Os crimes e os criminosos. Por Edmilson Siqueira
Antes que a pandemia tomasse conta do Brasil, o governo Bolsonaro já tinha carradas de motivos para ser apeado do poder via impeachment ou bloqueio médico – um simples teste psicotécnico provaria tranquilamente a falta de faculdade mental do dirigente máximo da nação. Ele estava destruindo florestas, apoiando a invasão de terras indígenas, interferindo na Polícia Federal, apoiando golpistas de extrema direita, ignorando solenemente vários preceitos constitucionais.
Os motivos pelos quais o impeachment não ocorreu anteriormente são os mesmos pelos quais eles estão sendo ignorados agora. Antes, Rodrigo Maia, o presidente da Câmara que tinha o poder de iniciar o processo, preferiu que seus interesses fossem prioritários na sua agenda particular. Apesar de estar em constante conflito com o Planalto, preferiu tratar de sua sucessão, agradando a direita que queria preservar o presidente para proveito próprio e a esquerda que queria mantê-lo no poder sangrando para enfrentar um fraco concorrente em 2022. Maia não conseguiu fazer seu sucessor e, tendo seu candidato perdido a eleição para a presidência da Câmara, caminha, solenemente, para o ostracismo, correndo o risco de ser ignorado pelo eleitor e ficar a ver navios em 2023. Pode pagar o preço da covardia, da omissão e de priorizar interesses próprios em detrimento dos interesses do país.
Depois que o candidato bolsonarista, Arthur Lira, se sentou na cadeira de presidente da Câmara, o impeachment se tornou mais distante ainda, embora os números de pedidos estivessem crescendo na mesma proporção dos crimes cometidos por Bolsonaro e seus asseclas. Aos crimes anteriores começaram a se somar, a partir do início de 2020, os crimes contra a saúde pública por causa da pandemia da covid 19.
A partir da constatação de que o país poderia se constituir em terreno fértil para o novo coronavírus, dadas as nossas condições de ignorância geral (entre outras), e que a generalização da pandemia por aqui iria complicar muito mais a já complicada economia que patinava em projetos não cumpridos, o governo Bolsonaro não só se tornou um criminoso em série como preparou o terreno para se constituir no maior genocida que o Brasil já enfrentou.
Os crimes em série que tiveram por objetivo boicotar o combate científico à pandemia causaram o genocídio.
Eles começaram pela recusa em seguir as orientações médicas e aceitar processos milagrosos que curariam a doença ainda nas suas primeiras manifestações. Continuaram pela total negação de distanciamento social e de quarentena, métodos clássicos de combate a esse tipo de doença que estancam a economia, mas diminui o tempo de volta para a devida recuperação.
Intensa campanha pelo tal de “tratamento precoce” e ordens para a fabricação de remédios não indicados para a cura do mal foram duas das mais comprovadamente assassinas ações que Bolsonaro capitaneou. Paralelamente a esses atos desumanos, que causaram muitas mortes, o presidente levava sua ignorância sem máscara a manifestações públicas, a conversas com apoiadores e à farta distribuição de fake news nas redes sociais que desorientavam e matavam também os incautos que consideram essa excrescência em forma dd ser humano um mito a ser reverenciado.
Diante de tantos crimes, os pedidos de impeachment começaram a se multiplicar. Todos tinham mais de um motivo para que o genocida presidente fosse imediatamente afastado do poder, fato que, se tomado ainda nas primeiras manifestações criminosas no início da pandemia, evitaria, com certeza, algumas centenas de milhares de mortes de brasileiros.
Mas todos os pedidos empacavam na obstinação de Arthur Lira em não colocar em votação a vontade de muitos deputados, entidades e mesmo cidadãos brasileiros. A obstinação tinha alguns motivos.
O primeiro deles é que Bolsonaro havia fechado, pouco antes do início da pandemia e contrariando seus discursos de campanha e evidenciando a fraude que é seu governo, um amplo acordo com o chamado Centrão, grupo de deputados majoritário na Câmara e no Senado que se vende ao poder desde sempre. Cargos em ministérios e verbas legais ou ilegais são as especialidades desse grupo que vem tomando de assalto o Brasil desde o governo Sarney (ele próprio um de seus mais notórios representantes) e que, com certeza, foi criado durante a ditadura para dar sustentação legislativa aos milicos no poder.
Outro motivo de Arthur Lira não iniciar o processo de impeachment é certa esquerda majoritária da Câmara que prefere enfrentar Bolsonaro tentando a reeleição ano que vem do que um candidato que tenha um mínimo de sensatez. Trata-se do PT que quer voltar ao poder com Lula. O partido faz um descarado jogo de cena em suas críticas ao governo Bolsonaro, mas prefere vê-lo sangrando que impedido de continuar governando. Todas as pesquisas atuais indicam que Lula vence fácil um Bolsonaro cada vez mais reduzido em suas forças e prefere que ele continue a governar e a matar brasileiros que apoiar um forte pedido de impeachment.
Lira, que sabe que um futuro governo petista manterá a mamata do Centrão, como ocorreu nos 14 anos em que esteve no poder, também faz o jogo petista, agradando tanto um lado como o outro, numa típica definição do que é o Centrão, cujo lema é famosa frase anarquista com o sentido invertido: “Há governo? Somos a favor!”
Assim, movido por interesses inconfessáveis, mas totalmente visíveis, o homem que detém o poder e de estancar a sangria real do povo brasileiro age como se nada estivesse acontecendo, e ainda tem a cara de pau de tentar oferecer ao país um projeto de semipresidencialismo que, além de não resolver nada, mantém o atual status genocida do governo Bolsonaro.
A conclusão a que se chega diante desse quadro é que o Centrão, mesmo com tantos crimes, jamais tomará uma decisão que afete suas condições na divisão do Tesouro, que impeça que eles continuem roubando o erário e que coloque uma barreira nas suas pretensões de enriquecimento.
O Centrão é um câncer instalado no Congresso Nacional que, com um genocida no poder, encontrou terreno fértil para perpetrar seus crimes e se manter no poder às custas do sacrifício de grande parte do povo brasileiro.
Arthur Lira, seu mais notório líder, é tão assassino quanto o governo Bolsonaro. Ambos são cúmplices na atual matança do povo brasileiro.
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Edmilson Siqueira– é jornalista
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eu não sei qual foi a última vez que votei em deputado, estadual ou federal. Não achei um que me representasse, vocês, colunistas devem escrever para aprendermos. Se não aprendermos será sempre isso. Não votei em bolsonaro, no lula e na dilma. E ainda paguei multa