A menina-mulher, o centro do Universo. Por Meraldo Zisman
A MENINA-MULHER, O CENTRO DO UNIVERSO
MERALDO ZISMAN
… Fiquei alarmado ao ver a violência familiar ser motivo de polarização política ou religiosa. O nível religioso, independente do nível social e/ou econômico-financeiro, o número de pessoas que já me relatou estarem estupefatas com a justiça brasileira abonarem a interrupção da gestação diante de uma vida que ali se encontra, torna o relato ainda mais estarrecedor.
Violência, verbete que carrega em quatro sílabas todo o horror que se possa imaginar. A violência intrafamiliar é uma das formas de violência, uma das questões sociais que mais causam preocupação e é abordada como um problema de saúde pública no mundo como um todo. Especificamente, é a que se refere a todas as formas de abuso que acontecem entre os membros de uma família, caracterizando as diferenças de poder entre estes. No desenvolver a relação de abuso, devo incluir condutas de uma das partes ou qualquer outro membro da família: os abusados/as podem ser crianças pelos pais ou parentes próximos ou não (até mesmo os padrinhos).
Entretanto, devemos prestar uma atenção redobrada aos incontáveis abusos às crianças menores de dez anos. Enquanto membro responsável da sociedade é necessário sinalizar o caso às autoridades competentes, tendo sempre em vista o superior interesse dos menores. No caso específico, o da menina de 10 anos abusada por um tio que já foi preso e confessou os crimes, já que foram quatro anos de abuso sexual no Espírito Santo e atendida aqui no Recife por onde passou pelo procedimento. Fiquei alarmado ao ver a violência familiar ser motivo de polarização política ou religiosa. O nível religioso, independente do nível social e/ou econômico-financeiro, o número de pessoas que já me relatou estarem estupefatas com a justiça brasileira abonarem a interrupção da gestação diante de uma vida que ali se encontra, torna o relato ainda mais estarrecedor. Saber que, quando se trata de um caso de gravidez indesejada nessas mesmas famílias, ditas da sociedade – enquanto pediatra soube de muitos casos a interrupção da gestação dava-se sem titubear mas não no Recife, não no Estado mas até mesmo fora do país. O credo não nos isenta do dever de entender que um estupro já caracterizou o crime com gravidez ou sem. Numa menina, então, é duplicado, haja vista ser uma criança carregando outra no ventre e comprometendo sua saúde física, emocional e psicológica para o resto da vida.
… Saber que, quando se trata de um caso de gravidez indesejada nessas mesmas famílias, ditas da sociedade – enquanto pediatra soube de muitos casos a interrupção da gestação dava-se sem titubear mas não no Recife, não no Estado mas até mesmo fora do país…
Dificilmente, uma menina estuprada crescerá e se desenvolverá como as outras. Cientificamente já foi provado sobre os órgãos internos de qualquer criança mais especificamente da menina – em relação ao tamanho do útero, ovários e trompas de falópio – por isso engravidam a partir da primeira menstruação, que pode variar entre os nove e os quinze anos e que possuem um tempo de crescimento oportuno e diferenciado. Creio não ser necessário falar como médico ginecologista. Minha área era pediatria.
Não creio em adesões outras da população mundial e, nesse caso, da brasileira, a qualquer manifestação de boiada, tanto os protestam a favor ou os que são contra. Como cidadãos que respeitam a lei diante de crimes hediondos… Somos todos, aí eu digo, todos (independente do credo, raça ou nacionalidade) obrigados a respeitá-la, e não os que estão que estão nos palanques, nos púlpitos ou nos terreiros.
Salvar uma vida importa e muito, mormente se ela procriará. Uma menina, uma mulher, o centro do Universo.
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Já esperava pronunciamento do professor Meraldo Zisman. Como pediatra e um dos primeiros neonatologistas do país, sua voz sempre atenta, não poderia calar-se. Perfeito o seu artigo. Louve-se o mestre. Samuel Hulak.