A doença de Joaquim Nabuco. Por Meraldo Zisman

A DOENÇA DE JOAQUIM NABUCO 

MERALDO ZISMAN

  Mário de Andrade (1893-1945), um dos expoentes do Movimento Modernista Brasileiro, chamava o fascínio irresistível pelas ‘luzes’ do Primeiro Mundo de “Doença de Joaquim Nabuco”. De um lado do mar sente-se a ausência do Mundo; do outro, a ausência do País. Avistando a Torre Eiffel e outras maravilhas do velho mundo…

Joaquim Nabuco (1849-1910) foi um político, diplomata, historiador e jurista graduado em Bacharel em Direito no Recife e um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras. Grande líder abolicionista e de atuação destacada na Diplomacia.

 O escritor paulista Mário de Andrade (1893-1945), um dos expoentes do Movimento Modernista Brasileiro, chamava o fascínio irresistível pelas ‘luzes’ do Primeiro Mundo de “Doença de Joaquim Nabuco”. De um lado do mar sente-se a ausência do Mundo; do outro, a ausência do País. Avistando a Torre Eiffel e outras maravilhas do velho mundo fica-se com saudade da Baía da Guanabara e do poema de Casimiro de Abreu: MEUS OITO ANOS Oh! que saudades que…

 O brasileiro tem essa péssima mania de idolatrar tudo que vem de fora em detrimento ao nosso similar que, muitas vezes, é muito melhor. Essa “baixa autoestima” nos leva a pensar que somos menores, mesmo quando somos maiores e superiores. Isso é um péssimo exemplo para a nossa juventude.

O passado psicossocial nacional, baseado no aprendizado escolar de sermos um país primordialmente agrícola foi um dos fatores da nossa estagnação cientifica-tecnológica. A exceção foi a criação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), fundada no ano de 1972, no governo Garrastazu Médici. Graças à Embrapa mantemos nossa posição de grande exportador agropecuário.

Outro fator a considerar, a falta de incentivo ao desenvolvimento científico e tecnológico no Brasil, remete à mesma questão histórico-cultural, pois, quando estudante do então curso primário, na década de cinquenta, minha professora ensinava que o Brasil era um país predominantemente agrícola.

Os vários governos populistas levaram muito dos nossos melhores cientistas a seguir a rota de fuga de nossos cérebros (brain drain, em inglês). Emigração provocada pela falta de oportunidades, riscos à segurança, instabilidade política, crises das mais variadas causas… Notar que os emigrantes brasileiros eram pessoas altamente qualificadas e altamente bem-vindas nos países desenvolvidos.

 …Alguns dos jovens que agora estão ‘lá fora’ apresentam o quadro clinico da doença de Nabuco, mas mesmo assim estão lutando para lá permanecer apesar do sofrimento: saudade e desejo de voltar…   

Vale salientar que uma fuga de cérebros é geralmente considerada custosa economicamente, uma vez que os emigrados obtiveram sua formação direta ou indiretamente patrocinada pelo governo brasileiro, seja através da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) ou do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (até 1974 Conselho Nacional de Pesquisas, cuja sigla CNPq se manteve), que é um órgão ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações para incentivo à pesquisa no Brasil.

Não é de se estranhar que o Escritório Nacional de Pesquisas Econômicas dos Estados Unidos mostrou que 8,3% dos cientistas brasileiros estão desenvolvendo pesquisas fora do país.

Em recente viagem pelo Reino Unido tive a oportunidade de encontrar e conversar com jovens bolsistas brasileiros que, em sua maioria (para não dizer todos com os quais me deparei) não desejam voltar. No entanto, quando eu era bolsista do Conselho Britânico na década de 1964, o desejo de voltar ao Brasil era quase unânime entre os jovens especialistas.

Alguns dos jovens que agora estão ‘lá fora’ apresentam o quadro clinico da doença de Nabuco, mas mesmo assim estão lutando para lá permanecer apesar do sofrimento: saudade e desejo de voltar…

Assim, o desafio atual é manter o maior número desses profissionais em nosso território, após a conclusão dos seus estudos.

 Por outro lado, entre nós é flagrante a falta de conexão entre as universidades e o mercado de trabalho ou indústrias/empresas em geral. Lembro ser a Universidade local de pesquisa, enquanto as empresas devem ser responsáveis pelo incremento tecnológico. Definitivamente não é o que acontece no momento, em nosso país.

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Meraldo Zisman Médico, psicoterapeuta. É um dos primeiros neonatologistas brasileiros. Consultante Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha). Vive no Recife (PE). Imortal, pela Academia Recifense de Letras, da Cadeira de número 20, cujo patrono é o escritor Álvaro Ferraz.

1 thought on “A doença de Joaquim Nabuco. Por Meraldo Zisman

  1. Ótimo artigo, Dr. Meraldo.

    Não é de se estranhar que o Escritório Nacional de Pesquisas Econômicas dos Estados Unidos mostrou que 8,3% dos cientistas brasileiros estão desenvolvendo pesquisas fora do país.

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