Conversas de 1/2 minuto. Por José Paulo Cavalcanti Filho(11)
Conversas da terrinha, ligadas à literatura, em livro que estou escrevendo (título da coluna).
BOCAGE, poeta. Saía do Nicola do Rossio (ao lado do Cerco da Bandeira), botequim onde se encontravam políticos e literatos. Para ele, seria “o último café do Rossio”. Ali Humberto Delgado, o general sem medo, anunciou que demitiria Salazar. Amigos se fingem de bandidos e, simulando um assalto, perguntam
– Quem és tu?, de onde vens?, para onde vais?
– Sou o poeta Bocage
Venho do café Nicola
E irei pro outro mundo
Se disparar a pistola.
EÇA DE QUEIROZ, romancista. A Editora Ernesto Chardron (d’O Porto) precisava de seus dados, para constar nos livros. E Ramalho Ortigão, que com ele escreveu As Farpas,
– Manda um pequeno esboço biográfico, amigo.
Eça responde, numa carta de 10/11/1878,
– Eu não tenho história, sou como a República de Andorra.
MANUEL BANDEIRA, poeta. Fila para autógrafos, em Lisboa. Chega um rapaz e põe o livro em lançamento, que acabou de comprar, na sua frente. Sem saber de quem se tratava, para a dedicatória, nosso poeta pergunta
– Por favor, que nome ponho?
– Manuel Bandeira, ora pois.
ONÉSIMO ALMEIDA, da Universidade de Brown (Estados Unidos). O professor Aníbal Pinto de Castro, catedrático da Universidade de Coimbra, pergunta num debate se leu um livro qualquer.
– Não.
– Pois é, Onésimo. Você só lê obras de alto gabarito intelectual!
– Ó Aníbal, não diga isso, você sabe que já li toda sua obra!
OPHÉLIA QUEIROZ, implausível amor de Fernando Pessoa. Ao passar pela calçada da Estrela, diz ele
– O teu amor por mim é tão grande como aquela árvore.
– Mas ali não está árvore nenhuma.
– Por isso mesmo.
Não podia mesmo dar certo.
SANTA-RITA PINTOR, poeta futurista. Teatro da República (hoje São Luiz), 4/4/1917. Vestido de fato-macaco (macacão de operário) e em pé, numa frise, Santa-Rita destrata o poeta saudosista (autor de Dizeres do Povo), ligado à Renascença Portuguesa, segundo ele
– Correia António de Oliveira.
E o outro,
– Perdão, é António Correia de Oliveira.
– Isso é para o senhor, que está desse lado, e lê de lá para cá.
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