Passa boi, passa boiada. Coluna Carlos Brickmann
EDIÇÃO DOS JORNAIS DE DOMINGO, 25 DE JULHO DE 2021
O truque ainda funciona, mas é antigo: os americanos o chamam de “smoke gets in your eyes”, fumaça nos olhos. Escolha um dia de calor, agasalhe-se pesadamente, entre numa loja de móveis e peça um prato feito. Tome o ônibus, queixe-se do cheiro e prometa importar perfume francês, caríssimo, para resolver o problema. Todo mundo vai comentar as loucuras. Enquanto isso, a roubalheira vai comendo solta e passando despercebida. Como dizia o ex-ministro, é a hora de aproveitar e ir passando a boiada.
Criam-se discussões sobre voto impresso, sobre Bolsonaro usar máscara, e enquanto isso se recria o Ministério do Trabalho só para dar um emprego a Onyx Lorenzoni (que será que ele sabe que nós não sabemos?) Em 2018, o Ministério do Trabalho custou R$ 90 bilhões. Aquele general que passou um ano no Rio comandando a segurança e falando grosso agora fala grosso contra eleições realizadas de acordo com a lei, e com o mesmo efeito: zero.
Mas os 15 ministérios prometidos por Bolsonaro já são 28; e seis mil militares se instalaram no Governo, ganhando os soldos mais o salário do cargo. Dilmo (ops, Bolsonaro) soma mais cinco com menos quatro e diz que dá nove. Só se fala nisso, enquanto Ciro Nogueira vira ministro e a senhora sua mãe vai ocupar, como suplente, a cadeira dele no Senado. A mãe e o filho da mãe já se garantiram. Ciro é a prova de que a verdade sempre vence: ganhou o cargo mesmo tendo dito, em 2017, que Bolsonaro era fascista.
Jade comenta
Jade, a linda gata que se notabilizou pela precisão de sua análise política, está confusa: o vice-presidente Hamilton Mourão disse que haverá eleições, com ou sem voto impresso, porque não somos uma república das bananas. Jade gostaria de saber por que, então, de repente, surgiram tantos gorilas.
A chave do segredo
Quando o mundo foi criado, foram criadas também a Ética e a Política, mas como departamentos diferentes. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa, e ambas não se misturam. Pensando só em política, o Centrão é coerente: sempre quer cargos e vantagens e não tem culpa de que os governos mudem. Ditadura não é bom: não que se roube menos, mas a partilha é feita de acordo com a vontade dos ditadores. Na ditadura, teve construtora virando empreiteira, teve empreiteira para a qual não pagaram, e como reclamar?
Na briga, o perdedor é sempre o mesmo: o cidadão. O Centrão, pelo menos, não se interessa em acabar com a democracia; e tem a fé inabalável de que, aqui, sempre haverá como negociar com os eleitos. Sabe como é ruim botar fanáticos ideológicos, armados ou não, negociando contratos com multinacionais profissionalíssimas e muito bem assessoradas.
Falta equilíbrio
Bolsonaro está sendo malhado por dizer, em ocasiões diferentes, as frases: “Centrão é o que há de pior no Brasil”, e agora, ao chamar Ciro Nogueira para o Governo, “eu sou Centrão”.
É injusto atacá-lo por dizer a verdade.
Acredite se quiser
Não faltavam nem dois anos para o general Luiz Eduardo Ramos, então comandante militar do Sudeste, se reformar. Mas não resistiu ao chamado de Bolsonaro e assumiu a Secretaria Geral do Governo. Dali foi para a Casa Civil. Seu balanço é bom: coordenou a distribuição de recursos e manteve sua imagem intacta. Mas ocupava um lugar que o Centrão queria. Foi substituído sem saber que estava com a cabeça a prêmio: como disse, sentiu-se atropelado por um trem. Como consolo, fica no palácio ao lado de Bolsonaro, a quem dedica algo incomum na política: um olhar de carinho a quem, imagina, é seu amigo há tantas décadas.
Mortos de ofício
Alguns políticos de oposição, quando foram se vacinar, descobriram que no cadastro no SUS constavam como mortos. Entre eles, a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann; Manuela d’Ávila, PCdoB, candidata a vice de Fernando Haddad; Guilherme Boulos, um dos dirigentes do PSOL. No registro de Boulos, nome de pai e mãe tinham sido substituídos por ofensas.
Imprensa livre x JBS
A JBS pediu que o advogado Frederick Wassef abrisse inquérito contra Paulo Tadeu (Editora Matrix), a empresa Paper Excellence e o jornalista Cláudio Tognolli por formação de quadrilha. Motivo: Tognolli publicou quatro livros sobre a JBS. A Delegacia Antissequestro acatou todos os pedidos e por três vezes pediu à Justiça busca e apreensão mais prisão preventiva de Tognolli e Tadeu. Os três pedidos foram negados e nesta semana o TJ engavetou o caso, seguindo parecer do Ministério Público de que as acusações eram “delirantes”. O pano de fundo é a disputa pela Eldorado Celulose. A arbitragem deu vitória à Paper Excellence pela posse da Eldorado. A JBS não acatou a arbitragem e ainda não devolveu a Eldorado.
O caso dos livros foi usado para tentar desacreditar a arbitragem.