Companhia chata, comida ruim. Coluna Carlos Brickmann
COMPANHIA CHATA, COMIDA RUIM
COLUNA CARLOS BRICKMANN
EDIÇÃO DOS JORNAIS DE DOMINGO, 11 DE ABRIL DE 2021
Estranho jantar, esse de Bolsonaro com bilionários. Bilionários? Da lista da Forbes, havia cinco – entre eles, claro, não estava o anfitrião, Washington Cinel, empresário de segurança patrimonial. Mora numa esplêndida casa, que foi de Antônio Ermírio de Moraes e fica em frente à casa de Paulo Maluf. É rico, mas longe de ser bilionário. A propósito, Cinel anunciava para este fim de semana grande número de demissões em sua empresa. Conforme apurou a revista Época, estes empresários de primeiro time devem uns R$ 200 milhões em impostos federais e Previdência.
Havia coisas esquisitas no jantar. Por exemplo, juntos, lá estavam Paulo Guedes e Roberto Campos – sendo que Campos é apontado como Plano B no caso de Guedes sair do cargo. Pìor, no meio da aglomeração, Campos fez o possível para ficar sem máscara.
Havia mais ministros do que bilionários; mais, o presidente levou seu filho Eduardo “Bananinha” Bolsonaro. E, dos sete ministros, deve ser descontado Roberto Campos, que não é ministro. Quanto à comida – quando conheci Washington Cinel, ele comia bem, sem frescuras. Mas, quando o pessoal enrica, muda a comida: certa vez, na casa de um empresário de porte, contrataram uma discípula de Ferran Adriá, o cozinheiro espanhol; e ela precisava explicar prato por prato. Por exemplo, uma desconstrução de ouriço. Na saída, todos com fome, o empresário que foi homenageado nos levou ao McDonald’s.
Não é do que gosto, mas que fazer?
Não foi bem assim
Havia alguns bilionários – mas faltou, por exemplo, o trio da AB-Inbev, Jorge Paulo Leman, hoje o homem mais rico do Brasil, Marcel Telles, Carlos Alberto Sicupira. Itaú, Moreira Salles? Não. Faltou gente. E com um detalhe: Luiza Trajano trabalha para auxiliar o Governo na busca por vacinas e na correção de falhas de infraestrutura. Abram Szajman, da Federação do Comércio, altamente representativo, não estava lá. Quem estava aproveitou a chance para, digamos, aproximar-se de Roberto Campos – quem sabe ele não acaba ocupando o lugar de Paulo Guedes, mais dia, menos dia?
Quem?
O mais tranquilo dos ministros foi o novo chanceler, Carlos França. Como ninguém o conhecia, pôde circular tranquilo, sem responder a perguntas.
A caminho de ser ex
Um dos ministros, ao menos, corre o risco de perder o cargo, acusado por países estrangeiros de nada fazer em prol do meio ambiente: Ricardo Salles. Até agora ele tem se mostrado especialmente resistente. Mas a última briga ambiental pode criar-lhe problemas: o Ibama apreendeu vinte mil toras de madeira ilegalmente abatidas, e Salles, procurado pelos acusados, até agora vem lhes dando razão – e batendo de frente com o Ibama. É uma atitude que agrada a Bolsonaro, mas pode levar a represálias às exportações do Brasil.
Lembranças
O ministro Luís Barroso usou um argumento forte para determinar que o Senado instale a CPI da Covid: todos os requisitos exigidos para a CPI já foram cumpridos, e a instalação não se fazia apenas porque o presidente da Casa não tomou a iniciativa de iniciá-la. É verdade: mas a CPI da Lava Toga, para investigar o comportamento de ministros do STF, está no mesmo caso – todos os requisitos exigidos foram cumpridos. Até agora ninguém mandou instalá-la. Talvez falte só algum parlamentar que cobre do STF a decisão.
Investigando o massacre
O fato é que, além de estar tudo equacionado para a implantação da CPI, há algo que não pode ser esquecido: os 350 mil mortos, enquanto Bolsonaro falava de gripezinha, conversinha de segunda onda, excesso de mimimi. Foi gente demais que já morreu. E as piadinhas de Bolsonaro com a morte dos outros definitivamente não podem ser toleradas, nem tratadas como humor.
CPI, sim ou não
Que é que se espera de uma CPI? Talvez não muito: o Governo tem apoio do Centrão e esse apoio é suficiente para evitar que as investigações atinjam o presidente. Mas tudo pode acontecer- especialmente se lembrarmos que ninguém compra o Centrão – no máximo, o aluga. Uma CPI pode despertar em parte do Centrão a vontade de cobrar mais caro e, se suas reivindicações não forem aceitas, podem se irritar. O Centrão apoiava Dilma Rousseff até que deixou de apoiá-la. Ela caiu.
Os limites de cada um
Uma dúvida sobre a CPI da Covid: até onde vai o limite da investigação? Esquecer de comprar vacinas, esquecer que vacina exige seringa e agulha, esquecer que nenhum dos produtores de imunizantes conseguiria produzir doses suficientes é uma coisa; furar o teto das despesas é outra e pode levar ao impeachment. A luta para ignorar o teto da despesa, como quer o Centrão, fará com que o Governo perca boa parte de sua equipe econômica, já que todos estariam no alvo das investigações, correndo riscos pessoais.
“Quem estava, aproveitou a chance para,
digamos, aproximar-se de Roberto Campos.”
Pelo jeito, vem aí um novo programa:
Pequenos Ministros, Grandes Negócios
(ou Pequenos Juros, Grandes Inflações…)