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Consciência tem cor? Por Meraldo Zisman

CONSCIÊNCIA TEM COR?

POR MERALDO ZISMAN
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Amossegando e recordando o dia da Consciência Negra no Brasil (20 de novembro), conclui que o acontecimento mais importante foi a devolução da negritude ao nosso escritor maior, Machado de Assis (1839-1908).

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A triste constatação é de que a miséria e o preconceito têm até tonalidade entre nós. Daí a minha pergunta: desde quando consciência tem cor? Será ela branca, amarela ou vermelha?

 

Os brasileiros orgulham-se de seu histórico em matéria de relações raciais. O mais correto será dizer que o brasileiro de classe alta costuma orgulhar-se de sua tolerância racial, enquanto o de classe baixa não tem consciência dela, limita-se a praticá-la.

O racista antinegro (ou antissemita) que ocasionalmente se encontra, enquadra-se quase sempre em dois tipos: ou é o membro da “sociedade” desprovido de consciência que, no decorrer de suas viagens, conheceu na “sociedade” pessoas que têm preconceito contra negros ou judeus, perdendo assim sua criptotolerância (indisfarçável) nativa ou é imigrante europeu, que veio para o Brasil; tendo sofrido discriminação desde o seu país de origem. Digo isto passeando pelos escritos da poetisa Elizabeth Bishop (1911-1979).

Em tempo, permitam-me recordar algo que aprendi como médico e simples cidadão, filho de imigrante judeu nascido/criado/educado no Brasil.

Os seres humanos apresentam diversas tonalidades de pele e de pelos de acordo com o seu conteúdo de melanina, pigmento acastanhado que tinge a pele negra, quando em grande concentração. A melanina não passa de corpúsculos intracelulares que se armazenam na pele de alguns seres vivos, existindo dois subtipos do pigmento melânico que são produzidos no interior dos melanossomos (células produtoras desse pigmento cutâneo).

São eles: eumelanina e a feomelanina. A eumelanina destaca-se por apresentar uma cor que varia de marrom a negro. A feomelanina, por sua vez, possui coloração vermelha ou amarela. Assim os nomes: pardo, preto, branco, amarelo, vermelho/indígena que aparecem em várias das nossas fichas identificadoras são denominações sociais, nada a ver com a biologia real…

…Essa camuflagem intelectual não é mais do que um modelo cínico (mas politicamente correto), denominado de “Escravidão Branda dos Afrodescendentes” além de não passar de mais uma falácia histórica do Brasil…

Aproveitando o tema antirracista que hoje invade a Mídia Brasileira graças a determinados movimentos literários, acadêmicos, políticos ou assemelhados, além da defesa de Ideologias antiquadas, diria que tal tema serve bem para insuflar o preconceito racial da minoria branca contra a maioria populacional brasileira, parda ou negra.

Seguramente essa falsificação de preconceito racial é a mais importante das úlceras nacionais a serem combatidas. Ainda acrescento que essa autodesignação de uma pessoa ao se diagnosticar de branco, preto, pardo, índio é uma maneira de camuflar preconceito racista.

Explico porquê: essas exigências do conhecimento que o “Eu” tem sobre “si mesmo” possui dois aspectos distintos: por um lado, um aspecto descritivo, chamado autoimagem, e por outro, um aspecto valorativo, a autoestima. Essa autodenominação de branco ou miscigenado é por si só um preconceito.  E não é nada confortável a classificação dos indivíduos por categoria, classe, raça ou qualidade humana, baseada apenas na pigmentação da pele.

Ser negro no Brasil é muito difícil e a maioria dos sem emprego são negros, se acreditarmos na estatística atual.

Essa camuflagem intelectual não é mais do que um modelo cínico (mas politicamente correto), denominado de “Escravidão Branda dos Afrodescendentes” além de não passar de mais uma falácia histórica do Brasil. Seria como se qualquer forma de escravidão tivesse gradações e fosse capaz de ser adjetivada.  Dizer que servidão, sujeição, cativeiro são ações dolorosamente trágicas tanto para o senhor quanto para o afro-oriundo de pele mais ou menos negra é no mínimo um cacófato nacional.

Fecho este artigo sobre Preconceito à Brasileira contando uma anedota vinda do humor judaico (aquele que faz graça com a própria desgraça para não ofender outras raças). Dizem ter acontecido lá pelas bandas novaiorquinas, vamos a ela:

O inverno naquela cidade é intenso, principalmente as ventanias nas esquinas das suas largas e garbosas avenidas numeradas. Sentado justo no meio fio de um desses cantos, um afro-descente, tiritando de frio, procurava agasalhar-se com folhas de jornais velhos. E como grande parte dos novaiorquinos são de origem judaica, existia imprensa escrita no idioma ídiche, que se escreve com caracteres hebraicas. Um passante, vendo a tentativa de abrigo com papel de jornal em grafia hebraica perguntou:

— Você é judeu?

Responde o afro-americano tiritando, sentado no meio-fio, coberto parcialmente de neve: “Só me faltava essa… não bastasse ser negro”.

O politicamente correto é a variante mais recente da falsidade humana.

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Meraldo Zisman Médico, psicoterapeuta. É um dos primeiros neonatologistas brasileiros. Consultante Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha). Vive no Recife (PE). Imortal, pela Academia Recifense de Letras, da Cadeira de número 20, cujo patrono é o escritor Álvaro Ferraz.

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