O duro cumprimento do dever. Blog do Mário Marinho
O DURO CUMPRIMENTO DO DEVER
BLOG DO MÁRIO MARINHO
Há alguns anos, quando eu era repórter, amigos meus, companheiros de clubes, vizinhos, costumavam fazer o seguinte comentário quanto à minha profissão:
– Isso é moleza: todo mundo paga para ver futebol e você, não. Você ganha para isso!
E todos eles queriam estar em minha posição, assistindo ao futebol nas cabines, indo aos vestiários entrevistar os craques como Pelé, Rivellino, Gylmar e tantos outros.
Até que num sábado de verão, sol maravilhoso, sai apressadamente do Clube, pouco antes do meio dia e me encontrei com um companheiro que chegava.
– Tá indo embora?
– Tá na hora, respondi.
– Como na hora? Não vamos tomar uma cervejinha?
Teoricamente, o sábado era meu dia de folga, já que o Jornal da Tarde não circulava aos domingo.
– Vai trabalhar hoje?
– Sim. Tem futebol.
– Quem joga?
– Juventus e São Bento de Sorocaba, na rua Javari.
– Pelo amor de Deus! Você vai nesse jogo?
– Claro.
O chefe de reportagem do JT, que era o Vital Battaglia, me escalou para aquele jogo, aparentemente sem importância.
Mas era importante.
Naquele sábado fazia sua estreia o juiz Roberto Goicohéa, um argentino famoso por sua severidade e imparcialidade dentro de campo e que fora contratado pela Federação Paulista de Futebol já que eram muitas as reclamações contra nossos juízes.
Minha missão, era acompanhar o juiz desde sua chegada ao romântico estádio da Rua Javari, seu desempenho no jogo e entrevistá-lo após a partida.
Fazia muito calor e eu preferia, claro, ficar na piscina e tomar a cervejinha com os amigos. Mas, o dever me chamava.
Essa parte do dever quase ninguém vê.
Foi assim que me senti ontem, assistindo a Botafogo x Palmeiras pela tevê, ontem. Principalmente quando minha caríssima metade, companheira fiel e constante dos últimos 51 anos, no lar, bar, no futebol, levantou-se da poltrona e disse:
– Esse jogo tá muito chato. Vou dormir.
Olhei para ela com inveja. Acho que a mesma inveja daqueles amigos quando me viam saindo para o futebol.
Fiquei até o final, no duro cumprimento do dever.
Tem sido assim, com raríssimas exceções, os jogos do futebol brasileiro que, parece, estão todos contaminados pela Covid.
O Palmeiras está bem pertinho dos líderes do Brasileirão.
É o 5º colocado com 22 pontos ganhos em 13 jogos. O líder é o Atlético (que ontem foi derrotado) e tem 27 pontos ganhos.
Em 13 jogos, o Verdão ganhou 5, empatou 7 e ontem conheceu sua primeira derrota.
O Botafogo é 14º colocado. Já jogou 14 vezes, tem apenas duas vitórias (a segunda foi a de ontem, 2 a 1), empatou 9 vezes e perdeu 3 partidas.
Teoricamente, o jogo seria bom. Afinal, o Palmeiras, dizem os números, é bem superior ao adversário. Portanto, poderia dominar o adversário e mostrar seu futebol.
Por outro lado, o Botafogo, de tantas glórias, deveria lutar com todas as forças para sair da incômoda posição de vizinho muito próximo da escorregadia zona de rebaixamento.
Mas, não.
O que se viu em campo foi um péssimo jogo.
Jogadores pareciam febris, sem forças para correr, chutar, cabecear, criar jogadas.
Foi um primeiro tempo que fez minha Caríssima Metade desertar e me abandonar.
O segundo tempo teve lampejos de bom futebol.
Mas os lances de maior emoção ficaram por conta das intervenções do VAR e as expectativas que causam suas demoradas decisões.
Que, aliás, diga-se de passagem, foram acertadas.
Eu sobrevivi como testemunha viva de mais um péssimo espetáculo do que, antigamente, chamava-se esporte bretão.
Leio, hoje pela manhã, que Corinthians e Santos também fizeram um clássico abaixo, bem abaixo do que se esperava deles. Empate: 1 a 1
O São Paulo, aleluia, venceu seu adversário, o Atlético Goianiense, 3 a 0, no Morumbi, mas a torcida continua querendo a cabeça do técnico Fernando Diniz.
Serão os técnicos os únicos culpados?
Em campo,
a Seleção Brasileira.
A simples menção de jogo da Seleção Brasileira, já foi motivo para despertar interesse, corre-corre para comprar ingressos, motivo de discussões sobre a escalação, para protesto sobre a não convocação deste ou daquele jogador.
O jogo de amanhã, contra a Bolívia, não é um amistoso qualquer: é o começo da caminhada para a Copa do Catar, daqui a dois anos.
Mas, quem se importa?
Aliás, vale uma pergunta: dos 23 convocados, quantos você conhece?
Foram convocados estes laterais direitos:
Danilo, Gabriel Menino, Alex Telles e Renan Lodi.
Quantos dos quatro você conhece?
E onde jogam os meias Bruno Guimarães e Douglas Luiz?
Mas, claro, estarei frente à tevê e, espero, não seja apenas para cumprir o duro dever.
Não,
não resisto.
Como se sabe, elogio de própria boca é vitupério. Portanto, é lógico, não vou me elogiar.
Mas não resisto e quero registrar, com agradecimentos, ao e-mail enviado pelo jornalista e escritor imortal Ignácio de Loyola Brandão, ao grande Carlinhos Brickmann, criador deste portal Chumbo Gordo que abriga essas linhas que tentam ser sempre bem traçadas.
Eis a mensagem:
Brickmann
(Não sou intimo para te chamar de Carlinhos)
Li o Marinho hoje.
Licença do INSS.
Acabou, me perguntei:
por que dizem que eu
é que escrevo distopias.
O INSS é puro Kafka.
Ele escreveu uma peça literária, de ponta a ponta.
Baita abraço
Ignácio
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Mário Marinho – É jornalista. É mineiro. Especializado em jornalismo esportivo, foi durante muitos anos Editor de Esportes do Jornal da Tarde. Entre outros locais, Marinho trabalhou também no Estadão, em revistas da Editora Abril, nas rádios e TVs Gazeta e Record, na TV Bandeirantes, na TV Cultura, além de participação em inúmeros livros e revistas do setor esportivo.
(DUAS VEZES POR SEMANA E SEMPRE QUE TIVER MAIS
NOVIDADE OU COISA BOA DE COMENTAR)
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Muito justo e bacana o elogio.
Parabens!!!1