Cada quadrado no seu quadrado. Coluna Carlos Brickmann

CADA QUADRADO NO SEU QUADRADO

COLUNA CARLOS BRICKMANN

EDIÇÃO DOS JORNAIS DE QUARTA-FEIRA, 14 DE AGOSTO DE 2019

Um economista que sabe das coisas diz que se você volta à Argentina vinte dias depois de ter saído, vê que tudo mudou. Se volta depois de vinte anos, vê que nada mudou.

Faz uns noventa anos que a Argentina, com raros intervalos, é peronista. Houve até luta armada e sangrenta  entre peronistas de extrema direita e de extrema esquerda. Inimigos, inconciliáveis, mas todos peronistas.

É difícil de entender? Por isso mesmo o presidente Bolsonaro se coloca em má posição ao envolver-se na política interna de los hermanos. Põe em risco, por exemplo, o acordo entre o Mercosul e a União Europeia, importantíssimo para nosso futuro. Ameaça as boas relações com nosso terceiro maior parceiro comercial, que nos rende uns 4 bilhões de dólares ao ano de superavit. Esquece que a Argentina é o país que mais importa carros brasileiros. Não se diga que que lutar contra a esquerda é mais importante do que manter boas relações comerciais e de amizade com nosso vizinho. A China é uma ditadura comunista, que mantém fortes laços com um partido que faz oposição ferrenha a Bolsonaro, o PCdoB, mas com a China ninguém mexe. Será a Argentina mais esquerdista que a China? Não: essa história de fronteiras ideológicas é para boi dormir. Os argentinos são como são. E não querem nem aceitam conselhos.

Cartão amarelo

Se na eleição argentina se repetir o resultado da prévia, Macri estará derrotado no primeiro turno, e Alberto Fernandez, o poste escolhido por Cristina Kirchner (sua  candidata a vice) será o próximo presidente. Se deixar a raiva de lado, Bolsonaro verá claramente o motivo da fraqueza de Macri: ele era a esperança de reverter o caos econômico do kirchnerismo. E não atendeu as expectativas. Seu liberalismo econômico foi para o brejo na primeira oportunidade: como a inflação não cedia, congelou os preços. E, como de costume, não deu certo. Ruim por ruim, escolheram o passado.

Manda pra nós

As incessantes declarações de Bolsonaro sobre qualquer tema que se apresente são levadas a sério no mundo desenvolvido. Já teve problemas com Noruega e Alemanha; e continua falando. A Alemanha cortou 150 milhões de dólares da ajuda à Amazônia como protesto pelo aumento da derrubada da floresta, e Bolsonaro disse que os alemães deixam de comprar  a Amazônia em prestações e que não precisamos desse dinheiro. Mas é um dinheiro que faz falta, e que vem a fundo perdido: é dado, não emprestado.

Retrato do Brasil

Os cálculos são da Anefac, Associação Nacional de Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade, instituição que há meio século se dedica a fazê-los. De março de 2013 até julho de 2019, considerando-se todas as mudanças na taxa básica Selic, os juros reais baixaram 17,24%, caindo de 7,25% ao ano para 6% ao ano. Já os juros cobrados de pessoas físicas subiram 29,05%, subindo de já espantosos 87,97% ao ano para 117,02%. As pessoas jurídicas também foram esfoladas, mas menos: no seu caso, os juros subiram 11,68%, passando de 43,58% para 48,67% ao ano.

Onde se gasta, e como

Vale a pena acompanhar a newsletter Don’t LAI to Me – um trocadilho bilingue que mistura o “não minta para mim” à LAI, Lei de Acesso à Informação. Nela estão os gastos dos diversos presidentes da República em seus cartões corporativos. Dá trabalho acompanhar, mas vale a pena. É grátis: basta entrar no Google em Don’t LAI to me e fazer a ficha. É uma fonte de informações inestimável – e tudo com dados oficiais.

Dinheiro não falta

O presidente do Tribunal de Justiça da Bahia decidiu, no dia 9 último, conceder aposentadoria a um técnico de nível médio, com R$ 30.956,00 mensais. O salário do técnico de nível médio é de R$ 5.767,91 – o restante é penduricalho, tipo vantagem pessoal eficiência, vantagem pessoal AFI símbolo, função gratificada, etc. Como há o teto constitucional para quem recebe vencimentos do Tesouro, o técnico receberá R$ 30.471,10. Mas dá para viver. Reforma da Previdência só vale para nós, não para eles.

Chegando ao destino

A Reforma da Previdência deve estar pronta para votação na segunda quinzena de outubro. Com isso, o Governo ganha fôlego para investir e, se trabalhar direito, iniciar a recuperação da economia. Já está no forno a medida provisória da liberdade econômica, que reduz a interferência do Governo nas atividades privadas. A reforma tributária, a proposta pelo deputado Baleia Rossi (que se baseou em estudos do economista Bernard Appy), talvez combinada com a de Paulo Guedes, deve rapidamente ser submetida ao Congresso. Pois, como Macri está demonstrando na Argentina, se a economia não andar o Governo perde as eleições.

