Para manter o juro baixo. Por Alexandre Schwartsman
Para manter o juro baixo
Por Alexandre Schwartsman
… o BC indica que os riscos de a inflação atingir menos do que o projetado por seus modelos aumentaram comparados à sua percepção nos últimos meses. Reforça-se, assim, a visão de estabilidade da Selic por mais tempo do que se julgava possível.
Publicado originalmente na Folha de S.Paulo, Coluna do autor, edição de 19 de dezembro de 2018
Em março deste ano o Banco Central reduziu a taxa Selic para 6,5% ao ano, seu menor valor na história. De lá para cá foram seis reuniões ao longo de nove meses, o segundo maior período de estabilidade da taxa de juros. Nada mal, considerando que, há cerca de dois anos e meio, não faltava quem afirmasse que o impedimento da presidente tinha como objetivo manter os juros altos, tese, aliás, que a própria ainda propagava em setembro do ano passado.
Nada mal também na comparação com nossa história turbulenta do ponto de vista da política monetária. Nas experiências anteriores de redução da Selic, a manutenção da taxa de juros no piso de cada ciclo durou, em média, 3 reuniões. Mais importante, porém, são as perspectivas positivas sobre o comportamento dos juros no ano que vem, bem como as condições para que isto se materialize.
De acordo com as projeções do BC, caso a taxa Selic permaneça em 6,5% ao ano indefinidamente, a inflação atingiria 4% em 2019, abaixo da meta estabelecida para o ano (4,25%) e 4% também em 2020, precisamente na meta. No cenário, contudo, em que ela subisse gradualmente para 8% ao ano (entre setembro de 2019 e fevereiro de 2020), a inflação ficaria em 3,9% no próximo ano e 3,7% no seguinte, bem abaixo da meta.
Tais números, por si só, sugerem não haver necessidade de elevação da taxa de juros ao longo de 2019 (e talvez por mais tempo). Já no que se refere ao “balanço de riscos” ao redor de suas projeções, o BC ainda manifesta preocupações com o rumo das reformas no campo fiscal, mas em menor grau do que no passado recente; por outro lado, admite que desemprego e capacidade ociosa elevados possam levar a trajetórias da inflação ainda menores do que as apontadas por suas projeções.
Em língua de gente, o BC indica que os riscos de a inflação atingir menos do que o projetado por seus modelos aumentaram comparados à sua percepção nos últimos meses. Reforça-se, assim, a visão de estabilidade da Selic por mais tempo do que se julgava possível. Em consequência, as taxas de juros para períodos mais longos também cederam, fenômeno que colabora com a retomada da economia.
Como as decisões sobre taxa de juros são baseadas sempre nas perspectivas sobre o futuro da economia, é preciso saber que fenômenos podem reforçar, ou ameaçar, esta possibilidade positiva.
Há muita coisa para ocorrer entre o final de 2018 e 2019 e o próprio exemplo deste ano quase encerrado mostra que eventos virtualmente impossíveis de prever (como a greve dos caminhoneiros) podem ter impactos significativos sobre a inflação. Todavia, parece claro que, dentre os fatores mais previsíveis, nenhum supera em importância a reforma previdenciária, chave para o estabelecimento um regime fiscal capaz de reverter a elevação da dívida do governo relativamente ao PIB.
É difícil dizer quanto da reforma “está nos preços”, seja do mercado, seja das próprias previsões do BC. De qualquer forma, sem avanços nesta frente não há como evitar uma crise fiscal séria num horizonte de dois a quatro anos, aqui entendida como a impossibilidade de manter o teto de gastos e, portanto, as esperanças de estabilização da dívida.
Caso a nova administração consiga a proeza, poderá colher os frutos quase imediatamente, na forma de baixas taxas de juros, abrindo, inclusive, a possibilidade de nova redução da Selic; se falhar, porém, o castigo virá a cavalo.
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