“Viver muito passou a ser um crime. Vá se queixar ao Bispo” Por Meraldo Zisman
“VIVER MUITO PASSOU A SER UM CRIME. VÁ SE QUEIXAR AO BISPO”
MERALDO ZISMAN
…Resultado: nem ao bispo adianta mais se queixar. O fato agora é que o idoso não tem mais direito à portabilidade ou a pertencer a um plano de saúde individual…
A história vem de longe. Nasceu do direito português antigo. Naqueles tempos idos e vividos os bispos eram autoridades com poder de fazer Justiça em brigas de vizinhos, desentendimentos entre marido e mulher, pendengas entre irmãos. E dizem até que para provar a virgindade da noiva, o futuro marido era instruído a fazer um test drive para… para conhecer melhor. Examinar antes de comprar é sempre mais cauteloso, no caso, casar com a noiva.
Daí a expressão “vá se queixar ao bispo”.
Embora pareça um desaforo (e hoje é), o debochado dito “vá reclamar com o bispo” pode ter origem no Livro dos Juízes do Direito Medieval Visigótico e nas regras do Tribunal do Santo Ofício (Inquisição). Queixar-se ao bispo era/estava na Lei. Em outras palavras: vá procurar quem pode resolver o problema. Quem estiver interessado pode obter maiores detalhes no site https://vladimira ras.blog/2011/03/21/va-queixar-se-ao-bispo/
Venho escrevendo sobre os abusos dos preços e dos engodos dos nossos Planos de Saúde, cujas mensalidades cada vez aumentam mais, principalmente para os mais idosos, mas meus escritos sobre Planos de Saúde vão terminar neste artigo. Prometo, é o último. Não adiantou de nada e o bispo não manda mais nada e os evangélicos só se preocupam com campanhas eleitorais.
Na verdade, tenho é muita pena dos velhos desamparados. Aliás, dizem por aí que existe muito mais esperança no choro de uma criança do que num sorriso na boca de um idoso.
Foi no que deu a privatização da medicina no nosso País, deixando ao magro SUS apenas o atendimento às medicações para tratar as doenças mais raras, embora a Constituição da nossa República explicite que a Saúde é um direito inalienável do povo.
Não adiantam mutirões ou meias medidas. O problema do nosso sistema de saúde é político (com P maiúsculo ou minúsculo) e vem de muito longe, muito antes da época em que o Bispo D. Pero Fernando Sardinha foi lanchado pelos tupiniquins. O que sei é que ele foi infeliz na sua missão. Indispôs-se com muitos, teve atritos com os padres, não era simpatizado pelos “donos da terra”. Terminou tristemente transformado em “petisco” para gente voraz e faminta de “carne branca”.
… vou parando por aqui pois ao bispo não vou mais me queixar, mormente que agora o Brasil é um país laico e o pobre do primeiro bispo foi logo sendo comido…
Sem ser bacharel em Direito, mas simples Esculápio de Província, alerto para o fato de que não mais existe qualquer poder outorgado a essas autoridades eclesiásticas. Esse poder só serve para os historiadores, o tal direito era medieval e a Inquisição teve início em Portugal em 23 de maio de 1536 e durou mais de trezentos anos.
Resultado: nem ao bispo adianta mais se queixar. O fato agora é que o idoso não tem mais direito à portabilidade ou a pertencer a um plano de saúde individual.
Eu já havia notado através das conversas matutinas com a minha turma de idosos, ao fazermos caminhadas pela Praça da Jaqueira (Recife), a maioria deles andarilhos octogenários, que o assunto das nossas conversas passou da taxa de colesterol sanguíneo para dois outros que nada têm a ver com a Saúde: portabilidade e preço das mensalidades dos Planos de Saúde e seus aumentos estratosféricos, muito além da inflação e estupidamente acima da taxa de juro Selic.
Como sou médico e dediquei-me à vida acadêmica, lembrei-me do fato de que sou do tempo em que médico não pagava a médico. Da vez que tive que marcar um gerontólogo (ex-aluno meu), a secretária foi logo dizendo que o doutor não aceita nenhum plano e que sim, como médico, eu pagaria a metade do valor da consulta, mas não teria direito a recibo (para burlar o imposto de renda ou sei lá porquê?)
Ouvi também dizer por aí que o maior número de reclamações sobre prestação de serviços é contra os planos de Saúde, segundo dados do tal Procon.
Portanto, vou parando por aqui pois ao bispo não vou mais me queixar, mormente que agora o Brasil é um país laico e o pobre do primeiro bispo foi logo sendo comido…
Direito tenho de bradar da minha inocência, desamparo, e solidão — não sou culpado de viver muito tempo. Em tempo (aproveitando a deixa), portabilidade hoje significa: portável, deslocamento, telefonia, crédito, salário, financeiro, financeira e etc., direitos praticamente vedados ao idoso.
Viver muito é crime?
Aviso: detesto as vítimas quando respeitam seus carrascos. Ponto final.
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“Resultado: nem ao bispo adianta mais se queixar. O fato agora é que o idoso não tem mais direito à portabilidade ou a pertencer a um plano de saúde individual”.
Muito obrigada, Dr. Meraldo, por alertar veementemente para isso. O senhor dá-nos voz.