos, posso dizer que a vida me deu uma luta para concluir os dias e ficarei por aqui, ao lado de tantos outros, tentando defender a democracia, evitar que destruam as florestas, dizimem os povos originários, enfim, evitar também que coloquem em risco a própria sorte do clima no planeta, dada a importância de nossos biomas.
Um desfecho que parecia certo por tudo o que avaliamos nestes dias tornou-se nebuloso. Como nada foi ainda concluído, é importante seguir os resultados e preparar o espírito para uma luta mais longa, muito provavelmente um renhido segundo turno. É preciso estar preparado para tudo e admitir mais uma vez que a realidade não foi exatamente o que diziam as previsões otimistas.
Não é a primeira vez que situações que pareciam resolvidas tornam-se muito complicadas. O pior é que as dificuldades não terminam com as eleições, não importa o vencedor. Estaremos em dificuldades econômicas internas e num mundo fortemente impactado pela guerra e pela crise energética na Europa.
Fernando Gabeira*– é escritor, jornalista e ex-deputado federal pelo Rio de Janeiro. Atualmente na GloboNews, como comentarista politico. Foi candidato ao Governo do Rio de Janeiro. Articulista para, entre outros veículos, O Estado de S. Paulo e O Globo, onde escreve às segundas. Tem programa na GloboNews. Lançou agora o podcast “Fala, Gabeira!” ( veja no YouTube)