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2 thoughts on “Cada quadrado no seu quadrado. Coluna Carlos Brickmann

  1. ‘Retrato do Brasil’
    É inútil tentar nadar contra esse tsunami de informações distorcidas que a imprensa ajuda a disseminar (e é bem paga para fazê-lo), mas vá lá: a Selic, unanimidade demonizada pela esquerda e pela direita, não é e nem nunca foi o problema. Quem defende a Selic superbaixa, como é hoje, defende, sem saber, uma solução que não existe. Se baixar taxa básica de juros a níveis negativos, como é hoje, ajudasse a economia a andar pra frente, o mundo estaria surfando num crescimento sem precedentes. Nunca o mundo inteiro tivera, na média, juros básicos tão baixos quanto os praticados na última década. E, no entanto, vejam em que ponto estamos no quesito crescimento mundial. A única coisa para a qual a Selic baixa realmente serve é sacrificar o dinheirinho miúdo do assalariado que comete o crime de querer poupar o que sobra, quando sobra. Ninguém ganha mais com a Selic baixa do que aquele que faz preço, porque quem vende conta com a inutilidade forçada da prática de poupar que não mais compensa. Por outro lado, ninguém perde mais do que o infeliz que toma preço, ou seja, o consumidor assalariado que decide ir ao supermercado mais frequentemente e gastar mais, pois os preços tendem a aumentar enquanto a poupança derrete – a inflação maior que a correção do dinheiro investido torna a compra obrigatória. E depois reclamam que o Brasil é um dos países que menos poupam… Em tempo: alguém aí acha que a inflação é essa que nos contam?
    Num ambiente assim, em que tudo que industriais e comerciantes querem é que as pessoas tirem o dinheiro de suas poupanças, para torná-lo consumo obrigatório, é natural que os bancos aumentem seus spreads com menos depósito à vista sob sua guarda. Imaginar que a queda da Selic diminui o spread bancário é tão inteligente quando achar que ajuda a economia a crescer. São duas mentiras, bem alimentadas, é óbvio, por quem quer que você tire seu dinheiro do bolso, mas não vai segurar você quando a sua poupança estiver zerada e você precisar dela pra ajeitar a vida. O problema é que o mesmo Estado que te força a gastar em vez de poupar não estará ao seu lado depois, para te garantir saúde, moradia, alimentação, bem-estar e mais tudo do que você necessitará. Estado que nada garante, como o nosso, comete um crime quando pratica juro negativo. As pessoas comuns precisam de seu dinheirinho suado para enfrentar a vida e as muitas incertezas que a idade, o desamparo e o próprio país lhes trazem. Os bancos, que se encontram entre essas tantas agruras possíveis que temos de enfrentar, apenas caminham por conta própria e fazem seus spreads como bem entendem. Abaixar o juro deles, não, isso ninguém pretende, ninguém faz, ninguém tenta. Ninguém é capitão o suficiente pra isso… Mais fácil é enfiar a mão no bolso do sujeito comum.
    (PS. Se a Câmara não reagir, e dependermos apenas dos caprichos de sua majestade Paulo Guedes, preparem-se para o retorno triunfal de mais uma versão da cpmf – desta vez, ainda maior…)

  2. Carlinhos: para de olhar para dentro e olha um pouco para fora. O Brasil tem quase 60% do território coberto por florestas, e toda essa área preservada, de 4,9 milhões de quilômetros quadrados, é maior que a soma dos 28 países da União Europeia. O engenheiro agrônomo Alfredo José Barreto Luiz, pós-doutor em Sensoriamento Remoto pelo INPE, escreveu que o discurso sobre desmatamento brasileiro “é falacioso e ofusca outros grandes e mais urgentes problemas ambientais”, como falta de coleta e tratamento de esgoto.
    Mais: veja a falácia e os problemas reais! Alfredo José Barreto Luiz explica que 48,6% da população têm coleta de esgoto e apenas 40% são tratados. Isso, sim, afeta o ambiente.
    Mais números: Dados do INPE mostram que 94% do Estado do Amazonas está preservado. No Amapá, também na Amazônia, chega a 99,6%.
    Hipocrisia em números: Medita a palpitar sobre Amazônia, a Noruega tem mata em só 32% do território, sendo que metade foi plantada para exploração industrial.
    Alemanha é vergonha em preservação: Restam à Alemanha menos de um terço do seu território ainda não desmatados. Na França, um pouco mais. Que vergonha.
    Além de tudo são mal educados: As embaixadas da Alemanha, da França e da Noruega nem sequer agradeceram a generosa oferta do governo brasileiro para ajudar no reflorestamento dos seus territórios, que eles devastaram.
    Claudio Humberto foi cirúrgico hoje. Presta atenção amigo. O mundo mudou! Te amo.

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