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Muito estranho. Por José Horta Manzano

… nunca mais tratou nenhum ministro do Supremo de bandido, nem de canalha. A última vez foi naquela palhaçada que cometeu no 7 de Setembro. De lá pra cá, enfiou a viola no saco e se calou…

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Andei fazendo as contas e percebi que faz hoje (20) 43 dias que Bolsonaro parou de conclamar seus devotos a “fecharem” o STF e o Congresso. Lembra da época em que ele fazia isso dia sim, outro também? Pois é, nunca mais tratou nenhum ministro do Supremo de bandido, nem de canalha. A última vez foi naquela palhaçada que cometeu no 7 de Setembro. De lá pra cá, enfiou a viola no saco e se calou.

A carta que Michel Temer escreveu (e que ele assinou) não chega a ser um pedido de desculpa. Mas é evidente ato de contrição, uma promessa de se emendar. Na época, todos imaginaram que ela valia tanto quanto valem as promessas do capitão. Acreditou-se que ele estava agindo como o garoto malvado que, uma vez repreendido, promete se emendar, mas no dia seguinte torna a fazer malvadeza.

Quem conhece o capitão – e todos os brasileiros já o conhecem – sabe que ele não é homem de cumprir promessa. Se recua num dia, é para reincidir no dia seguinte. Não costuma aguentar mais que 24 horas sem cometer os mesmos desatinos.

Mas, ainda que soe esquisito, parece que ele se emendou de vez. Considerando que quarenta e tantos dias sem atiçar a milícia contra as instituições é muito tempo, a pergunta inevitável é: “Que tipo de ‘repreensão’ terá sido essa, que, de tão eficaz, fez calar o capitão?”

Logo depois do fatídico 7 de Setembro, a imprensa se referiu à carta de contrição e esclareceu que o presidente tinha tido “uma conversa telefônica com o ministro Alexandre de Moraes, do STF”. O teor do diálogo, que era o que realmente importava, não foi divulgado.

Dias depois, o deputado Paulo Pimenta (PT) soltou um tuíte intrigante, que, não sei por que razão, não teve direito a ampla divulgação. Eis o que revelou o parlamentar:

“Bolsonaro foi avisado por Temer q Carluxo seria preso depois do 7 de setembro. O Machão aos prantos ligou para Alexandre de Moraes, implorando, pedindo perdão, e prometendo ‘nunca mais’ ofender o STF ou seus Ministros. Quem assistiu relata a patética e vergonhosa cena. Quem acompanhou o desenrolar das tratativas afirma que foi pior do que meu relato. O desespero de Bolsonaro pedindo que Temer viesse às pressas para Brasília foi ‘comovente’ e ainda será lembrado por muito tempo nos escaninhos do Palácio Alvorada. Carluxo nunca mais foi visto.”

Este blogueiro, que não costuma frequentar palácios, não assistiu à cena. Portanto, não posso jurar que a narração corresponde à verdade verdadeira. Mas o comportamento do capitão tende a confirmar o relato do deputado.

Todos sabem que o maior medo do presidente é que ele ou algum dos filhos seja preso. Portanto, é permitido acreditar que só o risco real de prisão iminente do filho destrambelhado seria capaz de fazê-lo recuar.

Na falta de outra, é a melhor explicação para a radical mudança de rota de Bolsonaro. Uma vez amansado, vê-se que o tigre era de papel. Ainda outro dia, num ataque de sincericídio perpetrado diante de devotos, andou confessando que costuma chorar no banheiro, e que não é o “machão” que gostaria de parecer.

Agora sabemos que o homem se verga fácil. Quando apavorado, mia fino e pula no colo igualzinho ao gatinho lá de casa.

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JOSÉ HORTA MANZANO – Escritor, analista e cronista. Mantém o blog Brasil de Longe. Analisa as coisas de nosso país em diversos ângulos,  dependendo da inspiração do momento; pode tratar de política, línguas, história, música, geografia, atualidade e notícias do dia a dia. Colabora no caderno Opinião, do Correio Braziliense. Vive na Suíça, e há 45 anos mora no continente europeu. A comparação entre os fatos de lá e os daqui é uma de suas especialidades.

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2 thoughts on “Muito estranho. Por José Horta Manzano

  1. Mesmo sendo verdadeira essa história do Carluxo, mesmo assim, natureza é natureza, cada um tem a sua e no caso do presidente, ela chega às raias do incontrolável. Acredito ser uma questão de tempo para que ele volte sua artilharia novamente contra o STF. A paz com ele nunca foi, é ou será definitiva.
    Esse calcanhar de Aquiles é recente e ainda inspira cuidados.
    Carluxo, por outro lado, continua na ativa, porém menos exposto.
    A conferir.

  2. O que mais impressiona na história envolvendo o zerodois (a se aceitá-la verdadeira) não é exatamente a insuspeita ternura paternal do capitão, mas a incrível relatividade (ou a instabilidade evanescente) da lei. A ser verdadeira a historinha, tudo nela se passa como se a aplicação de lei, ou seja, a prisão (seja o carluxo um investigado, um suspeito, um réu, alguém passível de detenção) dependesse da auto-humilhação de um papai e da dadivosidade pessoalíssima de um juiz (neste caso, note-se, da corte suprema do país). Suponhamos que o capitão não choramingasse ao telefone. Estaria agora o zerodois roendo as grades? Afinal, havia ou não motivos legalmente amparados para a prisão? Se sim, basta um pai amolecer as pernas e o juiz desculpa o filho que deve ser detido? Se não, pode um juiz acenar com a prisão do filho apenas para punir atos do pai com os quais não concorda – ou seja, chantagear a família? Toda a história é muito estranha, como lembra Manzano. Gostaria de crer que a história é invenção da mente do deputado (coisa bem possível, sendo ele quem é), mas, neste país cheio de bananas, pode realmente não ser…

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