E a gente faz um país. Por Carlos Brickmann ( Especial – Eleições – Diálogo)
E a gente faz um país
Carlos Brickmann
[ …Marina, que qual cometa aparece de quatro em quatro anos dizendo ser a favor do bem e contra o mal, incorporou o mais feroz espírito da floresta; bateu forte no general Mourão, vice de Bolsonaro, que andou se excedendo ao sugerir que a atual Constituição seja trocada por outra, em que o eleitor só tenha o direito de votar num referendo. Marina é suave, Mourão é bravo – mas é difícil reagir contra Marina sem parecer prepotente e grosseiro…]
… O ideal, creio, seria eleger uma Constituinte política, já que todas as escolhas são políticas. Para reduzir os riscos de desvirtuamento, poderiam candidatar-se pessoas que jamais tivessem sido eleitas…
Continuação do diálogo entre Carlos Brickmann e José Paulo Cavalcanti a respeito da formação de uma Constituinte. Veja o início DA CONVERSA AQUI
Caro Zé Paulo (um dos exemplos de intelectual em que me miro),
acho que cabe um debate, sim. E vou iniciá-lo de maneira estranha: dando razão ao outro debatedor. Você está certo. Só que deduziu, de algumas palavras, transcritas logo abaixo do título, todo um raciocínio que não foi feito.
Fiquemos num exemplo: uma Constituição elaborada por Renan, Eunício, Romero, Gleisi, Lindinho do Rio, Vanessa, Aécio, dificilmente seria boa – como não foi boa a Constituição Cidadã de 1988, feita embora por um Congresso mais bem visto que o atual. Mas também não poderia ser boa uma Constituição redigida por pessoas reconhecidamente honradas e de alta cultura, a menos que esses cidadãos ilustres soubessem o que é que os cidadãos comuns, que vivem no país, pagam os impostos que sustentam a máquina pública, aqui criam os filhos, esperam de suas instituições.
Como poderiam os cidadãos honrados e de alta sapiência escolher o regime político a ser consagrado na Constituição? Seríamos uma república ou monarquia, presidencialista ou parlamentarista? Manteríamos nossa Federação mambembe, em que os Estados dependem da União, faríamos uma Federação de verdade, ou talvez uma Confederação, em que os Estados influiriam fortemente na política federal? Se fôssemos uma monarquia, seria absolutista, com todo o poder concentrado na Coroa, ou voltaríamos ao Poder Moderador, como na época de D. Pedro 2º, ou seguiríamos o modelo britânico, em que o Trono simboliza a nação e não tem qualquer poder efetivo?
O ideal, creio, seria eleger uma Constituinte política, já que todas as escolhas são políticas. Para reduzir os riscos de desvirtuamento, poderiam candidatar-se pessoas que jamais tivessem sido eleitas e se comprometessem a nunca mais disputar um cargo eletivo.
Chegaria então a hora dos notáveis, que dariam à Constituição escolhida por representantes dos cidadãos uma forma precisa, correta, ajustada, elegante, reduzindo ao máximo a possibilidade de mal entendidos.
Mal comparando, é como uma negociação entre particulares, em que tudo é combinado e se chama um especialista para elaborar o contrato.
Aliás, podemos também chegar à conclusão, como cidadãos, que não queremos Constituição nenhuma. A Inglaterra não a tem até hoje e isso não a impediu, há relativamente pouco tempo, de montar um império onde o Sol jamais se punha.
O título desse texto está na letra de um belo sucesso de Marina Lima, Fullgás. Porque Constituição é isso: a gente constitui um país.
Um grande abraço do admirador
Carlos Brickmann