SR. BRUNO

Prezado Sr. Bruno. Por Flávio F. Figueiredo

PREZADO SR. BRUNO

FLÁVIO F. FIGUEIREDO

Dê uma passeadinha nas imediações de seu gabinete, sem aviso. Ficará estarrecido…

PUBLICADO ORIGINALMENTE EM O ESTADO DE S. PAULO, 
OPINIÃO, PÁG. 2, O ESTADO DE S. PAULO, 
EDIÇÃO DE 20 DE JANEIRO DE 2021

Mais de 3 milhões de pessoas votaram no senhor para gerir a cidade de São Paulo. Desta vez foi o seu nome que escolheram para prefeito, e não para vice. O cargo chega às suas mãos pela porta principal. Agora é hora de avançar, estamos vivendo um momento crucial, econômico, político e social. Precisará estar acima de intrigas, brigas por espaços territoriais e até de futuras eleições, visto que já garantiu que não deixará o cargo por elas.

As pessoas que votaram no senhor vivem nos Jardins Paulista e Ângela, nas Vilas Nova Conceição e Cachoeirinha, em todos os bairros da maior e mais vibrante cidade do País, entre as maiores do mundo. São ciclistas, motoristas, pedestres, deficientes físicos, idosos, usuários de transportes coletivos de todos os modais, que se locomovem diariamente por São Paulo, precisam de assistência médica, educação, lazer e toda sorte de serviço público.

E que encontram seus eleitores e o restante da população?

Entre outras irregularidades, pavimentação ondulada, esburacada ou irregular, bueiros abertos, armadilhas cujas tampas vêm sendo roubadas até à luz do dia e jamais substituídas. Sem falar da sinalização. Muitas vezes chegar a um endereço é um ato heroico. Placas imundas, de impossível leitura, desgastadas pelo tempo, danificadas por acidentes ou vândalos e nunca substituídas muitas vezes indicam a rua errada. Não há aplicativo que ajude.

A rua foi pavimentada? Imediatamente, demonstrando falta de coordenação, concessionárias de serviços públicos aparecem para abrir valas e fazer remendos que parecem especialmente projetados para não durar e cuja execução nunca, ou raramente, é devidamente inspecionada pela Prefeitura. As cicatrizes são visíveis e sentidas em incontáveis solavancos, quando não causam acidentes, em especial para motociclistas e ciclistas.

Ninguém mais aguenta esperar meses pelos atendimentos mais corriqueiros em hospitais ou ver regiões ou vias sendo degradadas por moradores que nelas instalam barracas onde bem entendem, depreciando todo o entorno. Também é insuportável e insalubre o lixo persistente em determinados locais, apesar da fortuna que é gasta mensalmente com varrição e coleta. Áreas e equipamentos públicos sem manutenção não ficam atrás na interminável lista de problemas que parecem insolúveis. E as árvores apodrecidas, prontas para cair na primeira oportunidade, ceifando vidas e causando danos ao patrimônio público e privado, quantas!

Também não é certo deixar pessoas viver em áreas perigosas para si ou para terceiros, em encostas de alto risco ou embaixo de viadutos, em barracos cheios de botijões de gás e “gatos” elétricos, muito menos em prédios irregularmente ocupados e que não atendem aos mínimos requisitos de segurança. Coitadinhos dos moradores, lamentam-se todos quando há acidentes. Parece que ninguém sabe que as ocupações têm “gerentes” que cobram aluguéis, lucram com elas, mas não prestam o menor serviço de manutenção.

Onde está a zeladoria da nossa cidade? Infelizmente, e daí este nosso apelo, não existe, não há preocupação com manutenção e conservação tecnicamente adequadas: concluída uma obra ou instalado um equipamento, ninguém os observa ou busca mantê-los em condições de uso efetivamente adequadas. Manutenção não tem placa de inauguração e por isso não fica registrada para a posteridade. Talvez isso explique muitas coisas, que precisam ser mudadas.

Não adianta insistir em fórmulas desgastadas, que se mostram ineficazes há décadas, sr. prefeito. É necessário agir, motivando os servidores e a população e estabelecendo metas práticas, sem poesia ou palavras de efeito.

Sugiro que o senhor dedique alguns dias, neste início de mandato, para visitar a cidade, do centro até a periferia, ou vice-versa. Não se esqueça de levar um caderno com muitas folhas e umas duas canetas, pois a lista de irregularidades que encontrará é simplesmente gigantesca. Se não tiver muito tempo, dê uma passeadinha nas imediações de seu gabinete, sem prévio aviso, para ninguém preparar um cenário de conto de fadas. Tenho certeza que ficará estarrecido com a situação de abandono generalizado e de redução das atividades de serviços e comércio, que começou muito antes da pandemia de covid-19.

A situação é gravíssima e apenas a intervenção enérgica do poder público poderá revertê-la, como já foi feito em outras cidades igualmente importantes no mundo, que chegaram ao fundo do poço e hoje oferecem excelentes condições a seus habitantes e visitantes.

Por favor, mantenha uma equipe à altura, composta por pessoas idôneas, que ponham o interesse da população acima dos seus próprios, e cobre de seus integrantes determinação e coragem para fazer o que precisa ser feito para nos tirar do abandono. A cidade não suporta mais ver gente jogando para a torcida.

Os 3 milhões de pessoas que votaram no senhor – e também outros tantos milhões que não o escolheram – merecem viver numa cidade melhor, em todos os aspectos.

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*Flavio F. de Figueiredo –  ENGENHEIRO CIVIL, CONSULTOR, CONSELHEIRO DO INSTITUTO BRASILEIRO DE AVALIAÇÕES E PERÍCIAS DE ENGENHARIA DE SÃO PAULO (IBAPE/SP), É COORDENADOR E COAUTOR DO LIVRO ‘VISTORIAS EM OBRAS CIVIS’ (ED. LEUD, 2018) E COORDENADOR DO LIVRO ‘PERÍCIAS EM ARBITRAGENS’ (ED. LEUD, 2019)

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