A hora do vendaval. Coluna Carlos Brickmann
A HORA DO VENDAVAL
COLUNA CARLOS BRICKMANN
EDIÇÃO DOS JORNAIS DE QUARTA-FEIRA, 15 DE MAIO DE 2019
É uma das maiores investigações financeiras de nossa História: por ordem do juiz Flávio Nicolau, do Tribunal de Justiça do Rio, foi quebrado o sigilo bancário e fiscal do senador Flávio Bolsonaro, o filho 01 do presidente da República, de sua esposa e filho, da empresa em que é sócio da esposa, de 88 ex-funcionários, de seu ex-assessor Fabrício Queiroz, esposa e filhas. O sigilo fiscal está quebrado de 2008 a 2018 e o bancário de 2007 a 2018.
Flávio Bolsonaro diz que a quebra dos sigilos servirá para explicar um vazamento ilegal já ocorrido; e que o objetivo é atacar seu pai. A explicação oficial é investigar a movimentação de R$ 1,2 milhão por Fabrício Queiroz, em um ano (em três anos, R$ 7 milhões). Há um depósito de Queiroz na conta de Michele, esposa de Bolsonaro; e Queiroz disse que pedia parte do salário do pessoal do gabinete para contratar, sem registro, mais assessores. Há 48 depósitos de R$ 2 mil cada na conta de Flávio Bolsonaro. A suspeita é de que houvesse entrega ao chefe de parte do salário de cada funcionário.
É investigação para durar muito tempo: pesquisar contas bancárias de mais de dez anos, de 95 pessoas, é exaustivo. Não deve haver surpresas enquanto as investigações evoluem. Mas haver investigações contribui para a piora do clima político, e talvez leve parlamentares de hábitos flexíveis a exigir mais do Governo em troca de seu apoio e de seus votos. Em bom português, haverá quem exija tratamento mais generoso por seu apoio.
Coincidência
A investigação sobre Flávio Bolsonaro acontece na ocasião em que está próxima a votação da reforma da Previdência. Acontece também, ao mesmo tempo, a delação premiada de Henrique Constantino, um dos donos da empresa aérea Gol, em que cita propinas que teria pago a Rodrigo Maia, hoje presidente da Câmara e principal articulador da votação da reforma. No Governo anterior, faltavam poucos dias para a votação quando explodiu a delação premiada de Joesley Batista, que gravou conversa com o presidente Michel Temer (com isso, a reforma da Previdência ficou para o Governo seguinte).
Mas, afinal de contas, coincidência é coincidência. Acontece, não?
Temer livre
Como de hábito, haverá choro e ranger de dentes. Mas a libertação de Michel Temer nos tribunais superiores era inevitável. Isso não quer dizer que não tenha cometido os atos de que o acusam, ou que não possa, mais à frente, vir a ser considerado culpado (e, aí sim, receba uma sentença de prisão). Mas estava preso sem julgamento. Prisão preventiva não é antecipação de pena e pode ser aplicada em circunstâncias específicas: destruição de provas, por exemplo, perturbação da ordem pública, ameaça de fuga… bom, se Temer não destruiu provas como presidente, iria fazê-lo agora? Nunca tentou buscar asilo ou sair do país. Portanto, que espere o julgamento em liberdade. Se condenado, a coisa muda. Enquanto não for condenado, fica livre.
O cerco a Perillo
O ex-governador de Goiás, Marconi Perillo, do PSDB, derrotado amplamente nas eleições, vê apertar-se o cerco do Ministério Público sobre ele. Na semana passada, o MP moveu-lhe mais uma ação civil pública por improbidade administrativa (servidores eram contratados sem concurso público). Há 17 ações do MP contra Perillo, desde junho de 2018. Incluem de contratação de funcionário fantasma até irregularidades na aprovação de leis. Perillo viu seu candidato a governador ser batido por Ronaldo Caiado, não conseguiu se eleger senador, embora houvesse duas vagas, e na eleição presidencial foi o coordenador da candidatura tucana de Geraldo Alckmin.
