O “boom” das escolas médicas no Brasil. Por Meraldo Zisman
O “BOOM” DAS ESCOLAS MÉDICAS NO BRASIL
POR MERALDO ZISMAN
… Neste momento vivemos (quando o assunto é escolas de medicina) precisamente como os EUA há 100 anos. Naquela época, o governo criou uma comissão chefiada por Abraham Flexner (1855-1959) para visitar e elaborar um relatório sobre as 155 faculdades de medicina existentes no país e no Canadá. O resultado foi o fechamento de muitas…
O Brasil tornou-se o segundo país do mundo com mais escolas médicas:
- Índia – 381 Escolas Médicas (população 1, 324 bilhão)
- Brasil 303 Escolas Médicas (população 207,7 milhões)
- China 150 Escolas Médicas (população 1.379 bilhão).
O que significa: Índia: 0,3 escola/milhão de habitantes; Brasil: 1,5 escola/milhão de habitantes; China: 0,11 escola/milhão de habitantes (Ou seja, o Brasil tem 5 vezes mais escolas médicas por milhão de habitantes do que a Índia, e mais de 10 vezes o índice da China…)
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Em 1997, tínhamos 85 escolas médicas. Em vinte anos, mais do que triplicamos esse número, graças à explosão das escolas particulares, que hoje correspondem a mais de 60% do total, cobrando mensalidade que varia de R$5 mil a R$14 mil ou mais, por aluno.
Até dezembro de 2017, havia no Brasil 303 escolas médicas, das quais 172 eram particulares, 78 federais, 35 estaduais, 16 municipais e 2 públicas, somando 29 753 vagas oferecidas anualmente. Dessas, de 2000 a 2015, foram criadas 142 escolas médicas, sendo 51 públicas e 91 particulares.
No estado de Pernambuco, no ano em que me graduei, existiam apenas 2 escolas de Medicina: uma Federal e ao outra da FESP (Fundação do Ensino Superior de Pernambuco, hoje pertencente à Universidade de Pernambuco). Atualmente não saberia informar quantas escolas de medicina funcionam em meu Estado.
Neste momento vivemos (quando o assunto é escolas de medicina) precisamente como os EUA há 100 anos. Naquela época, o governo criou uma comissão chefiada por Abraham Flexner (1855-1959) para visitar e elaborar um relatório sobre as 155 faculdades de medicina existentes no país e no Canadá.
O resultado foi o fechamento de muitas das instituições enquanto o Governo e a sociedade, com base nos dados obtidos, resolveram financiar e monitorar as melhores instituições. No fechamento de seu relatório, Flexner escreveu:” As escolas médicas eram essencialmente iniciativas privadas cujo espírito e objetivo eram gerar dinheiro” …
Um homem que pagasse suas mensalidades praticamente tinha seu título assegurado, assistisse ele ou não às aulas. O resultado foi que o número de escolas de Medicina caiu de 131 para 31 nos 12 anos posteriores ao informe. Estamos num momento em que boa parte das faculdades de medicina não oferece o mínimo e não são exigidas para se adequar. Será que haverá professores qualificados para atender à demanda didática e operacional desses estudantes?
… No Brasil ocorre o contrário. Primeiro funda-se uma Faculdade de Medicina e depois se procura um hospital e ambulatórios ou outros serviços de saúde para complementar o treinamento do estudante. Medicina não se aprende com giz, cuspe ou quadro negro; o treinamento tem de ser presencial…
Relembro: não se aprende Medicina exclusivamente nos livros e nas aulas teóricas, mas sim na prática médico-hospitalar. A Residência Médica é imprescindível para a complementação didática da profissão.
Nas minhas andanças pelo mundo aprendi que as boas escolas médicas começam por bons hospitais onde se podem transmitir conhecimentos práticos aos acadêmicos de medicina.
No Brasil ocorre o contrário. Primeiro funda-se uma Faculdade de Medicina e depois se procura um hospital e ambulatórios ou outros serviços de saúde para complementar o treinamento do estudante. Medicina não se aprende com giz, cuspe ou quadro negro; o treinamento tem de ser presencial. Aprende-se nos ambulatórios, enfermarias, salas cirúrgicas, necrotérios, com preceptores e professores qualificados.
Necessitamos urgentemente de um relatório Flexner para impedir o funcionamento de estabelecimentos sem condições mínimas de assistência ou treinamento.
Achincalhar a profissão Médica é fácil quando se está bem de saúde…
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Meraldo Zisman – Médico, psicoterapeuta. É um dos primeiros neonatologistas brasileiros. Consultante Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha). Vive no Recife (PE).