Pesquisa boa é a de preços. Coluna Carlos Brickmann
EDIÇÃO DOS JORNAIS DE DOMINGO, 19 de SETEMBRO DE 2021
Depois de um mês afastado, voltei a consultar os supermercados e suas ofertas. Foi um susto: o preço do óleo de soja pulou, as carnes de peixe, frango ou boi subiram tanto que o velho caldo de pé de galinha voltou à moda, quem não gostar que coma ovos – por enquanto. Arroz, feijão, milho, em alta. Feira, sacolão, supermercado, todos cobram o que é difícil pagar.
Esta é a grande pesquisa presidencial: somar motos (e multiplicar o número real por cem antes de divulgá-lo) é bobagem, comparar fotos de manifestações não resolve, pesquisas eleitorais (a um ano das eleições) valem só para que os candidatos orientem suas campanhas. Quem tem razão, o DataFolha e o DataPoder, que indicam que o apoio a Bolsonaro é uma avalanche, só vai para baixo, ou o Paraná Pesquisas que mostra Lula como bem colocado, mas atrás de Bolsonaro? Como ensinou James Carville, o vitorioso marqueteiro de Bill Clinton, o que vale é a comida no prato, é ver os filhos alimentados e agasalhados, é poder comprar móveis a prestação, para preencher espaço nas casas populares ampliadas aos poucos.
É provável que o preço dos alimentos, o desemprego e, para a parte mais politizada do eleitorado, a comprovação de que falta dinheiro para auxiliar os necessitados, mas não falta para mordomias em Executivo, Legislativo e Judiciário, estejam mesmo derretendo a candidatura Bolsonaro. Ou ele cuida disso ou nenhum tanque movido a carvão fará com que se reeleja.
Os números
O Instituto Paraná Pesquisas indica Bolsonaro na frente, com Lula bem perto, em empate técnico; atrás, José Luiz Datena; Ciro em quarto e o governador paulista João Doria em quinto. O DataFolha traz, bem à frente de Bolsonaro, Lula. Mas se dedica mais ao outro lado da questão: de dezembro para cá, a avaliação de Bolsonaro caiu oito pontos. Hoje é rejeitado por 53% dos eleitores. No quesito “neste não voto de jeito nenhum”, ele é o líder destacado, inconteste. Com esse nível de rejeição, é possível até que não passe para o segundo turno.
Falta apenas surgir um candidato viável em sua área para comprovar se esta conclusão é correta ou não.
Ói ele aí outra vez
Comenta-se que o ex-juiz e ex-ministro Sérgio Moro irá voltar em breve ao Brasil. Nos meios políticos, poucos gostam dele, já que representou uma ameaça a muita gente hoje solta e juristas de nome criticaram seus métodos de ação. Como estará seu prestígio? Depende: se não se declarar candidato, quem pensará nele antes de opinar? Mas, se abrir essa possibilidade, será possível avaliar sua popularidade depois de prender Lula, ser ministro de Bolsonaro e romper com ele.
Moro é conhecido, o que pode ser bom ou mau. Conforme as circunstâncias, que pode acontecer? Nixon foi batido por Kennedy, candidatou-se em seguida a governador da Califórnia, perdeu, todos o consideraram politicamente morto. Candidatou-se mais uma vez à Presidência e derrotou Hubert Humphrey, o democrata de ilibada reputação apoiado pelo presidente Lyndon Johnson. Nas palavras de James Reston, do New York Times, “foi a maior ressurreição desde Lázaro”. Eleição tem dessas coisas. Fernando Henrique achava que não teria votos nem para se eleger deputado federal, e dois anos depois se elegia presidente da República, batendo Lula no primeiro turno. Moro ainda tem seus fiéis – quantos?
O golpe e o vice
Se Bolsonaro for derrotado, ou achar que será derrotado, tentará o golpe? Seu vice-presidente, general reformado de quatro estrelas, ex-presidente do Clube Militar, acha que não: na opinião do general Hamilton Mourão, quem acredita em golpe são analistas com os olhos no passado. Mourão acha que 1964, por algum motivo, foi o ponto final da era de intervenções militares que se iniciou com a proclamação da República e passou por 1922, 1924, 1930, 1937, 1945, 1955 e 1961, chegando então a 1964. “Ali termina este papel das Forças Armadas no estamento político brasileiro”.
Mourão não se coloca como candidato nem mesmo a vice. Sugere sair candidato, talvez, a governador ou senador pelo Rio de Janeiro ou Rio Grande do Sul. Acredita que terá o apoio de Bolsonaro. E trocará o PRTB por algum outro partido.
A raiz da crise
Paulo Guedes, o Imposto Ipiranga do Governo Federal (era para ser, dizia Bolsonaro, o grande condutor da Economia brasileira – e, efetivamente, é quem dá a última palavra em todas as medidas: “Sim”, “Sim, Senhor” e “Pois não, Excelência”) acredita que os problemas do país nascem da possibilidade de reeleição. “Aprovar a reeleição”, disse, em entrevista à Rádio Jovem Pan, “foi o maior erro político que já aconteceu no país”. Em sua opinião, há uma fixação constante dos ocupantes de cargos eletivos na conquista do segundo mandato”. Muita gente, incluindo este colunista, concorda com Guedes. Só que é ele, e não quem concorda com ele, que trabalha o Orçamento para permitir medidas que facilitem a reeleição do presidente Bolsonaro.
Bom dia, Carlos Brickmann.
Nos bons anos de Sarney (governança extraordinária em que, mesmo sem Guedes para complicar as coisas, a inflação chegou a uns 30% ao mês), muito se discutiu sobre reeleição. Por fim, entre um pacote econômico e outro, todos ruins, venceu a ideia de que reeleição não era algo muito desejável, e, por isso (já que o imortal não teria direito à recandidatura), concedeu-se ao grande homem de letras um quinto ano de mandato, como prêmio de consolação. Se Guedes soubesse um pouco de história (coisa que, apesar de sua vasta erudição humanista, parece que desconhece por completo, assim como a economia), proporia a seu chefe um quinto ano de mandato. Sim, claro, seria um horror digno de Guedes, mas, afinal, de sua autoria, o que não é?! E ficaria bem com o chefe, sepultando de vez qualquer chance de o Brasil – ou o que restasse dele – dar certo um dia.
(Sinceramente, espero que Guedes não leia isto. Ele costuma aceitar ideias deste tipo.)
Nem Lula, nem Bolsonaro. Ambos se equivalem na esperteza, no populismo barato e na mediocridade. Faces de uma mesma moedinha falsa de três reais.