Assustadoramente calmo e mortal. Por Paulo Renato Coelho Netto
Assustadoramente calmo e mortal
Por Paulo Renato Coelho Netto
Lembrei na hora a alma mais honesta do Brasil, outro presidiário que alega inocência por ir preso por algo que não era dele. Se existe um lugar no mundo cheio de gente inocente é na cadeia…
Com autorização judicial, vou a um presídio entrevistar traficantes. Quero saber como entraram nessa. Depois de uma conversa protocolar com o diretor, sou encaminhado a uma salinha onde trabalham assistentes sociais.
Parlatório, que isola os presidiários das visitas, só em filme americano. Aqui é olho no olho, sem guarda e algemas.
A mesinha que me separa do entrevistado não tem meio metro de largura. Se quisesse, o preso poderia ter me matado com minha própria caneta. Não seria o primeiro assassinato do meu entrevistado.
O rapaz conta que foi pego com 200 gramas de maconha que estavam com ele, mas não eram dele. Lembrei na hora a alma mais honesta do Brasil, outro presidiário que alega inocência por ir preso por algo que não era dele. Se existe um lugar no mundo cheio de gente inocente é na cadeia.
A mesinha que me separa do entrevistado não tem meio metro de largura. Se quisesse, o preso poderia ter me matado com minha própria caneta
Após me contar sua história, pergunto, por curiosidade no final da entrevista, se ele cumpria pena por outros motivos e o rapaz diz que sim, por homicídio.
Pergunto, então, como foi e o detento responde, sem alterar a voz, lacrimejar, franzir a testa ou demonstrar qualquer tipo de emoção. Ou seja, além de narcotraficante, estava entrevistando um psicopata assassino. Ele diz:
“Matei com a própria faca dele. Uma facada na cabeça. Caiu morto. Depois peguei uma pedra de uns 50 quilos e joguei na cabeça dele. Esmagou completamente. Depois peguei a faca e tirei todas as tripas dele. Joguei no mato. Depois… (e eu pensando, tem depois ainda?) arranquei as duas pernas dele pela virilha. Por fim… (por fim? Não pode ter um por fim!) arranquei os órgãos genitais da vítima”.
Nessa hora fiquei olhando em silêncio para o preso por uns dez segundos, que pareceram dez dias. Disse que estava bom, levantei, apertei a mão dele e agradeci a entrevista.
Próximo!
Dali em diante escondi minha caneta no bolso. Só usei o gravador.
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Paulo Renato Coelho Netto – Autor de nove livros, é jornalista pós-graduado em marketing. Atualmente, escreve reportagens investigativas para sites e revistas de circulação nacional.
É um pobre coitado, Renato. Você, que tem que ouvir essas monstruosidades.