Invocar Seu Santo Nome em vão. Coluna Carlos Brickmann
EDIÇÃO DOS JORNAIS DE QUARTA-FEIRA, 15 DE JUNHO DE 2022
Candidato come o que lhe oferecem, por ruim que seja, e diz que é uma delícia. Candidato toma café velho e faz cara boa. Candidato toma vinho licoroso caseiro, ultra doce, e diz que nem na França provou néctar igual. Candidato passeia de jegue e diz que adora cavalgar. Faz parte.
O que não faz parte é violar o 3º Mandamentos e invocar Seu Santo Nome não só em vão, mas para ganho pessoal. Tarcísio de Freitas, de joelhos, disse que os cristãos não podem permitir que a esquerda volte ao poder, “com (…) um discurso de negação da família (…) Quem nega a família nega Cristo”.
É feio. Tarciso ocupou alto cargo, de confiança, quase um ministério, no Governo de Dilma Rousseff. Na época a esquerda, a que se refere com horror, era melhor do que hoje? Ou ele, na época, fingia não saber de nada? Ser candidato a governador de São Paulo para dar palanque a Bolsonaro é o suficiente para, de joelhos, negar o que foi há poucos verões passados?
E o deputado Eros Biondini (PL-Minas) conseguiu aprovar na Câmara o projeto que institui o Dia Nacional do Terço dos Homens (é 8 de setembro).
Nada de estranho: foram parlamentares federais que usaram a belíssima Oração de São Francisco como lema de fundação do Centrão, interpretando à sua maneira a frase “é dando que se recebe”. E, convenhamos, é um local em que grande número de parlamentares apoia sinceramente o Terço, a ponto de jamais participar de uma discussão política sem levar um terço no bolso.
Com o ódio na alma
A Parada do Orgulho LGBT de São Paulo ocorre neste domingo e deve ser animada, tanto que há ameaças de morte contra alguns de seus organizadores. Já há investigação, promovida pela Secretaria estadual de Justiça, para identificar os autores das ameaças. Num dos e-mails, são citados como alvos o deputado federal Alexandre Frota (PSDB-SP), os vereadores Thammy Miranda (PL) e Érika Hilton (PSOL), a deputada estadual Érica Malunguinho (PSOL) e o secretário da Justiça, Fernando José da Costa.
O amor contra o ódio
A Agência Aids, de Roseli Tardelli, que tem camarote na Parada, neste ano fará participação virtual, pela Internet, mas mantendo como sempre seu patrocínio. Quem quiser participar do camarote virtual pagará R$ 58,63, pelo site www.agenciaaids.com.br. Como sempre, doações de alimentos não perecíveis são bem-vindas. E tudo vai mesmo para os necessitados. Conheço Roseli Tardelli há muitos e muitos anos. É competente, dedicada e séria.
Quanto mais apanha…
Magno Malta foi um dos principais lançadores e apoiadores de Bolsonaro. Mas sem se expor muito: não aceitou ser vice. Preferiu a fácil reeleição para o Senado. Só que Fabiano Contarato o venceu, Bolsonaro se elegeu e o esqueceu. Magno aceitou bem a humilhação e há quase quatro anos luta para ser bem aceito de novo. Agora chegou ao máximo (ou ao ponto mínimo).
…a ele tem amizade
Numa reunião da ala comandada por Eduardo Bolsonaro, a mesma em que Tarciso se ajoelhou para falar mal do prato em que comeu, Magno Malta fez acusações a quatro ministros do STF: Rosa Weber e os três de sempre, Édson Fachin, Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso. Mas inovou na crítica a Barroso, dizendo que “ele bate em mulheres”.
Invenção: não há qualquer notícia sobre isso na história do ministro. O que há é outra coisa: uma advogada acusou um grupo de profissionais ligados à Justiça de “calúnia, difamação, violência psicológica, violência moral contra a mulher, prevaricação, injúria e advocacia administrativa”. Barroso, um dos atacados, era procurador no Rio. O caso não existia, o processo foi extinto e a acusadora foi investigada. Mas nem aí há a acusação de agressão a mulheres. Os ministros citados decidiram processá-lo. E Malta é pastor!
Os desaparecidos da Amazônia
Já começou a campanha de notícias falsas para botar a culpa nas vítimas. Bruno Pereira, segundo as “fake news”, teria sido demitido da Funai por “condutas extremistas e incorretas”. E estaria envolvido no caso da queima das balsas incendiadas de garimpeiros ilegais. Aos fatos: Bruno Pereira tem a confiança dos índios, confirmada por todas as tribos. E a queima do equipamento ilegal (balsas, ou máquinas usadas para desmatar a floresta) é legal. Os bandidos perdem o equipamento (como um matador perde suas armas ao ser preso), que é destruído. Se for deixado no lugar, será usado de novo pelos bandidos. Quem se insurgiu contra a norma foi Bolsonaro.
Dom Phillips, segundo a “narrativa” falsa, fazia reportagens em reservas indígenas sem autorização do Ibama, da Funai e dos governos. Mas ele não entrou nas reservas: seus encontros com caciques foram em outros locais. E, admitindo-se que tenha entrado na área sem pedir licença ao Governo, isso será crime punível com que pena? A última história falsa: Bill Gates estaria por trás de Dom Phillips.
Mas quem estará por trás de seu desaparecimento?