A luz e as leis. Coluna Carlos Brickmann

A luz e as leis

Coluna Carlos Brickmann

EDIÇÃO DOS JORNAIS DE 8 DE ABRIL DE 2018

Nenhum cidadão pode alegar que desconhece a lei. Para que a lei esteja ao alcance de todos, consta em livros, na Internet, nos Diários Oficiais. Mas de que adianta conhecer as leis se não é possível entendê-las? O caso Lula foi dramático: com a mesma lei, o Supremo, que reúne juristas de porte e seus assessores, interpretou de maneiras opostas a prisão dos condenados em segunda instância. Houve ministro que mudou de opinião, houve ministro que tinha opinião e votou de acordo com a posição oposta.

A regra tem de ser clara, não é mesmo, Arnaldo? Quem defende e quem acusa podem divergir; mas juiz pode mudar de opinião no meio do jogo?

Está mais do que na hora de dar uma ajustada na Constituição de 1988. Trinta anos depois de promulgada, a maior parte das leis complementares não foi elaborada. O princípio está na Constituição, mas como aplicá-lo? E há coisas que não deram certo, como o foro privilegiado, que atravancam o Supremo e jogam qualquer julgamento para muitos, muitos anos à frente.

E se os magistrados do Excelso Pretório, vênia concessa, inobstante vezo consolidado, tentarem transformar seu jargão em algo inteligível, para que as sessões televisionadas nos ensinem, além da diferença de caimento entre as togas nacionais e as feitas sob medida, em Paris? Algo que não nos obrigue a ouvir intermináveis discursos e correr aos comentaristas para saber se o voto foi contra ou a favor – e se a sentença será ou não aplicada.

Urgente

É preciso, em suma, reavaliar e consolidar o ordenamento jurídico, para que as entrecruzadas teias se desenrolem de maneira mais lógica. Ou isso ou continuaremos sob o império da Lei, mas da lei que não temos como entender; e, em casos como o de Lula, transformando a análise em torcida.

O peso dos fatos

Muita discussão em torno da prisão de Lula, como se fosse o único caso. Não é: Lula enfrenta ainda o processo do sítio que não é dele em Atibaia, a acusação de receber R$ 12,5 milhões em propinas da Odebrecht, o caso de tráfico de influência para favorecer a Odebrecht em Angola (Taiguara, seu sobrinho, é também réu). É acusado de corrupção passiva na venda de Medidas Provisórias; e de tráfico de influência na compra, em que há suspeita de superfaturamento, de 36 caças suecos Grippen.

Caso condenado em todos os casos, as penas somadas estão próximas de cem anos de prisão.

Jogo de cena

Não se impressione com a defesa do PT, que pediu “medida cautelar” ao Comitê de Direitos Humanos da ONU, para que o Governo brasileiro impeça a prisão de Lula até que todos os recursos tenham sido esgotados. A ONU não pode alterar resoluções judiciais de países-membros.

Dia dos ex

Lula, dia 6, passou a foragido da Justiça; mas não é o único a ter problemas. No mesmo dia 6, a Coreia do Sul prendeu, por corrupção e abuso de poder, a primeira mulher a assumir a Presidência, Park Geun-hye. Ainda no dia 6, Jacob Zuma, que renunciou diante das acusações de corrupção na compra de armas, foi ao tribunal para o início do processo.

A vez dos tucanos

Enquanto Lula decidia o que fazer diante do início da pena, a Polícia Federal prendeu em São Paulo um ex-diretor da Dersa, estatal de rodovias, Paulo Vieira de Souza, ou Paulo Preto. Paulo Vieira de Souza é acusado de desviar recursos que teria encaminhado aos tucanos durante os governos de Alckmin, José Serra e Alberto Goldman; é acusado também de abastecer com recursos ilegais o atual ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes Ferreira. De acordo com executivos da Odebrecht, OAS, Queiroz Galvão e Andrade Gutiérrez, e o doleiro Adir Assad, Vieira de Souza cobrava 0,75% de propina em todas as obras no Rodoanel.

Nesse caso, a investigação começou com uma denúncia internacional: o Ministério Público da Suíça informou que ele tinha o equivalente a R$ 113 milhões em contas internacionais.

Segundo a defesa de Vieira de Souza, sua prisão nada tem a ver com a Operação Lava Jato. O PSDB garante que jamais teve qualquer vínculo com o ex-diretor de Engenharia da Dersa nas administrações Alckmin e Serra e apoia integralmente as investigações que estão sendo realizadas.

Brasil brasileiro

O excelente repórter Paulo Renato, colaborador desta coluna no Mato Grosso do Sul, chama a atenção para uma peculiaridade do Estado: nestas eleições, quem está em primeiro lugar nas pesquisas é quem mandava prender, o juiz Odilon de Oliveira, do PDT. Em segundo, vem quem já foi preso, o ex-governador André Puccinelli, do PMDB; em terceiro, quem é investigado por denúncia de corrupção, em delação da JBS, o atual governador Reinaldo Azambuja.

O caçador lidera a corrida e a caça perde.

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2 thoughts on “A luz e as leis. Coluna Carlos Brickmann

  1. Quadro A luz e as leis…quem entende este STF , sendo que os próprios não se entendem, quando não entendem o que tornam prolixo o mais simples objetivo de uma lei ou mesmo direito?
    São todos juízes? Não! Talvez o problema está nesta composição…; sou pelo fim da indicação política e por indicação via colegiado de juízes!
    A vez dos tucanos: espero que as investigações possam alcançar os autores das vultosas indenizações nas desapropriações pra agilizar a construção do Rodoanel e beneficiar a candidatura Serra ao Planalto…, uma das tramóias para se beneficiar destas, foi a obtenção antecipada de informação do projeto e, a aquisição de um terreno pelo então deputado Orlando Morando que, depois e, rapidamente, foi hipervalorizada…
    Abç
    Joselenes (Josélenes)

  2. Prezado jornalista. Juiz pode mudar de opinião durante a partida? Não, não pode. Os players se sentem traídos – particularmente aqueles que saem perdendo, pois os que ganham não reclamam muito, não. Chamo a atenção, no entanto, que só um mudou de opinião: Gilmar (o que não quer dizer nada, porque ele vai mudar de opinião ainda muitas vezes, a depender das enroscadas de Temer e sua turma). Rosa, porém, não mudou de opinião. Mudou o voto, mas conseguiu fazê-lo mantendo a opinião. Na próxima votação, talvez mude de opinião e de voto. Ou talvez mude apenas a opinião, mantendo o voto, ou vice-versa, sei lá. É pra isso mesmo que serve a retórica rococó: eles vão mudando tudo o tempo todo, ou não mudando nada de jeito nenhum, e a gente continua ser saber.

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