Aventura em Itaquera. Coluna Mário Marinho – Extra!
Aventura em Itaquera
COLUNA MÁRIO MARINHO
(EXTRA!)
Meu neto, o Vini, tem 15 anos. É corintiano há 15 anos. E quer ver jogos do Corinthians todo dia.
Já o levei em jogos no Pacaembu e também em Itaquera. Aliá, contando com a ajuda do jornalista e amigo Flávio Adauto, até realizei o sonho do Vini e ele entrou em campo com o time.
Foi muito legal ver a felicidade do menino.
Assim, rendi-me aos apelos sempre chantagísticos do neto e resolvi levá-lo ao Itaquera nesse feriado de quinta-feira.
Na verdade, aproveitei a chantagem dele para dar-me o presente de rever o América. Calculo que há uns 15 anos não assistia a um jogo do América, assim, no campo.
Então, há umas três semanas resolvemos comprar o ingresso.
Ele me pediu, quase ordenando: “Vô, compra na Norte”.
E o que vem a ser Norte? – É lá que fica a Gaviões. Respondeu-me cheio de alegria.
Isso, nem pensar. Descartei logo. No meio da Gaviões de jeito nenhum
– Vamos ficar naquele setor onde ficamos quando o Flávio Adauto nos convidou.
Ele verifica o preço do ingresso: R$ 250,00. Eu, ele e a Sofia. Total: R$ 750,00. Fora de questão!
Ah!, só para informar: Sofia ou Sofia Marinho é a mesmíssima Vera Marinho, minha caríssima metade, companheira de 50 anos de casório. Meio século. Caracas!
Pesquisamos e optamos pela Leste inferior (mais perto do campo, me explica ele). Preço: R$ 105,00, mas com 35% de desconto na compra pela internet. Fechamos o negócio. O jogo será às 18 horas.
Na quinta, às 16 horas saímos de casa. Moro no Jaguaré Zona Oeste, pertinho da USP. Em 25 minutos chegamos na estação de metrô da Barra Funda, onde já levo uma facada de R$ 30,00 para deixar o carro no estacionamento.
Pegamos o Metrô rumo à Itaquera.
São 35 minutos de viagem tranquila. Não vejo nem um torcedor do América.
Descemos em Itaquera e empreendemos uma caminhada de quase um quilômetro até o Portão N por onde vamos entrar. Lá, constato que realmente a Leste Inferior é bem perto do campo – mas, também pertinho da Gaviões.
Não conheço nenhum jogador do América, mas surpreendo-me com a postura firme, a entrega de seus jogadores e a ousadia de encarar o Timão cara-a-cara, de igual para igual. Nada de retranca. Fico feliz.
Termina o primeiro tempo 0 a 0. Para mim, que temia um desastre, um alivio.
Mas logo aos 5 minutos do segundo tempo, o Corinthians faz 1 a 0.
Temo pelo pior, já que o bando de loucos parece enfurecido nos seus gritos de incentivo ao time.
Para minha surpresa, o América parte para cima à procura do gol de empate e obriga o goleirão Walter, do Corinthians, a realizar algumas defesas muito difíceis.
Termina o jogo com a vitória, ao meu ver, injusta, do Timão.
Pergunto ao Vini.
– E aí, gostou?
– Gostei, achei legal.
– Você acha que o Corinthians jogou bem?
– Não, não acho.
– Então você não gostou.
– Do jogo eu não gostei. Mas gostei que a gente veio. Foi legal.
Assistir a um jogo de futebol nas modernas arenas de hoje, está muito longe das perigosas aventuras de antigamente. O Estádio é confortável, os banheiros são limpos. O acesso ao lugar que você comprou é garantido.
Ao entrarmos na Arena, um solícito funcionário veio nos informar onde eram nossos lugares e se ofereceu para nos levar até lá.
Em lá chegando, eis que nossos lugares estavam ocupados. O funcionário mostrou o ingresso às três pessoas que os ocupavam. Uma dessas pessoas sacou seu ingresso e constatou-se que eles estavam no lugar errado.
Levantaram-se, pediram desculpas e foram para os seus lugares. Simples assim. Inimaginável, anos atrás.
O grande problema é que o torcedor – o brasileiro de um modo geral – não sabe torcer assentado. Tem que ser de pé.
Ou você fica de pé ou não vê o jogo.
E é duro ficar em pé durante os 90 minutos de jogo, tendo ao seu lado confortável cadeira, inteiramente à sua disposição.
Reclamei com o Vini.
– Vô, tem que ficar em pé, tem que gritar, tem que torcer. Pra ficar sentado tem que ir para aquelas cadeira de R$ 250,00 lá do outro lado.
