A “farsa” do desemprego. Por Alexandre Schwartsman

A “farsa” do desemprego

Por Alexandre Schwartsman

… Economia, apesar das aparências em contrário, não é para aspirantes. Como regra, antes de falar do assunto, não custa nada dar uma passada no posto Ipiranga.

Publicado originalmente na Folha de S.Paulo,
   Coluna do autor,  edição de 14 de novembro de 2018

Na semana passada o presidente eleito se manifestou sobre as estatísticas de desemprego no país afirmando: “vou querer que a metodologia para dar o número de desempregados seja alterada no Brasil, porque isso daí é uma farsa. Quem, por exemplo, recebe Bolsa Família é tido como empregado. Quem não procura emprego há mais de um ano é tido como empregado. Quem recebe seguro-desemprego é tido como empregado.”

Errou em todos os exemplos mencionados, refletindo ignorância comum sobre a matéria. Vale a pena entender os conceitos, virtudes e limitações desta estatística para não cometer os mesmos equívocos.

Segundo o IBGE a população brasileira em setembro deste ano era aproximadamente 209 milhões de pessoas. Nem todos, porém, estão aptos a trabalhar. O IBGE define a População em Idade Ativa, PIA, como aqueles com mais de 14 anos, em torno de 170 milhões de pessoas.

Obviamente, apenas parte dos maiores de 14 anos estão no mercado de trabalho. Alguns, por exemplo, estudam (ainda bem!), outros já se aposentaram e há quem decida não tomar parte no mercado por uma série de motivos, alguns dos quais trataremos à frente. Os que participam, seja trabalhando, seja buscando por emprego, são definidos como “força de trabalho”, ou População Economicamente Ativa (PEA), e montavam a 105 milhões de pessoas em setembro.

Desses 92,6 milhões estavam ocupados e 12,5 milhões desempregados. Assim a taxa de desemprego atingiu 11,9% (12,5÷105).

Esta é a definição internacional da taxa de desemprego, adotada por todos os países com boas estatísticas na área. No caso, se a pessoa recebe o Bolsa-Família (sem estar empregada), ou o seguro-desemprego, ela obviamente não conta como empregada. Caso esteja procurando trabalho contará como desempregada (e participante da PEA); caso contrário não aparecerá nesta estatística de desemprego.

Ocorre que a taxa de desemprego descrita acima não esgota o conjunto de estatísticas sobre o mercado de trabalho. O IBGE também discrimina dentre os ocupados aqueles que trabalham menos do que desejam e calcula a taxa de desempregados (12,5 milhões) e subocupados (6,9 milhões) com relação à PEA: 18,4% (19,4÷105).

Há, por outro lado, dentre as pessoas que estão fora da PEA, as que gostariam de trabalhar, mas não estão buscando emprego, a chamada “força de trabalho potencial”, 8 milhões de pessoas.

A estatística mais ampla do IBGE a respeito (a taxa de subutilização da força de trabalho) junta os desempregados, os subocupados e a força de trabalho potencial, um conjunto de pouco mais de 27 milhões de pessoas como proporção da “PEA ampliada”, isto é, os 105 milhões da PEA mais os 8 milhões da força de trabalho potencial (123 milhões), revelando uma taxa de subutilização na casa de 24%.

A coexistência de várias medidas de desemprego não é uma jabuticaba. Nos EUA, por exemplo, o Bureau of Labor Statistics publica a cada mês nada menos do que seis alternativas: a taxa denominada U3, calculada de forma similar à nossa, é a mais disseminada, 3,7% no mês passado; a taxa mais ampla, U6, se encontrava em 7,4%, o dobro da oficial, por incorporar também os que gostariam de trabalhar mais e os participantes da força de trabalho potencial.

Economia, apesar das aparências em contrário, não é para aspirantes. Como regra, antes de falar do assunto, não custa nada dar uma passada no posto Ipiranga.

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* ALEXANDRE SCHWARTSMAN DOUTOR EM ECONOMIA PELA UNIVERSIDADE DA CALIFÓRNIA, BERKELEY, E EX-DIRETOR DE ASSUNTOS INTERNACIONAIS DO BANCO CENTRAL DO BRASIL É PROFESSOR DO INSPER E SÓCIO-DIRETOR DA SCHWARTSMAN & ASSOCIADOS

@alexschwartsman
aschwartsman@gmail.com

 

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