Caíram o técnico e o pai de santo. Blog do Mário Marinho
CAÍRAM O TÉCNICO E O PAI DE SANTO
BLOG DO MÁRIO MARINHO
João Avelino (Andradas-MG, 10-11-1929 + São Paulo, 24-11-2006) foi um técnico de futebol folclórico do futebol brasileiro. A começar pelo seu apelido: 71.
Aliás, havia diversas versões para esse apelido. Lembro-me que certa vez, o saudoso Sérgio Baklanos contou, num programa de televisão, que o apelido devia-se ao fato de que em uma determinada ocasião, João Avelino (na foto ao alto do blog) havia comido 71 esfihas numa sentada só.
Um exagero, claro. Mas que João Avelino jamais desmentiu, para manter o mistério.
Outra versão dava conta de que Avelino vivia dizendo que 1971 seria o grande ano de sua carreira. É verdade que, em 1971, ele teve brilhante passagem pela Portuguesa de Desportos que foi a terceira colocada no Paulistão daquele ano.
Mas também foi puro folclore.
A origem do apelido, me confirmada pelo próprio Avelino, era bem menos charmosa: remontava à sua juventude, quando serviu exército (chamado Tiro de Guerra em algumas cidades do interior) e recebeu o número 71.
Em sua longa carreira, que começou no Atlético Mineiro, em 1951, e terminou no América de Rio Preto, em 1992, João Avelino, como técnico ou auxiliar, passou por 37 times.
No América, onde encerrou sua carreira, teve 8 passagens.
Além da boa passagem pela Portuguesa, teve também importante passagem pelo Corinthians, quando foi auxiliar técnico do Velho Mestre Osvaldo Brandão na quebra do tabu de quase 23 anos sem título, em 1977.
Em alguns times, teve passagens de um mês, de meses ou até mesmo anis de um ano como foi o caso da Portuguesa.
Mas seu recorde inesquecível foi no Botafogo de Ribeirão Preto: três dias, 1 jogo.
Essa história começa bem antes, segundo relato que ele mesmo me fez, com a histórica e escandalosa vitória do Santos sobre o Botafogo, em 21 de novembro de 1964, 11 a 0, com 8 gols de Pelé.
Esse jogo é histórico e merece registro.
No primeiro turno do Paulistão, o Santos foi enfrentar o Botafogo, em Ribeirão Preto, e perdeu por 2 a 0.
A torcida fez enorme festa. Afinal, era um acontecimento vencer o Santos de Pelé. Segundo testemunhas da façanha, os torcedores pegaram firme na gozação contra Pelé.
Veio o jogo do segundo turno, na Vila Belmiro.
Agora, as testemunhas dão conta que Pelé estava especialmente endiabrado naquele dia. Ele queria jogo e muito jogo.
Veja a reportagem a respeito feita pelo Globo Esporte:
Eis a ordem dos gols: Pelé 3′ 1º, Pelé 8′ 1º, Pelé 16′ 1º, Pepe 19 1º, Coutinho 25′ 1º, Pelé 38′ 1º, Pelé 40′ 1º, Pelé 25′ 2º, Pelé 27′ 2º, Pelé 28 ‘2º e Toninho Guerreiro 45’ 2º.
Pouco tempo depois, o Santos voltaria a Ribeirão Preto, desta vez para enfrentar o Comercial.
Aí, é João Avelino que narra.
“O jogo seria numa quarta-feira, à noite. Na segunda, recebi telefonema do presidente do Comercial, me convidando para assumir o cargo de técnico. Eu teria que me apresentar naquele mesmo dia.
Minha missão seria evitar uma goleada de Pelé e companhia.
Era uma empreitada muito arriscada, mas a vida de técnico foi sempre assim. E desempregado aceita qualquer risco.
Peguei um ônibus e à noite fui apresentado ao elenco.
Tratei de fechar o time na defesa. Perder de pouco era lucro.
Na quarta, fui chamado à sala do presidente.
Sem meias palavras, ele me colocou a par da situação.
– João tá todo mundo com medo de uma goleada. Por isso, resolvei contratar os serviços de um pai de santo. É pra ajudar. Acho que Você não vai se opor, né?
Claro que não.
Na noite do jogo, estádio lotado, terminou o primeiro tempo 0 a 0. Pelé não fazia nada. Pra mim, estava dando certo o esquema de forte retranca que armei. Em muitos momentos, presenciamos discussão dele com o Zito que era o líder do time.
No intervalo, o pai de santo estava eufórico e fazia propaganda do seu “serviço”.
– Cês tão vendo como é que tá dando certo? Cadê o Pelé? Sabe o que eu fiz: armei um serviço em cima dele e do Zito. Eu passei perto do vestiário do
Santos agora e ouvi o Zito dando o maior esporro no Pelé. É o trabalho que eu fiz em cima dos dois.
Pois bem, no segundo tempo, o Negão resolveu jogar. E aí, nem retranca nem trabalho: não há quem segure. Final: Santos 5 a 0, três gols de Pelé.
No vestiário mesmo, eu e o pai de santo fomos imediatamente demitidos.
Passado algum tempo, eu fiquei sabendo o que aconteceu.
No primeiro tempo, realmente o Pelé parecia dormindo em campo. No intervalo do jogo, no vestiário, o Zito realmente deu a maior bronca no Pelé.
Tipo assim:
– Ô Negão, o que tá acontecendo? Cê não vai jogar não? Vai ficar chupando nosso sangue. Para com isso, tem que correr suar a camisa. Cê acha que nome ganha jogo? Cê é Pelé pra suas negas! Dentro de campo cê tem que correr.
Isso aos gritos. E Zito sabia como esculachar uma pessoa. Era amigo de todos os jogadores, mas, em campo, era temido por suas ordens e suas broncas.
Não deu outra, Pelé voltou turbinado.
Acho que tinha uns três minutos de jogo quando ele marcou o primeiro gol.
Eu ainda tava coçando a cabeça, quando ele fez o segundo.
Aí, eu vi que a vaca estava indo mesmo para o brejo.
E foi.
Eu só não contava que, além de mim, ia cair também o pai de santo.
Foi o emprego mais rápido que tive na vida.”
Artilheiros
Recordistas
Segundo a CBF, o atacante Dario é o recordista de gols marcados em um mesmo jogo. Isso aconteceu no dia 7 de abril de 1976, quando ele fez 10 gols no Santo Amaro, em jogo válido pelo campeonato pernambucano.
O recorde de Pelé, estabelecido no jogo contra o Botafogo, naqueles 11 a 0, foi quebrado pelo atacante Dalmar, no dia 20 de novembro de 1966, com nove gols na vitória do Cruzeiro sobre o Renascença, 16 a 0. Jogo oficial.
Assim, com 8 gols, Pelé ficou em terceiro lugar, ao lado de Jorge Mendonça que também marcou 8 gols contra o Santo Amaro, no campeonato pernambucano.
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Mário Marinho – É jornalista. É mineiro. Especializado em jornalismo esportivo, foi durante muitos anos Editor de Esportes do Jornal da Tarde. Entre outros locais, Marinho trabalhou também no Estadão, em revistas da Editora Abril, nas rádios e TVs Gazeta e Record, na TV Bandeirantes, na TV Cultura, além de participação em inúmeros livros e revistas do setor esportivo.
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