Castrado e chipado: será isto o novo normal? Por Meraldo Zisman
CASTRADO E CHIPADO
SERÁ ISTO O NOVO NORMAL?
MERALDO ZISMAN
Espalharam a visão da morte e contaminaram, como um fantasma que desta vez seria real, as populações de todos os países e aldeias do Planeta, dentro de uma realidade atemorizante pela própria finitude. Acertaram no alvo e vitalizaram esse sentimento, tornando assim o Medo Existencial da Morte público, manifesto e de natureza descomedida…
A cobertura da mídia é um medidor falho da importância dos acontecimentos. No final de março de 2020, 80% dos artigos mencionaram os verbetes “covid”, “coronavírus” ou de significado assemelhado, segundo um artigo do periódico inglês The Economist (19 de dezembro 2020): “mais de 80% das notícias, seja por artigos, piadas, desenhos, qualquer meio de comunicação novo, velho, antigo neste denominado hoje de normal e (prossegue a vetusta publicação) nem as duas Grandes Guerras alcançaram tamanho fulgor noticioso. Sobretudo do ponto de vista do efeito de fazer desabrochar o maior e mais primário sentimento humano: o medo da morte.”
Alavancaram, sem dúvida, esse medo, criando uma aterrorizante e avassaladora pandemia baseada nesse medo atávico (antepassado, congênito, hereditário).
Espalharam a visão da morte e contaminaram, como um fantasma que desta vez seria real, as populações de todos os países e aldeias do Planeta, dentro de uma realidade atemorizante pela própria finitude. Acertaram no alvo e vitalizaram esse sentimento, tornando assim o Medo Existencial da Morte público, manifesto e de natureza descomedida. Que certamente é mais ameaçador do que o vírus que noticiam. Esquecem-se de que a morte sempre acontece, como anuncia o dizer popular: “está morrendo gente que nunca morreu”. Erradas ou não as diversas falas cibernéticas, é este vírus o campeão – de longe – da recordação, pois usam o marketing para divulgar ‘ad nauseam’ o velho e verdadeiro Medo da Morte, que sempre foi e será, independente dos progressos médicos, por mais avançados que sejam.
Saber que todos nós vamos morrer é um permanente terror subliminar e uma das razões para que o número de suicídios, apesar de aumentado, não seja pandêmico. Mas, voltando aos meios de comunicação do gênero “Homo” dito “Sapiens” que fazem desse medo atávico um espécime de ‘suspense’ global ou ameaça globalizada como se a presente fosse a primeira pandemia ocorrida no Planeta. Nunca em minha já longa vida assisti tamanha cobertura jornalística. Mas vamos em frente até porque não existe mais nada atrás de nós e não me venham contar que os ‘jornalistas’ buscam noticiar os fatos reais, quando na verdade lutam apenas pelo pão deles de cada dia.
Muito embora o medo de morrer crie os crentes, jamais realmente saberemos como deslembrar dessa temida não infinitude. O medo é o Senhor de nossas vidas enquanto vivos estivermos. Somente desaparece depois da morte e eu ainda não morri. Medo é medo e quanto mais medo mais o terror aumenta.
Porém, voltando aos noticiários dessa Covid, o fato é que a campanha de terror ganhou, de longe, até de assuntos sobre sexo, imagine sobre outras coisas mais. Eclipsou até o Dinheiro e a Economia. Peço ao leitor que, por favor, não me venha com a baboseira de dizer que os fazedores das mídias noticiam também as melhorias humanas alcançadas. Essas jamais dão manchetes nauseantes e repetitivas.
Para eu não ser considerado pessimista, reconheço que o século XXI também trouxe um surto de notícias referentes à “internet” ou à frase “estar online” e às citações lapidares como “fazer a cabeça” e “tá ligado ou desligado” e outros efeitos secundários. Neste início de século, as maiores mudanças em nossa vida diária foram o advento do “worldwide web” e o dos ‘smartphones’. Já não saberia dizer se é vantajoso o advento do Home Office, se ele nos força a procurar comida em restaurantes onde agora é tudo “delivery”. Nos tempos dos aprendizes, os jovens aprendiam os ofícios com os denominados Mestres.
E agora? Os velhos não falam a linguagem dos internautas, o que talvez nos leve de volta à idade da pedra lascada, pois sem vivência e experiência não há cultura que é, antes de tudo, cumulativa. Ou estaremos todos lascados diante das telinhas de bolso, ou das geringonças tecnológicas. Talvez venham a nos implantar, quando nascermos, chips com circuitos integrados, sejam localizados no cérebro ou debaixo da pele, como já fizeram ao meu cão, comprado de um grande canil especializado na sua raça, além de castrá-lo para evitar que tenha descendentes da sua linhagem, evitando que o canil de luxo sofra prejuízos materiais. Advirto: o cão já me foi vendido castrado e chipado. Lindo e estéril. Apesar disso, passou a ser meu melhor amigo e mais fiel companheiro. E chega de blablabá. Pergunto: será isso o tal de novo normal que apregoam na mídia? Deus me livre. Prefiro a vida sem chips e jamais ser castrado.
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Meraldo Zisman – Médico, psicoterapeuta. É um dos primeiros neonatologistas brasileiros. Consultante Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha). Vive no Recife (PE). Imortal, pela Academia Recifense de Letras, da Cadeira de número 20, cujo patrono é o escritor Álvaro Ferraz.