Amanhã vai ser outro dia. Coluna Carlos Brickmann
AMANHÃ VAI SER OUTRO DIA
COLUNA CARLOS BRICKMANN
EDIÇÃO DOS JORNAIS DE DOMINGO, 13 DE DEZEMBRO DE 2020
Um dos eventos mais importantes dos últimos tempos, para o Brasil, é o que ocorre amanhã nos Estados Unidos: neste 14 de dezembro, o colégio eleitoral americano deve homologar Joseph R. Biden como novo presidente da República. Trump apresentou à Suprema Corte um pedido de anulação em massa de votos de Estados em que foi derrotado, mas é provável que a petição sequer seja recebida. Trump, dizendo que a administração de Biden será péssima, já admitiu a derrota. Agora, só Bolsonaro desafia a realidade.
Em diplomacia, tudo é possível – inclusive uma boa relação de Biden com Bolsonaro, como a que havia entre Lula e Bush. Mas o Brasil está preso a círculos de giz ideológicos e tem de livrar-se deles. Os problemas ambientais causam dificuldades com a União Europeia – e não importa que os gringos usem esses problemas como pretexto para prejudicar um forte concorrente agrícola. O Brasil lhes deu o pretexto; e, em vez de reagir com competência (como a ministra Tereza Cristina, a cada uma das patacoadas governamentais contra o maior parceiro comercial do país, a China), brigou com a Europa e criticou a silhueta da esposa do presidente francês.
Os países do Mercosul querem assinar o acordo com os europeus, mas a política ambiental brasileira travou o processo. O culpado não é o ministro Ricardo Salles, executor da vontade de Bolsonaro; mas é provável que tenha de ser sacrificado. Nomear um chanceler seria bom. Nessa hora não podemos deixar vago o Itamaraty.
As convergências
As divergências entre Biden e Bolsonaro existem e são sérias, lembrando que nosso presidente apoiou sem disfarce o candidato derrotado e que Biden, se quiser agradar aos grupos ambientalistas europeus e americanos, tem nele um alvo magnífico. Mas há convergências, também: Biden falou em investir forte num fundo de proteção à Amazônia (US$ 20 bilhões só dos EUA), e provavelmente estará disposto a, sem vetar a Huawei, financiar investimentos em 5 G nos quais os chineses tenham menor relevância. Brasil e EUA são os maiores exportadores mundiais de alimentos e têm muitos acordos a buscar. Um deles: o carro elétrico. Milhões de carros elétricos deixarão, mais cedo ou mais tarde, milhões de enormes baterias fora de uso. Onde armazená-las? Brasil e EUA produzem álcool e podem usá-lo em carros híbridos de baixíssima emissão de carbono, e sem usar hidrogênio.
Parente é serpente
Biden e Bolsonaro têm outra particularidade comum: filhos. A filharada, ao que dizem, tem o que contar. Mas o filho de Biden não fala nem usa Twitter.
Bububu no Bobobó
Nixon estava com a reeleição ganha mas quis porque quis espionar o QG do adversário, no edifício Watergate. No meio do mandato, renunciou para não ser cassado. Um motorista informou que Antônio Palocci, o ministro do PT mais querido pelo empresariado, frequentava uma casa onde, dizia-se, a negociação era solta. Escandaloso, só que passageiro. Mas resolveram desacreditar o testemunho, violaram seu sigilo bancário. O escândalo picante virou caso político e derrubou o ministro. O inquérito sobre Flávio Bolsonaro vinha se arrastando de tal maneira que só terminaria quando o bisneto da rainha Elizabeth assumisse o trono. Mas resolveram garantir o empate: a Abin, uma agência de informações que deveria estar a serviço do Estado, não do governo de plantão, foi trabalhar na defesa do filho 01.
Isso é daquelas coisas que podem dar impeachment. Vai dar? Não se sabe. Mas custa caro.
Cadê a casca?
Neste governo, se souberem que alguém pegou uma banana, vão lutar para descobrir a casca e pisar nela. A Abin é dirigida pelo delegado Alexandre Ramagem, que Bolsonaro queria colocar na chefia da Federal do Rio. O caso traz de volta a denúncia quase esquecida de Sergio Moro, de que Bolsonaro queria interferir na autonomia da Polícia Federal. Se o Centrão ganhar a Presidência da Câmara, impeachment não passa. Mas haja cargos.
A banana inteira
Bolsonaro está entrando em outra guerra que lhe será custosa. Segundo o governador goiano Ronaldo Caiado, as vacinas que vierem para o Brasil serão requisitadas pelo Governo Federal, que as usará no Plano Nacional de Vacinação. Mas cadê o plano? Só agora o Brasil negocia com a Pfizer. Quer 70 milhões de vacinas (não chegam a 30% das necessárias) mas a Pfizer, que pode fabricar um bilhão de doses por ano, já fechou com EUA, Europa, até com Israel. Quantas teremos em janeiro? Um milhão? Mais 2 milhões da CoronaVac, que ameaçam requisitar de São Paulo? Digamos, três milhões? É algo como 1% do necessário.
Mas não há seringas nem luvas de látex. Pode dar certo e ficamos todos na torcida. O militar-especialista-em-logística que está no Ministério da Saúde, o General Cloroquina, não tinha pensado nisso.
A vontade do Senado
Não vai dar isso, mas o Senado gostaria é de eleger Renan Calheiros.
A Abin e o 01. Se tudo der certo, os advogados do boçal seguem as estratégias sugeridas pela nossa intelligentsia milica top-de-linha. Considerando-se o perfil neuropsiquiátrico e o QI dos arapongas em questão, é uma vitória certa! Vitória do Ministério Publico. Enfim, talvez ainda reste algo a comemorar nestes Tristes Trópicos.
Boa noite, Carlos Brickmann.