Mateus - a brasa - a sardinha e o pirão

Mateus, a brasa, a sardinha e o pirão. Por José Horta Manzano

Mateus - a brasa - a sardinha e o pirão

Não dá pra escapar: todo ser humano acredita ser o centro do universo. Por mais que regras de boa educação ensinem que não é bem assim, não tem jeito: é da natureza humana.

Para reiterar essa convicção, toda língua tem uma coleção de expressões e frases feitas. Ao dizer que fulano “Puxou a brasa pra sua sardinha”, estamos confirmando que fulano – que se vê como centro do mundo – tomou posse do que ele acredita que lhe é de pleno direito.

Se alguém, depois de haver narrado um fato qualquer, soltar um comentário do tipo “Mateus, primeiro os teus”, estará lendo a mesma partitura. O mesmo vale para aquele que disser “Se a farinha é pouca, meu pirão primeiro”. São variações em torno do mesmo tema. “Quem parte, reparte e não fica com a melhor parte, ou é bobo, ou não tem arte” é outro exemplar da coleção. Há mais.

No passado, já devo ter escrito sobre o mapa-múndi chinês. Mas vale a pena voltar ao assunto, que continua interessante.

Quem já viu um planisfério de estilo chinês há de ter se surpreendido. Não falo de um mapa fabricado na China para ser vendido por aqui; falo de um confeccionado na China para uso interno.

…Como os demais habitantes do planeta, o chinês também se enxerga no centro do mundo. Pensando bem, eles estão certos. Como certos estão todos os outros. Por que é que eles desenhariam seu país na extremidade do globo?…

Um bom exemplo é o que aparece na ilustração logo mais acima. É o pano de fundo que se vê nos comunicados do Ministério de Assuntos Exteriores da China.

À primeira vista, mesmo um distraído repara: o mapa não está configurado do jeito que costumamos ver. O Oceano Atlântico, que a gente costuma ver no centro do planisfério, tem um triste fim: é partido em dois e relegado a cada uma das extremidades. Mais um pouquinho e transborda – aberração de dar calafrios a qualquer terraplanista. Os oceanos Índico e Pacífico estão mais para o meio e, centrado mesmo, o que aparece é o território chinês. Não é por nada que, em chinês, o nome do país se traduz por “Estado central” ou “Império do Meio”.

Como os demais habitantes do planeta, o chinês também se enxerga no centro do mundo. Pensando bem, eles estão certos. Como certos estão todos os outros. Por que é que eles desenhariam seu país na extremidade do globo? Na minha já longa existência, tirando uma única exceção, nunca ouvi falar de um dirigente que menosprezasse o próprio povo a ponto de mandá-lo pra escanteio (não só no mapa).

A exceção, o distinto leitor já adivinhou, é Jair Bolsonaro, um impressionante entreguista. A pandemia de covid revelou um dirigente dotado de evidente psicopatia, carregado de antipatia pelo povo brasileiro e desprovido de empatia pelos que contavam com ele. Só não entregou o Brasil como colônia para os EUA porque não deu tempo. O governo de Trump acabou antes. E não há de faltar muito para o do capitão acabar também.

الله أكبر  (Deus é grande, em árabe)

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JOSÉ HORTA MANZANO – Escritor, analista e cronista. Mantém o blog Brasil de Longe. Analisa as coisas de nosso país em diversos ângulos,  dependendo da inspiração do momento; pode tratar de política, línguas, história, música, geografia, atualidade e notícias do dia a dia. Colabora no caderno Opinião, do Correio Braziliense. Vive na Suíça, e há 45 anos mora no continente europeu. A comparação entre os fatos de lá e os daqui é uma de suas especialidades.

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1 thought on “Mateus, a brasa, a sardinha e o pirão. Por José Horta Manzano

  1. Meu caro. O planisfério na sala do capitão é de outro tipo. No centro, há Deus – que, afinal, diz o elemento, está acima de tudo! Mas atrás de Deus (trata-se de um planisfério 3D, pois a Terra é plana ma non troppo) encontra-se uma foto do capitão, que, no entanto, bastante maior que a imagem de Deus, repõe as coisas nos seus devidos lugares. E como o capitão se encontra de bocarra aberta, vê-se que está a engolir Deus, tal como a baleia engoliu Jonas, Gepetto e o Pinocchio. O Brasil, figura pequenininha, quase invisível, já foi, de fato, engolido, e faz tempo. Deve ter parado no intestino encrencado do capitão. É o lugar que ele nos reservou. É verdade que, com um bom purgante, estaremos enfim livres, mas isso só vem lá para o fim de 2021… Até lá, estaremos sumidos do Mapa-Múndi.

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