Foi Lula ou não foi? Por Josué Machado

FOI LULA OU NÃO FOI?

Por Josué Machado

…De volta a Luizinácio, parece claro que ele não escreveu o artigo, embora o tenha assinado e, portanto, assumido sua autoria…

Está circulando o texto de um bem escrito artigo de 15 robustos parágrafos publicado pelo jornal francês Le Monde, assinado por Luizinácio. Nele estão alinhadas as conquistas que o líder petista diz ter obtido nos dois governos que encabeçou e a promessa de resgate do país assim que for reeleito. Obviamente foi publicado em francês – versão do original em português.

Muita gente duvidou e duvida de que Luizinácio o tenha escrito por saber que ele não gosta de ler e, mesmo nos veementes discursos, costuma atropelar plurais e derrotar concordâncias sem piedade.

Tê-lo-ia escrito Luizinácio?, perguntaria Temer, envergonhado pelo pândego “o Brasil voltou (,) 20 anos em 2!”, com ou sem vírgula.

Ao que interessa: primeiro convém lembrar que políticos em evidência sempre têm alguém que dê forma escrita a suas intenções ou supostas intenções, e aos pensamentos, só os reveláveis.

Por exemplo, não foi Getúlio Vargas, formado em Direito, que escreveu a carta com que justificou o suicídio em 1954; o jornalista José Soares Maciel Filho a tinha escrito para o pedido de licença que o presidente pretendia obter; muito pressionado, Getúlio talvez a tenha alterado um pouco e a deixado como carta-testamento ao dar o tiro no coração. (Maciel Filho escrevia a maioria de seus discursos.)

Nem foi o presidente John Kennedy (1917-1963), que escreveu o marcante discurso de posse em 1961 com a frase de efeito “Não pergunte à América o que ela pode fazer por você. Pergunte o que você pode fazer pela América”. Foi Ted Sorensen (1928-2010), o talentoso amigo e assistente de toda a vida de Kennedy e autor da maioria de seus discursos. Pelo menos era quem os polia, alinhava e tornava mais contundentes. Quando perguntaram a Sorensen quem havia escrito a máxima estridente do primeiro discurso, ele respondeu,  evocando a frase luminosa e brincando: “Não perguntem, não perguntem!”

E, no entanto, Kennedy era doutor em Relações Internacionais e bom escriba. Mesmo assim, a tese com que se doutorou, “Profiles in Courage” (Retratos de Coragem), teve a ajuda do discreto e sempre brilhante advogado Sorensen na transformação em livro vencedor do prêmio Pulitzer de 1956. É o que dizem os historiadores e abelhudos da época.

Mesmo o ex-presidente Obama, que governou entre 2009 e 2017, advogado muito bom de texto, tinha auxiliares para a escrita de seus discursos e comunicados, embora ele mesmo os escrevesse e nem sempre aceitasse palpites. Como Kennedy, aliás.

Pena que tenha sido sucedido por um troglodita aloirado com pele acobreada artificialmente que desfere textículos nas redes sociais. (Serão mesmo dele?)

Nem é preciso lembrar Abraham Lincoln (1809-1865), também presidente dos EUA e assassinado como Kennedy, autor de ótimos textos num tempo em que a maioria dos políticos escreviam, eles próprios, o que queriam dizer, sem ajuda de ninguém.

Vale lembrar, sobretudo, o estilista Winston Churchill (1874-1965), o primeiro ministro que chefiou a resistência britânica contra Hitler e escrevia como historiador e artista da palavra que era.

De volta a Luizinácio, parece claro que ele não escreveu o artigo, embora o tenha assinado e, portanto, assumido sua autoria.

…Luizinácio terá definido, quando muito, os pontos a ressaltar e o desenvolvimento do tema do artigo para o jornal francês. Como faz a maioria dos políticos com seus ghost-writers. Às vezes mais de um…
    

E daí?
É sem dúvida inteligente e sempre teve o dom de aprender de ouvido. E a força dele se concentra na comunicação oral, na conversa, sobretudo exaltada. Quanto a escrever, por certo não é com ele. E o petê tem bons redatores, como seu ex-presidente, Rui Falcão, ex-chefe de redação da revista Exame.

Portanto, Luizinácio terá definido, quando muito, os pontos a ressaltar e o desenvolvimento do tema do artigo para o jornal francês. Como faz a maioria dos políticos com seus ghost-writers. Às vezes mais de um.

Tanto que de vez em quando esses políticos se surpreendem com o bom resultado do que assinam e divulgam como se deles. E hão de pensar, depois, pimpões: “Puxa, como sou inteligente!”

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JOSUE 2Josué Rodrigues Silva Machado, jornalista, autor de “Manual da Falta de Estilo”, Best Seller, SP, 1995; e “Língua sem Vergonha”, Civilização Brasileira, RJ, 2011, livros de avaliação crítica e análise bem-humorada de textos torturados de jornais, revistas, TV, rádio e publicidade

 

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