O caminho de Moro
O presidente Jair Bolsonaro criou um problema para seu superministro da Justiça, Sérgio Moro: garantiu que ele será indicado para o Supremo tão logo surja uma vaga, e deixou entrever que houve um compromisso seu com Moro para indicá-lo. Moro rapidamente disse que não houve acordo algum e que, quando houver alguma vaga no STF, Bolsonaro poderá ou não indicá-lo e ele poderá ou não aceitar um eventual convite.
Mas abriu-se campo para que políticos como Gleisi Hoffmann, presidente nacional do PT, voltassem ao tema de que Moro condenou Lula a pedido de Bolsonaro. A tese é falsa: primeiro, porque Moro condenou Lula pela primeira vez quando ninguém imaginava que a candidatura Bolsonaro cresceria como cresceu: segundo, porque todas as sentenças de Moro foram confirmadas pela segunda instância, no Tribunal Regional Federal de Porto Alegre, e os recursos de Lula foram seguidamente recusados nos tribunais superiores.
O trabalho de Moro
Quando Moro assumiu, Bolsonaro sabia que ele era indemissível. Mas o trabalho que desenvolve ainda não apareceu para o público. Até seu pacote anticorrupção está sendo analisado junto com um anterior, de Alexandre de Moraes, e a tendência é unificá-los. Moro não é unanimidade em Brasília.
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Que Moro seja um narcisista irretocável, uma espécie de tipo weberiano ideal do conceito, todo mundo sabe. Que ambicione – desde que a notoriedade pública sorriu para ele – levar ao STF sua vaidade intelectual e moral, idem. Que tenha, a essa indicação ao STF, condicionado a ida ao Ministério da Justiça, pode até ser verdade, mas não creio que isso tenha ocorrido. Mais fácil é acreditar que o capitão o quis na campanha mais para envernizá-la, para expô-lo como selo de garantia, do que para qualquer coisa além desse uso instrumental. E, assim, o pacote MJ + STF, desde logo oferecido (que mais se poderia oferecer a Moro?), deve ter parecido aos olhos do reconhecido juiz de Primeira Instância um atrativo suficiente para tirá-lo daquilo que até então lhe servira de palco. Coisas da vaidade humana. E com a vantagem de ter sido ofertada pelo lado de lá, não imposta pelo de cá. Resta saber se foi um bom negócio – ou antes, para quem. Para o capitão, certamente foi. Elegeu-se, afinal. Quanto a Moro, claro que é bom para o país ter um sujeito como ele no cargo que exerce hoje (compare com os patetas da Educação, p.ex., e veja o quanto ele abrilhanta a máquina!), mas não sei se é tão boa assim, para ele, a troca que se revela cada vez menos recompensadora a quem tem se especializado em tomar bolas nas costas. Foram tantas as derrotas, algumas humilhantes (chegou a ser chamado, por Maia, de ‘funcionário’ do capitão…), que doravante ficará mais fácil saber se sua vaidade é ou não irremovível: abandonará o barco conforme as derrotas se somarem, ou aguentará o tranco e o esculacho na esperança de virar mais um Super-Toga? No seu lugar, eu, pessoalmente, jamais trocaria a notoriedade consolidada pela Lava-Jato por essa que supostamente viria no governo de um bronco como esse aí se encontra. De que parecia muito melhor em Curitiba, afinal, alguém duvida? É ver o resto do jogo, e conferir o tamanho da goleada que ainda vai levar, para saber qual o real tamanho de sua vontade de subir na vida de pop-star jurídico. Provavelmente, já fez pelo governo o que dele o governo esperava. Que será que o governo ainda fará por ele – ou contra…? Pouco a pouco, Moro aprende que Guedes é o cara. O resto é tudo igual, e ele já é igual ao resto.