Moro

Moro já incomoda. Por Edmilson Siqueira

Moro

A entrada de Sergio Moro na corrida presidencial, embora fosse um fato ensaiado já há algum tempo, deixou bem preocupadas as campanhas dos dois favoritos até aqui. Tanto Lula quanto Bolsonaro reagiram de modo a deixar perceptível, não por vontade própria, o incômodo que o ex-juiz de um e o ex-ministro de outro provoca. O silêncio de Lula é próprio de quem sentiu o baque e, com certeza, foi aconselhado a não falar de Moro por enquanto, esperando pra ver como ele se posiciona, tanto frente às lideranças políticas quanto nas pesquisas. Já Bolsonaro, conteve (provavelmente foi aconselhado a conter) sua natural estridência. Ambos, porém, deixaram para seus respectivos gabinetes do ódio espalharem ataques e fake news contra Moro.

Fosse um candidato comum, desses que entram no jogo para negociar adiante uma aliança (o que não quer dizer que isso não ocorra por outro motivo, já que alguns candidatos da chamada terceira via combinaram de abdicar da candidatura para apoiar alguém do grupo mais bem posicionado nas pesquisas) Moro teria sido desprezado pelos dois e pela imprensa em geral. Porém, as pesquisas que já colocam Moro em terceiro lugar com viés de alta para sua aprovação e viés de baixa para sua rejeição, mostram que ele veio para ficar. Obviamente é cedo ainda para definições, mas qualquer candidato fora do eixo da desgraça (Lula e Bolsonaro) adoraria estar hoje com cerca de 15% de intenção de votos nas pesquisas.

A preocupação dos dois até agora favoritos para um segundo turno tende a aumentar por dois fatores que já se mostram de modo claro. O primeiro são as próprias pesquisas que, seja de um ou de outro instituto, seja com um ou com outro método de apuração, mostram Moro em terceiro lugar, à frente de todos os outros que estiveram com nomes em evidência e, aberta ou dissimuladamente, vêm fazendo campanha há mais de um ano.

O segundo fator é que Moro não só se preparou para a empreitada, como está respondendo com propriedade tudo que lhe perguntam, principalmente sobre os escândalos financeiros dos governos petistas e sobre sua precoce saída do governo.

No primeiro caso, ele deixa claro que a era petista foi marcada pela maior corrupção que já houve no Brasil e que, desde o Mensalão o esquema era enriquecer dirigentes partidários e partidos políticos visando a permanência no poder por quanto tempo fosse possível. E que o esquema que dilapidou a Petrobras, desfalcou a empresa em bilhões e bilhões de dólares e foi totalmente provado nos processos que ele julgou durante a Lava Jato.  E ainda acrescenta que foi um grande erro do STF anular processos que, se começaram com ele, passaram por desembargadores e ministros do STJ que não viram qualquer irregularidade.

Nessa ação de anulação dos processos, com a consequente soltura de Lula, e que teve a atuação destacada de Gilmar Mendes, Moro coloca os dois presidenciáveis no mesmo barco: Bolsonaro nada fez para impedir que o STF agisse contra a Lava Jato, muito pelo contrário, bem como nada fez, muito pelo contrário, para que a prisão em segunda instância fosse votada para voltar a ser a regra num país cujos escândalos financeiros com dinheiro público ocorrem diariamente.

Essas partes da história recente do país – corrupção e saída do governo – estão esmiuçadas não só nas entrevistas que Moro vem dando ou nos artigos que escreveu e continua escrevendo. Elas estão todas registradas num livro que acabou de ser lançado, assinado pelo próprio ex-juiz.

Em “Contra o Sistema de Corrupção” (Ed. Sextante), Moro faz uma espécie de acerto de contas com Bolsonaro, mostra os evidentes desencontros éticos entre um e outro e conta episódios que o governo distorceu e distorce, como a história de que Moro saiu porque não conseguiria um cargo de ministro do STF. Moro diz que Bolsonaro mentiu em relação ao desejo de Moro pela vaga no STF, que ele jamais havia negociado: “Já havia entendido que o presidente precisava de um ministro leal a ele em um sentido que eu não estava disposto a ser. Não ingressei no governo para proteger quem quer que fosse.”

Com a entrada oficial de Bolsonaro no PL, partido do Centrão, comandado pelo notório Valdemar Costa Neto, um trecho do livro ganha ainda maior realismo: “Vejo atualmente o governo Bolsonaro muito parecido com o governo Lula, especialmente na parte ética. Algumas coisas diferem, sim, mas nem tanto. Vale a pena igualar-se ao adversário para alcançar e manter o poder?”

Em entrevista ao Estadão, Moro revelou que o livro começou a ser escrito assim que saiu do governo e que a situação do Brasil de hoje, não é muito diferente, em seus aspectos negativos, daquela provocada pelo PT: “Não conseguimos avançar se os incentivos são errados, como o mensalão, o Petrolão e agora esse cenário do orçamento secreto, que falta transparência, que gera pulverização do orçamento. Ou seja, nós não estamos indo na direção correta.  As coisas não vão melhorar enquanto o País estiver nos trilhos errados, como está agora, como esteve durante o governo do Partido dos Trabalhadores.”

Esse é o Moro candidato e fica fácil perceber que ele está sendo sincero. A caminhada até o poder, se ele conseguir chegar até lá, terá muitos percalços, muitas dificuldades, pois seus adversários são poderosos. Mas o que fica até agora, desde que ele voltou ao Brasil, é de que se trata de alguém disposto e preparado a levar adiante um plano de governo bem diferente – e, quem sabe, no rumo certo – de tudo que tivemos nos últimos 18 anos.

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Edmilson Siqueira é jornalista

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1 thought on “Moro já incomoda. Por Edmilson Siqueira

  1. Concordo em gênero, número e grau com o texto.
    Desde janeiro de 2019, quando o atual presidente começou no primeiro mês do seu governo (!?!) a fazer campanha de sua reeleição digo como um mantra que até hoje longe de se desfazer se comprova a cada dia: Lula e Bolsonaro são faces de uma mesma moedinha falsa e vagabunda de três reais. Não são idênticos, mas se equivalem na ignorância, na pretensa esperteza, no populismo e no natural desprezo que sentem pelo povo deste país, sem contar com o elevado apreço e consideração que sentem por si mesmos.
    Não merecemos esse tipo de ser humano na política.

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