Votos sem vergonha. Por Edmilson Siqueira
… a falta de vergonha na cara do brasileiro é muito maior que a vergonha de não dizer o nome em quem vai votar. Porque dos mais de 80% que declaram que não vão mudar mais o voto até as eleições..
Dia desses recebi de uma amiga um vídeo de um trecho de um programa na CNN onde um cientista político, Felipe Nunes, que é CEO da Quaest, explicou uma técnica pra se descobrir o tal do “voto envergonhado”. Para quem não sabe, esse voto é aquele em que o cidadão não declara para os pesquisadores, ou declara no outro candidato, pois tem vergonha de dizer que vai votar em quem vai votar por um motivo qualquer. Dizem os técnicos que esse tipo de voto pode significar mais ou menos 5% dos entrevistados. Como os dois candidatos preferidos estão, segundo as principais pesquisas, a uma distância pouco maior que isso, esse contingente pode até ser decisivo num primeiro ou segundo turno.
No vídeo, Nunes explica que, aplicada a técnica aqui no Brasil, descobriu-se que o voto envergonhado, ao contrário do que se diz por aí (que é Bolsonaro o preferido deles), esses votos pendem muito mais para Lula. Motivo? É que esse contingente “envergonhado” não tem resposta para quando lhe perguntam se ele vai votar num ladrão e, por isso, esconde sua preferência.
Foi o que disse o sociólogo na CNN. Longe de mim refutar tal pesquisa, feita com as mais modernas técnicas de aferimento da opinião pública. Aliás, no caso, foi uma técnica desenvolvida por um mestre de Harvard e aplicada, primeiramente, no Afeganistão, para descobrir o apoio real da população aos terroristas do Talibã. Depois, nos EUA, para descobrir o voto envergonhado em Trump.
Mas, diante do quadro político-eleitoral que hoje se nos apresenta, sou levado a imaginar o outro lado da questão: se há um voto envergonhado de alguns poucos cidadãos, o que assistimos hoje no Brasil é ao voto desavergonhado, não apenas do cidadão que vai votar no Lula e não tem vergonha de dizer que vai votar num descarado ladrão, como também do cidadão desavergonhado que declara voto no genocida presidente da República para sua reeleição.
Usando minha experiência em eleições presidenciais (já passei por dez delas, sem contar as “eleições” da ditadura onde o candidato general era apenas “referendado” por um Congresso medroso e submisso), posso declarar que não presenciei, nesse tempo todo de vida, dois tão expressivos contingentes de eleitores (são quase 90% deles) declarando, sem a mínima vergonha na cara, que vão votar num ladrão ou num genocida e não pretendem mudar de voto.
Porque, convenhamos, os dois candidatos que estão à frente nas pesquisas, deixando os outros a uma distância que não lhes dá qualquer esperança, têm muitos mais defeitos que qualidades. E os defeitos (estou sendo generoso em chamar de “defeitos” os crimes todos que ambos cometeram e cometem) são mais que suficientes para afastar qualquer eleitor que realmente tenha vergonha na cara.
O atual mandatário, por exemplo, não cumpriu qualquer promessa de campanha e, ao contrário, fez o dizia que não ia fazer. Para piorar a situação, teve comportamento criminoso no enfrentamento da pandemia da covid 19 podendo ser responsabilizado indiretamente por metade das quase 700 mil mortes de brasileiros. De resto, incentivou invasões de terras e desmatamentos na Amazônia, brigou de modo infantil com os mais importantes parceiros comerciais do Brasil, cortou verbas da Saúde, da Educação e da Cultura e aliou-se à enorme banda podre do Congresso Nacional representada pelo Centrão que, há décadas, comanda as tenebrosas transações contra os cofres públicos do país, depois de, em campanha, chamá-lo literalmente de ladrão.
Já o outro, que nos ameaça com um terceiro mandato, comandou o maior esquema de corrupção que o Brasil (e talvez o mundo) já presenciou. Fora isso, expandiu uma esmola aos mais pobres com o intuito não de livrá-los da pobreza (a quantia era tão irrisória que só não morreriam de fome) mas sim de mantê-los em pé e com força suficiente para apertar o botão da urna eletrônica com o seu número eleitoral. Caso não o fizessem, a esmola iria desaparecer por conta do malvado concorrente dele, mentira essa que ele fez questão de espalhar nos mais recônditos rincões da miséria geral brasileira. Sem contar que triplicou a dívida brasileira, perdoou dívidas de ditaduras de esquerda a troco de levá-las a votar no Brasil numa votação que jamais ocorreu na ONU e seu partido entregou o poder na marra com um desemprego de 14 milhões de brasileiros e uma inflação de dois dígitos.
Portanto, declaro sem medo de errar, que a falta de vergonha na cara do brasileiro é muito maior que a vergonha de não dizer o nome em quem vai votar. Porque dos mais de 80% que declaram que não vão mudar mais o voto até as eleições, quase a totalidade vai votar num ladrão ou num genocida. E vão votar sem a mínima vergonha na cara.
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Edmilson Siqueira– é jornalista
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Caro Edmilson, fica muito difícil renovação política no país, pois os “medalhões” estão sempre no comando, impedindo que novas lideranças surjam; os nomes que trazem para a urna quando não o próprio são filhos, esposas ou ex, todo tipo de parente ou apaniguado.
Basta ver o absurdo de senador ter suplentes, sempre parente – tem um agora que deixou a mãe no posto – ou os financiadores de suas campanhas.
Também é de se considerar que o eleitor segue pesquisas – nem sempre tão confiáveis – e, vota nos que ali aparecem como vencedores ou com chance de vencer.
Ora, se olhássemos a lista de candidatos, com mais cuidado, poderíamos provocar renovação, elegendo quem temos mais afinidade, não no cardápio pronto das pesquisas.
No meu entorno, escuto a celebre frase “ não vou perder meu voto para quem está atrás nas pesquisas, ele não tem chance…”
Bem, vota-se mal e depois vem a reclamação, mas “não perdeu o voto”?
Como renovar se não se elege quem poderia fazer diferente, apenas pela desculpa acima?
Inté!