Em nome de Deus? Por Edmilson Siqueira
… quem já viu um mínimo das pregações televisivas que eles fazem, sabem da importância que dão à bíblia. Chamam-na de o livro sagrado, do livro da palavra eterna, da manifestação do divino e outros apelidos. Pois não é que o sacrossanto livro estava sendo usado dentro de um esquema de roubalheira do dinheiro público?
Eu sou ateu, mas respeito alguns dos ensinamentos morais que as religiões pregam muito mais do que muitos crentes. Digo isso porque o que se tem visto de desonestidade explícita, de jogo de interesses, de sacanagem mesmo por aí praticada por pastores evangélicos é de um absurdo que faria corar até o demônio.
Além da já tradicional exploração que todas as religiões praticam contra os chamados fiéis, elas se arvoram no direito de tentar impor a toda a população suas regras. Para tanto, elegem bancadas poderosas usando os púlpitos para angariar votos e, através delas, criam leis que vão atingir a todos, desde os ateus como eu, até os crentes de todas as outras religiões.
A legalização dos cassinos é um desses casos em que se explicita a pouca vergonha dessa bancada religiosa. Como eles não gostariam de ver cassinos funcionando no Brasil (como se não houvesse centenas deles – clandestinos – por aí; como se as dez modalidades de loterias da Caixa, com cerca de 30 sorteios por semana, não fossem um grande cassino; como se o jogo de bicho não existisse impunemente), eles negociaram o fim de qualquer imposto imobiliário de seus templos (mesmo os alugados) em troca da legalização dos cassinos. O que deixa claro que tudo não passa de um grande negócio: desde que eles fiquem mais ricos não pagando impostos que serviriam, teoricamente, para todos os brasileiros, os cassinos podem funcionar para, segundo eles vivem dizendo, desgraçar a vida dos homens, acabar com famílias, enfim, infernizar ainda mais o Brasil. Não estão nem aí, desde que entre uma graninha a mais para os seus bolsos.
Particularmente, não sou contra os cassinos nem contra os jogos da Caixa. Até faço meus joguinhos regularmente. Se os cassinos passarem a funcionar, talvez até vá em algum deles um dia. Mas essa discussão serviu para mostrar a hipocrisia da bancada evangélica: eles estão lá para se dar bem financeiramente. O resto é perfumaria, discurso para enganar fiel e para garantir a reeleição.
Outro fato que demonstra que o interesse deles não tem nada a ver com a salvação do “espírito” ou com a tal “palavra de Deus”, é o recente escândalo do Ministério da Educação.
Todo mundo já sabe que para dois pastores sem qualquer cargo no governo foi entregue a distribuição da milionária verba federal para construção de creches e escolas pelo interior do Brasil. E essa entrega foi feita pelo pastor ministro da Educação a mando do “católico” presidente do Brasil, como o próprio ministro disse (depois ele desmentiu, do que se deduz que ou ele mentiu para os prefeitos ou mentiu quando desmentiu o que disse).
Mas o escândalo todo é muito pior que uma corriqueira mentira de um ministro (no Brasil é corriqueira). Os dois pastores exigiam propinas para liberar verbas, conforme já disseram vários prefeitos que não entraram no esquema – os que entraram se calam ou negam o esquema – em forma de dinheiro, em barras de ouro ou em compra de bíblias. Essa última forma de propina é bastante emblemática da sacanagem toda que envolve essa raça de pastores evangélicos.
Ora, quem já viu um mínimo das pregações televisivas que eles fazem, sabem da importância que dão à bíblia. Chamam-na de o livro sagrado, do livro da palavra eterna, da manifestação do divino e outros apelidos. Pois não é que o sacrossanto livro estava sendo usado dentro de um esquema de roubalheira do dinheiro público? Para liberar a verba do governo, os prefeitos eram obrigados a comprarem bíblias (dos pastores, é claro) para distribuir nas cidades. E não é que o sacrossanto livro negociado em forma de propina tem, conforme revelado nesta segunda-feira, estampadas em suas páginas as fotografias dos dois pastores, do ministro da Educação e com possibilidade de estampar também a do prefeito que entrasse de bom grado na roubalheira? Ou seja: no “livro sagrado” as fotos dos ladrões todos como se santos fossem.
Essa é a verdadeira face desses que roubam usando o nome de Deus. Eles não são religiosos, são ladrões simplesmente, corruptos, usurpadores dos cofres públicos em detrimento da população que mais precisa dos serviços públicos.
A participação deles nos esquemas faz com que creches não sejam construídas, que faltem escolas no interior do Brasil, que a miséria que já não é pequena, aumente e se perenize por aí. Assim, o povo pobre continuará depositando suas esperanças (e o dízimo!!!) na religião, continuará sendo enganado por esses canalhas que se disfarçam de religiosos quando, na verdade, não passam de escroques a viver do dinheiro público que roubam descaradamente, com a ajuda do governo federal, de seus ministros e do próprio presidente da República.
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Edmilson Siqueira– é jornalista
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