vidas negras importam

Vidas negras importam. Por Wladimir Weltman

… O racismo é essencialmente característica de gente de mente muito limitada. Uma limitação que passa pela burrice, doença mental e profunda ignorância. Ainda mais nos tempos em que vivemos…

vidas negras importam Infelizmente a semana que passou nos faz pensar que no Brasil de hoje essa afirmação não tem valor. Um imigrante africano e um vizinho que foi confundido com bandido tornaram-se números na estatística do massacre cotidiano de negros em nosso país.

O racismo é essencialmente característica de gente de mente muito limitada. Uma limitação que passa pela burrice, doença mental e profunda ignorância. Ainda mais nos tempos em que vivemos. É inaceitável que alguém hoje em dia ainda possa se apossar do conceito de raça para se sentir livre para agir de forma desumana. A ciência desde 1953, quando os cientistas James Watson e Francis Crick publicaram seu trabalho descrevendo o que é o DNA, que o conceito de raça se tornou ultrapassado.

Segundo o artigo de Jennifer Raff de abril de 2019 na Revista Forbes: “A Associação Americana de Antropólogos Físicos, uma organização de cientistas dedicada ao estudo da variação biológica, adaptação e evolução dos humanos e nossos parentes próximos”, divulgou uma declaração definitiva sobre raça e racismo — raça não é uma categoria biologicamente significativa. Portanto parem de repetir essa balela pseudocientífica típica de nazistas!

Se a maioria dos racistas do Brasil fizessem um teste de DNA, teriam uma surpresa desconfortável. Para ser 100% coerente com a sua ânsia assassina de eugenia (pureza a raça), teriam que meter uma bala na própria cabeça! Todos nós no planeta, principalmente os mais sadios, somos frutos de séculos e séculos de miscigenação.

E, ao longo da história, todos os grupos humanos que se mantiveram “puros” praticando a endogamia, ou seja casando entre si, se deram muito mal. Exemplo disso são as famílias reais da Europa. Dos Habsburgos espanhóis aos netos da rainha Vitória da Inglaterra, séculos de endogamia resultaram em terríveis mutações genéticas, que levaram à ruína dessas casas reais.

Por incrível que pareça já tem gente na Internet reclamando a grita causada pela morte covarde e desumana do Congolês Moïse Kabagambe e o assassinato inconcebível de Durval Teófilo Filho, 38 anos, morto por um vizinho ao chegar em casa.

vidas negras importamTalvez o único remédio para essa enfermidade social que é o racismo e a violência contra aqueles que achamos diferentes da gente, seja o processo de empoderamento por parte de minorias, que finalmente começam a se fazer ouvir em todo o mundo.

Não estou aqui advogando nada no estilo “olho por olho, dente por dente”. Muito pelo contrário. Refiro-me a fazer o que mulheres e artistas negros americanos estão fazendo aqui na capital do show bizz – Hollywood. Mais e mais vemos filmes e séries de TV dando voz às minorias que por séculos foram oprimidas pela oligarquia masculina tóxica da nossa sociedade. Esses artistas têm aproveitado a resposta positiva da audiência para produzir mais e mais conteúdo audiovisual contando suas histórias e fazendo o coletivo pensar nas injustiças do passado e atuais, que precisam acabar.

Graças a revolução digital a moçada está botando a boca no trombone e reescrevendo a historia oficial com suas obras. E, quando a obra é de ação, cheia de tiros e violência, bem no paladar dos jovens – onde grande parte dos racistas de plantão são arregimentados – a coisa fica ainda mais eficiente.

Este é o caso de um filme que foi lançado há pouco pela Netflix – THE HARDER THEY FALL – um western cheio de tiros, sangue e muita ação, mas que se dispõe a mostrar que Hollywood por anos mentiu sobre a conquista do oeste americano.

Apesar de décadas de mocinhos louros, de olhos azuis galoparem galhardamente nas telas do cinema e da TV conquistando o velho Oeste, hoje sabe-se que a verdade histórica é outra. Mais de um livro e documentário já mostrou que quem protagonizou a verdadeira conquista do oeste foram os índios — que mataram o general Custer e a impertinência do exército americano –, os imigrantes chineses — que construíram a ferrovia que cortou o país — e, principalmente, cowboys negros e prostitutas (várias delas negras também). De 1870 a 1880, o auge da conquista do oeste, mais de 25% dos 35.000 cowboys americanos eram escravos libertos.

Por isso o filme THE HARDER THEY FALL conta com um elenco essencialmente de atores negros. E embora seja uma obra de ficção, seus personagens principais existiram na vida real. Nat Love, Bass Reeves, Rufus Buck, Cherokee Bill e outros — retratados na tela por excelentes atores pretos – cada um deles era tão interessante e memorável quanto nomes como Buffalo Bill, Wyatt Earp, Butch Cassidy e Sundance Kid.

O diretor e roteirista negro Jeymes Samuel contou ao New York Times que com seu filme quis mostrar algo que o mundo aparentemente desconhece: “O fato de termos sido ignorados pela história do Velho Oeste e pela sua representação cinematográfica”.

Agora jovens negros poderão brincar de mocinho e bandido sem ter que se mirar em John Wayne. Amor-próprio é fundamental pra se conquistar o respeito dos outros. Principalmente dos racistas, que não amam ninguém.

Consta que o sargento da Marinha que assassinou o vizinho Durval, teria atirado três vezes após o homem se aproximar “muito rápido de seu veículo”. Disse ao delegado da Divisão de Homicídios de Niterói, Itaboraí e São Gonçalo, que não teve intenção de matar. Aqui entre nós, ninguém atira 3 vezes contra alguém sem intenção de matar… Seja como for, essa é a versão do homem que atirou. Agora cabe aos artistas vivos contarem a versão das vítimas mortas, que já não podem fazê-lo.

A visão distorcida dos que não acreditam que a vida de pessoas de cor, gays, mulheres, crianças e demais vítimas da violência tenham direito a viver porque suas vidas não importam.

Isso tem de acabar. E cabe a nós, geradores de arte e cultura, mostrar a eles que estão errados.

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WLADIMIR WELTMAN – é jornalista, roteirista de cinema e TV e diretor de TV. Cobre Hollywood, de onde informa tudo para o Chumbo Gordo

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DIRETO DE LOS ANGELES

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