Roberto Avallone. Exclamação! Coluna Mário Marinho
Roberto Avallone. Exclamação!
COLUNA MÁRIO MARINHO
Avallone era criativo.
Ousado.
Abusado.
Bem informado.
Independente.
Inédito.
Diferente.
Tudo o que um bom jornalista precisa ser.
Aliava tudo isso a uma boa dose de vaidade e uma certa insegurança que, muitas vezes, o levava a tomar atitudes até arrogantes. É a velha lição do futebol: a melhor defesa é o ataque.
Na madrugada dessa segunda-feira, 25 de fevereiro, Avallone publicou sua última coluna no portal UOL. Comentou os jogos do fim de semana e sugeriu que os times contratassem treinadores especiais para os atacantes, assim como tem para os goleiros.
Um ataque cardíaco fulminante levou Roberto Francisco Avallone.
Conheci o Roberto Avallone em 1968, quando cheguei de Belo Horizonte para trabalhar no Jornal da Tarde.
Poucos dias depois, estava num restaurante ao lado da redação (na época, o a redação do JT/Estadão ficava à rua Major Quedinho, 28, no centro da cidade), quando o Avallone chegou, colocou as mãos nos meus ombros e disse em alto e bom som para os outros companheiros que estavam à mesa:
– Eis aqui o meu futuro chefe.
Foi irônico, mordaz e cabe aqui a explicação.
Naqueles primeiros anos de Jornal da Tarde (foi às ruas pela primeira vez no dia 4 de janeiro de 1966) havia muitos mineiros na equipe e a grande maioria ocupando cargos importantes. O redator chefe, por exemplo, era o mineiro Murilo Felisberto.
Avallone quis dizer, portanto, que eu estava fadado a ser chefe. Minha principal qualidade: ser mineiro.
Levei a ironia numa boa. Mas, anos mais tarde, a profecia se realizou e eu me tornei chefe do Avallone.
Naqueles primeiros anos de São Paulo fiz forte amizade com dois outros repórteres do JT: Avallone e Luiz Carlos Ramos.
Luiz Carlos, mais tarde, foi para o Estadão e minha amizade com o Avallone se consolidou.
Avallone era meio genioso no trato, mas de caráter imaculado.
Nossa amizade cresceu cada vez mais, envolvendo até mesmo as famílias. Maria Clara, esposa do Avallone, tornou-se uma boa amiga da Vera Marinho, minha caríssima metade.
Caio Avallone e a minha filha Verênia frequentaram, quando crianças, a Escolinha de Esportes da Hebraica, grata novidade naquele começo dos anos 1980. Anos mais tarde, eles se encontraram na Faculdade e trilharam o mesmo curso de Comunicação.
Avallone foi um excelente repórter e depois passou a redator, sem jamais perder o seu faro e seu espírito de repórter.
Nessa época, eu também havia pulado da reportagem para o trabalho de copydesk.
Alguns anos depois, eu assumi o comando da equipe de esportes do JT. Eu era o editor e o Avallone era subeditor, acumulando a criação da pauta e a chefia de reportagem. Profecia, portanto, realizada.
Alberto Helena Jr. era o colunista do esporte. A coluna dele, “Bola de Papel” era publicada diariamente.
Às vésperas da Copa do Mundo de 1982, Alberto Helena deixou o JT e foi para a revista Placar.
Escalei o Bob Avallone para substituir o Helena e aí nasceu a prestigiosa coluna dele: “Jogo Aberto”. Avallone continuou na pauta.
Modéstia às favas, fazíamos o melhor jornalismo esportivo do Brasil.
Prova disso foram os prêmios Esso que nossa equipe conquistou (o Prêmio Esso era o Oscar do jornalismo), além de diversos Troféus Ford Aceesp.
Foram incontáveis os furos dados por essa equipe.
O maior deles, sem dúvida, foi do Avallone.
Poucos meses após da Copa de 1982, um apavorado Roberto Avallone chega à redação do JT à minha procura. Sua presença na redação à noite já me deixou meio intrigado, já que o trabalho dele era durante o dia. E mais intrigado ainda seu jeito de falar quase sussurrando me chamando a um canto da redação.
– Marinho, tenho um furo.
– Sim…
– Ainda não posso revelar a fonte, Você vai ter que confiar em mim. Certo?
