Centrão + jabutis + termoelétricas = corrupção. Por Edmilson Siqueira
O jabuti colocado na privatização da Eletrobras – quem ganhar vai ter de construir usinas termoelétricas no Nordeste (onde, aliás, não são necessárias) – é um desses descalabros que denuncia a corrupção destrambelhada que há no governo Bolsonaro.
Carlos Brickmann, em sua coluna, aborda esse assunto também, acrescentando que o ex-ministro das Minas e Energia, almirante Bento Albuquerque, era contra esse projeto e pode ter sido demitido por isso. Eu acho que foi por isso mesmo, o que só comprova interesse altamente suspeito nos enormes valores envolvidos com esse descalabro.
E é um descalabro mesmo: a construção de termoelétricas no Nordeste favorece um único grupo empresarial brasileiro, que comprou o direito de explorar esse negócio por lá. O chefe desse grupo é Carlos Suarez, empresário bastante conhecido da Justiça brasileira – ele é o “S” da OAS, que esteve envolvida no Petrolão até o pescoço.
Para levar o gás para as usinas que serão construídas pelo comprador da Eletrobras, é preciso construir um enorme gasoduto cujo custo, calcula-se, chegue aos R$ 100 bilhões. Esse dinheiro, segundo o jabuti colocado na lei, sairia do que o governo tem a receber pela exploração do petróleo do pré-sal.
Ou seja, o vencedor da privatização da Eletrobras vai construir as usinas, nós vamos pagar pelo gasoduto e o grupo de Carlos Suarez vai vender a eletricidade para a população do Nordeste – a um custo mais elevado, pois essa forma de energia é mais cara – com um grande lucro.
A pergunta que fica dessa história não é se houve ou vai haver corrupção por parte do grupo interessado e, sim, quanto é que foi combinado entre deputados, senadores e governo para ser repassado em forma de propina. Porque não é possível que deputados, senadores e o governo Bolsonaro, que jamais se opôs ao projeto, sejam inocentes na armação de tamanha aberração.
No Nordeste, a energia solar e a eólica são abundantes e muito mais baratas que a energia de hidrelétricas e termoelétricas. Então, o óbvio seriam investimentos nesses tipos de energia que, além de serem mais baratas, são totalmente limpas e inesgotáveis.
Não é à toa que o projeto do gasoduto de 100 bilhões de reais ganhou o apelido de “Centrãoduto”.
Segundo reportagem do Estadão, a Associação dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace), que tem entre seus membros companhias como Alcoa, Braskem, CSN, Gerdau, Nestlé, Suzano e Votorantim Cimentos, afirma que o ‘Centrãoduto’, que se conectaria a usinas termelétricas, representa “um ônus elevado para todos os consumidores de energia elétrica, em um desenho ineficiente que cria privilégios para alguns empreendimentos de geração com características muito específicas, em detrimento de um planejamento de contratações baseadas em eficiência e modernização do mercado”.
Outra crítica partiu do Fórum das Associações do Setor Elétrico (Fase), principal organização deste mercado e que reúne 27 associações. Em carta enviada ao deputado Fernando Coelho Filho, questiona os jabutis. “É importante ressaltar os riscos recorrentes que os PLs (projetos de lei) do setor energético vêm sofrendo, com a inclusão dos chamados ‘jabutis’, como (…) a construção de gasodutos subsidiados pelo setor elétrico e/ou pelo Tesouro, com fortes impactos para os consumidores e/ou para os contribuintes brasileiros.”
O caso, obviamente, chamou a atenção também da oposição: “Estão tentando aprovar esse Brasduto há anos, e não se trata de uma questão de visão política ou ideológica. É para atender interesses individuais, o que faz disso um absurdo muito maior”, disse o deputado Paulo Ganime (Novo-RJ).
O deputado Danilo Forte (União Brasil-CE) criticou o investimento em uma energia que, além de ser mais cara, é ambientalmente mais suja do que outras, como eólica e solar. “Transferir uma conta de matriz elétrica ultrapassada ao consumidor é de uma burrice extraordinária. Vamos favorecer um único grupo econômico ou democratizar a geração de energia e diminuir a desigualdade? Sabemos que, quando aprovaram as térmicas, foi imposição da base governista, favorecida pela liberação do orçamento secreto.”
Nessas críticas dos deputados está a chave para saber porque a aberração foi aprovada e ter certeza da corrupção. O deputado do Novo diz que o Centrãoduto atende interesses individuais e o da União Brasil, afirma que as térmicas foram aprovadas por imposição da base governista, favorecida pelo orçamento secreto.
A segunda crítica é ainda mais grave, pois se, para aprovar o projeto, a base foi devidamente comprada (é isso que ele quis dizer, mas usou a palavra “favorecida”), significa que os interesses são da cúpula parlamentar, aquela que determina pra quem vão as emendas. Ora, essa cúpula age sempre em comum acordo com a cúpula do Executivo, onde, em uma das principais cadeiras, está sentado um dos dois maiores líderes do Centrão, o ministro Ciro Nogueira, da Casa Civil que, dizem, é quem está no comando de todo governo, pois o presidente Jair Bolsonaro, que deveria governar, está se divertindo por aí em cercadinhos com seu ignaro rebanho ou em passeatas, carreatas, motociatas e lanchaciatas.
Assim, fica mais uma vez comprovada que a corrupção corre solta no governo Bolsonaro e que o esquema de compra de parlamentares, que o PT fazia através de mesadas oriundas do Mensalão e, depois, do Petrolão, continua a todo vapor. Mudou um pouco o método, mas a essência – roubalheira do dinheiro público – é a mesma.
Trata-se de mais uma triste coincidência entre os governos do PT e de Bolsonaro. Há muitas outras, pois, no fundo, todos os governantes metidos a autoritários e que sempre enxergam, uma ditadura no fim do túnel, são iguais: fazem péssimos governos e são sempre corruptos .
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Edmilson Siqueira– é jornalista
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