Fim de feira. Por Edmilson Siqueira

FIM DE FEIRA

EDMILSON SIQUEIRA

…A perspicácia foi substituída por esperteza rasteira onde vale a lei de Gerson. E onde se pressupunha liderança, há uma inacreditável briga de comadres, com os podres de todos os lados brotando mais que erva daninha…

Tem muito bolsonarista por aí achando que o capitão, nessa crise partidária, está agindo com inteligência, perspicácia e liderança. Quem pensa assim está enfiando a cabeça na areia pra não enxergar o óbvio. Onde deveria haver inteligência, grassa a ignorância política. A perspicácia foi substituída por esperteza rasteira onde vale a lei de Gerson. E onde se pressupunha liderança, há uma inacreditável briga de comadres, com os podres de todos os lados brotando mais que erva daninha.

Num momento em que o país está na iminência de perder sua mais elevada bandeira que é o combate à corrupção e à violência, pois o STF, cuja maioria parece querer a bandidagem toda de volta às ruas, está prestes a liberar geral, o governo se atola numa cizânia político-partidária cujo objetivo é prosaico: a posse do butim do fundo partidário, que chega a algumas centenas de milhões de reais e que acendeu o espírito real daqueles que se elegeram sob o discurso da probidade, da decência e da honestidade, fazendo contraponto com o PT, onde essas qualidades causavam – e causam – urticária em seus membros. Um partido honesto recusaria esses fundos, mas…

Está cada vez mais difícil, para qualquer país do mundo, atrair investidores se a segurança jurídica não está de acordo com as normas internacionais de combate à corrupção e à violência em geral.

O abandono da luta contra a corrupção pelo presidente foi exposto, comme il faut, numa rede social. Um post defendendo a Lava Jato e alertando contra a mais que suspeita manobra do STF, foi publicado e depois retirado do ar. Só esse fato – a retirada do post da rede – já era triste, pois apoiar a operação que mais prendeu políticos corruptos na história da humanidade era e é obrigação de qualquer político honesto.

E se o político se elegeu berrando essa apoio a todo momento e trouxe o maior símbolo da operação para ser ministro da Segurança, então nem se fale. Só que é pior: um dos zeros à esquerda (ótimo achado de Carlos Brickmann) do presidente veio a público dizer que ele é que tinha escrito o post e publicou sem autorização do “paipai…”. Ou seja: a “despublicação” compromete o filho por escrever em nome do pai sem autorização do próprio e compromete o pai por, ao exigir a retirada do post, revelar que está cantando e andando para a Lava Jato e o combate à corrupção.
Na próxima semana o STF vai continuar o julgamento que pode acabar com a prisão em segunda instância e que vai estraçalhar com o Brasil de vez.

Está cada vez mais difícil, para qualquer país do mundo, atrair investidores se a segurança jurídica não está de acordo com as normas internacionais de combate à corrupção e à violência em geral. A decisão do STF, se liberar geral mesmo, vai fazer os sisudos europeus do OCDE franzirem as sobrancelhas à intenção do Brasil de ser membro da entidade. E vai fazer os auxiliares de Trump pensarem duas vezes antes de indicar um país que demora 15 anos para prender um notório corrupto, ou um assassino desde que possam pagar caros advogados, pois sua sentença tem de ser mantida em quatro instâncias. E a lentidão da Justiça brasileira é famosa. Aliás, acaba de prescrever um processo que levaria o bispo Edir Macedo e um comparsa às grades. Ele é rico e poderoso. Tudo isso compromete mais do que a segurança pública, o que já é ruim: compromete também o desenvolvimento econômico, essencial para livrar o país do buraco em que os governos petistas o meteram.

Resta a Bolsonaro e seus áulicos, agora cada vez mais messiânicos e parecidos com a turma do “Lula Livre”, torcer para que os juízes honestos que restam no STF formem maioria, rejeitem o fim da prisão em segunda instância e o ministro da Economia, Paulo Guedes, consiga levar adiante seus projetos sem tantas distorções. Pois se a economia desandar, o governo não terá mais onde se segurar, a oposição vai deitar e rolar e os aliados atuais – que mal dão para aprovar um projeto comum – vão debandar feito ratos num naufrágio.

E aí teremos uma enxurrada de candidatos já expondo as feridas do governo, tratando de criar seus próprios feudos e iniciando de forma mais acirrada – e com séculos de antecedência – a disputa pela sucessão do capitão na presidência da República.

Claro que ainda há tempo – cada vez menos, mas há – de uma correção da rota ou da criação de um rumo palpável, mas as aparências, nesses dez meses de governo, infelizmente, não enganam. Falta inteligência ao presidente e a seus filhos, falta perspicácia ao núcleo duro do poder e a liderança que todos imaginavam um capitão do Exército possuir, se esvaiu pelo ralo da fofoca, da mentira tornada pública e da falta de experiência política.

Eu não sou de rezar, mas estou quase abrindo uma exceção nesse momento.

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Edmilson Siqueira é jornalista

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