– Certo, vamos lá.
– O Palmeiras contratou o Batista.
– O Batista, do Grêmio???
– Esse mesmo, mas ele só vai se apresentar daqui três dias.
– Mas podemos publicar amanhã, não é?
– Isso mesmo.
– Então, vá para a máquina (era tempo ainda da máquina de escrever, não havia computadores).
O redator chefe era o Fernando Mitre. Dei a ele a notícia do furo.
No dia seguinte, nossa manchete foi: “Batista no Palmeiras”.
O Jornal da Tarde era muito respeitado pelo seu jornalismo sério, inovador e pelos furos constantes.
Foi um auê no meio esportivo. O Palmeiras negou. O Grêmio não quis falar sobre o assunto e Batista não era encontrado.
No dia seguinte, apesar da incredulidade de outros veículos da imprensa e de muitos até colocarem em dúvida a notícia, o Jornal da Tarde voltou a reafirmar a negociação. E mais: anunciamos que no dia seguinte Batista chegaria a São Paulo.
Não deu outra: Batista chegou. O grande furo do Jornal da Tarde/Roberto Avallone foi confirmado.
Avallone também trabalhou no rádio e na televisão. Aliás, trabalhamos.
Antes de ocuparmos cargos de chefia, tivemos passagem pelo jornal Última Hora e pela revista Bannas, uma publicação voltada para a área econômica.
No rádio, trabalhamos juntos na rádio Eldorado.
Depois, Avallone foi para a TV Gazeta e, aí invertemos os papéis: no Jornal da Tarde, eu era o chefe dele; na Gazeta ele era o meu chefe.
Na televisão, a criatividade do jornalista Roberto Avallone encontrou campo fértil.
Seu jeito apaixonado, incisivo, às vezes até agressivo conquistou o público.
Ali, ele verbalizou a pontuação quando, com gestos dramáticos e a voz carregada ele enfatizava suas afirmações:
“O Palmeiras foi brilhante. Exclamação!”
“Quem vestirá a camisa dez do Verdão. Interrogação!”
O Palmeiras foi uma grande paixão. Não a maior de todas: essa imensa paixão era dedicada à família. Aos filhos principalmente.
Assisti, certa vez, discussão feroz, fora do ar, com Nelsinho Batista, então técnico do Palmeiras. Tudo porque o Palmeiras havia perdido um jogo e o filho, Caio Avallone, pouco mais que um garoto, foi às lágrimas.
Tentei acalmar o Avallone, mas ele, enfurecido, não permitia:
– Ele fez o meu filho sofrer, chorar. Eu não perdoo isso.
Era o lado apaixonado de Roberto Avallone.
Havia também o lado vaidoso.
Como ele não gostava de falar a idade com ninguém eu dizia que era mais jovem que ele. Não era verdade, mas proporcionava boas discussões. Eu falseava os números e dizia pra ele:
– Você nasceu em fevereiro, eu nasci em novembro. Portanto, se você faz aniversário antes de mim, você é o mais velho. Exclamação!
No dia 22 de fevereiro, há três dias, portanto, foi aniversário dele. Completou 72 anos certamente guardando seu precioso segredo. O Facebook registrou o niver e me enviou a mensagem: cumprimente o seu amigo.
Deixei a seguinte mensagem:
– Avallone, Você continua na minha frente.
____________________________
–
Mário Marinho – É jornalista. Especializado em jornalismo esportivo, foi durante muitos anos Editor de Esportes do Jornal da Tarde. Entre outros locais, Marinho trabalhou também no Estadão, em revistas da Editora Abril, nas rádios e TVs Gazeta e Record, na TV Bandeirantes, na TV Cultura, além de participação em inúmeros livros e revistas do setor esportivo.
(DUAS VEZES POR SEMANA E SEMPRE QUE TIVER MAIS NOVIDADE OU COISA BOA DE COMENTAR)
Parabéns Mário Marinho,bela história com seu Parceiro ROBERTO AVALLONE.DEUS CONFORT A FAMÍLIA.
VOCÊ FAZ PARTE DA HISTÓRIA,ME FAZ BEM BEBER NESSA FONTE!!!
Parabéns Marinho. Texto brilhante sobre um cara brilhante.
Descanse em paz, Avallone
Abraços
Muito bem, Marinho. Belo texto, com amizade e emoção.