Biblia

Quem escreveu a Bíblia? Por Meraldo Zisman

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Um dos mais importantes críticos literários da América do Norte, Harold Bloom, defende a tese de que a primeira versão da Bíblia hebraica teria sido escrita por uma mulher, dez séculos antes de Cristo. Em seu livro The Book of J. diz que, como a maior parte das mulheres era analfabeta no Oriente Médio (e assim permanece no presente), acreditam os estudiosos que muitos trechos da Bíblia foram escritos por escribas homens, quando, na verdade, afirma Bloom,  que os cinco primeiros livros bíblicos tiveram mulheres como escribas.

Mas, deixando as teologias de lado, voltemos à Mulher que escreveu A Bíblia: a feiura é fundamental, ao menos para o entendimento desta história. É feia esta que vos fala. Muito feia. Feia contida ou feia furiosa, feia envergonhada, ou feia assumida, feia modesta ou feia orgulhosa, feia triste ou feia alegre, feia frustrada ou feia satisfeita — feia, sempre feia. Desde pequena eu suspeitava disso, de que era feia (…)

Vistes? Esses são os homens a quem encarreguei da tarefa (escrever a História Gloriosa do Povo judeu). Há dez anos estão nisso: falam, falam, escrevem, — e não sai nada. Sabem tudo que é preciso saber, mas brigam tanto entre si que não conseguem chegar a um acordo sobre o texto final. Por isso te chamei. Em primeiro lugar, nada tens a ver com eles: és mulher inteligente, disposta. Depois, escreves muito melhor que cada um deles ou todos juntos. Tua carta é uma prova disto (…) e foi assim que a mulher de Salomão conhecida por “a Feia” passou a relatora do livro santificado que iria contar a história do povo eleito por séculos.

                                              A profecia:

A feia, exausta de tanto querelar com os escribas enviados para atender ao pedido do rei Salomão e com a inveja da perda da primazia da redação da Bíblia. Exausta e em crise, a escriba feia-culta-esposa-mulher-apaixonada em crise de ciúmes do Rei Salmão, principalmente quando era visitado pela Rainha de Sabá, escreveu em transe:(…) O que faziam os profetas senão detectar no presente aquilo que estava por vir. Era seguir uma sequência numérica, onde três teria que vir inevitavelmente após quatro, era como escrever um texto que, movido por sua lógica interna, se fosse auto escrevendo… (…) animado por uma força misteriosa, eu escrevia (…) então escrevi: “O Senhor se irritou contra Salomão, porque este desviou o Deus de Israel que lhe ordenara ao nascer seguir deuses estranhos (…) em atenção ao teu pai Davi, não arrancarei o reino de Israel de ti, só o arrancarei da mão de teu filho” (…) Reboão, filho de Salomão, dividiu o reino em dois (…). Falei sobre o desespero de profetas como eu, que tentavam alertar governantes contra o perigo da impiedade. Antecipei a ocupação da região por grandes potências (…) A vida regalada dos sacerdotes do Templo (…) O nascimento de uma nova religião (…) Esse Filho teria Mãe que seria o símbolo da bondade, uma figura feminina mediante a qual os Fiéis poderiam apelar ao Pai e ao Filho. A Trindade se completaria com um Espírito Santo, simbolizado por uma árvore (…) Em vez de um Templo central surgiriam milhares de templos, grandes e pequenos, ricos ou pobres (…) este livro teria um nome grego — A Bíblia.

O papo do povo eleito acabaria e a nova religião procuraria arranjar adeptos entre os povos. Diante da amplitude da nova religião, a glória de Salomão seria eclipsada. E após escrever aqueles escritos… procuraria uma caverna para escondê-los (…) O que restaria de mim, estaria no texto, no salino resíduo das lágrimas que eu ali havia derramado.

E, então, diriam — como era sábia aquela mulher!

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Meraldo Zisman Médico, psicoterapeuta. É um dos primeiros neonatologistas brasileiros. Consultante Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha). Vive no Recife (PE). Imortal, pela Academia Recifense de Letras, da Cadeira de número 20, cujo patrono é o escritor Álvaro Ferraz.

 

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