E, realmente, lá do outro lado as pessoas assistiam tranquila e confortavelmente ao jogo.
Terminado o jogo, nova caminhada até a estação Itaquera do Metrô.
– Mas agora é só descida, anima-me o Vini.
Tem razão. A arena fica num promontório e, se você chega a pé, tem que subir. Talvez seja até uma mensagem subliminar: o Corinthians está lá no alto.
À saída, simpática mensagem do Timão agradecendo aos corintianos e eu me aproveito para uma foto com a Sofia, a que se vê ao alto desta coluna.
Descendo em direção à estação, nos deparamos com barracas que vendem chamativos sanduíches de pernil e calabresa.
Não dá para resistir.
Nos acomodamos do jeito que foi possível e pedimos três, de pernil.
São sanduíches generosos, com cebola e vinagrete. Temperos na medida.
Aplacada nossa fome, nos dirigimos à estação.
São 21 horas. A estação já está vazia, com poucos torcedores.
Entramos no vagão com muitos lugares à disposição.
Eu estou cansado, a Sofia também. O Vini, não. Continua falando do jogo e já está pensando no próximo jogo.
– A gente vem, né vô?
– Pra ficar em pé, de jeito nenhum, respondo, não oferecendo a menor chance de contestação.
No banco ao nosso lado, duas moças bem bonitinhas, namoradas, fazem a viagem caladas. Uma delas está com o braço protetor sobre os ombros da outra. Protetor, e ao mesmo tempo ostentando a posse.
Pouco depois, notamos que uma delas, a protegida, chora discretamente.
Algumas estações à frente, elas descem. Dão-se as mãos e sem perdem na multidão.
Chegamos à Estação da Barra Funda, vou ao estacionamento e pego meu carro para os 25 ou 30 minutos finais de viagem até minha casa.
Chego por volta das 22 horas.
Imediatamente, troco o tênis por um chinelo confortável, visto um acolhedor pijama, preparo generosa dose de uísque e me preparo para sentar frente à televisão e descansar da aventura, quase uma batalha, assistindo a alguma relaxante série da Netflix.
Mas meu neto está em outra rotação e me convoca.
– Vô, vem ver. O Atlético Paranaense tá vencendo o Santos, 2 a 0. O Atlético Paranaense tá jogando muito, vô. O time não dá um chutão, só passes certos, bola de pé em pé…
Ainda bem que o jogo já estava no segundo tempo.
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Mario Marinho – É jornalista. Especializado em jornalismo esportivo, foi durante muitos anos Editor de Esportes do Jornal da Tarde. Entre outros locais, Marinho trabalhou também no Estadão, em revistas da Editora Abril, nas rádios e TVs Gazeta e Record, na TV Bandeirantes, na TV Cultura, além de participação em inúmeros livros e revistas do setor esportivo.
(DUAS VEZES POR SEMANA E SEMPRE QUE TIVER MAIS
NOVIDADE OU COISA BOA DE COMENTAR)
Amigo Marinho:
Bom-dia!!!
Muito legal sua história sobre a aventura de visita a Itaquera. Fui frequentador desse bairro, nos tempos da Central do Brasil. Moleque, eu viajava na locomotiva, ou máquina, como os funcionários a chamavam. Meu pai foi enfermeiro da “SUS” da época, que atendia os funcionários da ferrovia e, pela amizade com os funcionários, era sempre convidado a viajar na locomotiva. Por isso, tive a oportunidade de companhar a evolução tecnológica desse trator que puxava velhos vagões muito judiados pelos passageiros, que roubavam lâmpadas, quebravam os vidros, riscavam os bancos deixando nomes ou frases imbecis.
Na máquinas era legal. Primeiro, as de caldeira alimentada por troncos de lenha, depois veio o carvão e, um dia, fiquei surpreso com a ausência do foguista, homem que alimentava a caldeira com lenha ou carvão, substituído por um tanque de óleo diesel. Não demorou muito e veio a locomotiva moderna, a GE diesel-elétrica. Velhos tempos, velhas lembranças de minha meninice, beirando a adolescência.
Parabéns pelo presente ao seu neto. Hoje, me sinto frustrado por não ter sido companheiro, assim como você está sendo, de meus filhos e netos, hoje crescidos, um médico, um advogado, um jornalista, um professor, um musicista, uma prestes a se tornar fisioterapeuta e outra, nutricionista.
Prossiga como companheiro de seu neto, assim como o é de sua esposa e filha. Um pouco mais à frente vai receber com elevados juros desse santificado investimento na família.
Parabéns!!!
Secco