O meu Sócrates. Por Meraldo Zisman

O meu Sócrates

Meraldo Zisman

 … Um cachorro por nome Sócrates causa certa estranheza nas pessoas, mais depois, se acostumam. No caso, passou a ser um sinal acústico (entre mim e ele que quando pronunciado funciona qual aviso de campainha para ele vir correndo para mim, botar a língua de fora, balançar o rabo à espera de afago, lamber meu rosto, e quando acompanhado de um biscoito melhor ainda)…
Introdução e minha vontade realizada:
 Já era eu entrado em anos (mais de 70, à época) quando adotei meu cão Sócrates.
 A vontade de ter um cachorro da raça Labrador de pelo preto jamais me abandonou.
Resumo da ópera e discussão preliminar:
Comprei um cachorro como eu imaginava e o desejo se transformou em amizade e realidade. Batizei-o de Sócrates, não por nada, nem ofensa, ou ira do muito que já se escreveu sobre o filósofo grego, homônimo agora do meu cão. O fato é que estamos juntos há mais de 13 anos (escrevo este artigo em dezembro de 2017). Não é necessário fazer contas: tenho 83 anos de idade.
Quem ouve o nome Sócrates para um cachorro estranha. Para mim é uma homenagem. Filósofos temos muitos. Basta procurar no YouTube. Agora viralizou, como dizem por aí os showman que, transvestidos de oráculos, abundam e enchem os auditórios e até estádios de futebol.
Desenrolar da Estória
A caminho de um local denominado Aldeia* deparei-me com uma placa na beira da estrada:
Cães Labradores de Raça.
Vende-se.
SALE, aproveitem.
         Entrei e comprei um filhote para mim.
O motorista ficou sem entender nada. Nem da compra e muito menos da parada brusca e da volta súbita para casa, sem comparecer ao almoço que fora convidado na casa de um rico- chato, apenas por obrigação social para acudir um lar de idosos em crise.
Esclarecimento ou explicação:

Para falar a verdade não comprei Sócrates, fui por ele selecionado dentre os potenciais fregueses presentes. Terminado o processo de aquisição, o proprietário da “loja de cachorros”, garantiu enviar-me, pelo correio, o pedigree da nova aquisição.
Na verdade, o pedigree nunca chegou. E eu jamais tive interesse em procurá-lo. Para quê?  Deve ser falha do correio… e não acredito em diplomas ou genealogias.
 O retorno ao lar
O então filhote veio acomodado no meu colo. Não poderia usar cinto de segurança e não havia nenhum para adaptação. Aquela coisinha preta e buliçosa olhando para mim como se dissesse: Muito Prazer. Quem é você?
No caminho de volta para casa com minha preciosa carga, apesar da barulhada do tráfego congestionado e das buzinadas e xingamentos dirigidos às respectivas genitoras dos outros motoristas, eu escutava dentro de mim o som da voz do porteiro do canil proferindo:
“O senhor vai ser muito feliz com ele”.
A balbúrdia do mundo já não me incomodava, naquele instante. Ficara apenas martelando as palavras daquele provável cortador de cana transfigurado em abridor de porteiras e Buena-dicha. Se dizia aquilo por marketing ou coisa assemelhada pouco importava. Acertou no seu vaticínio. Expressões boas são sempre bem-vindas.
 Sócrates e o nome
  Um cachorro por nome Sócrates causa certa estranheza nas pessoas, mais depois, se acostumam. No caso, passou a ser um sinal acústico (entre mim e ele que quando pronunciado funciona qual aviso de campainha para ele vir correndo para mim, botar a língua de fora, balançar o rabo à espera de afago, lamber meu rosto, e quando acompanhado de um biscoito melhor ainda). E assim ficamos nós dois trocando caricias no pequeno apartamento que após a sua chegada nunca mais foi… uma morada solitária ou triste.
 Personalidade do Sócrates (canídeo)
 Meu Sócrates canídeo sabe quem é; o danado tem forte personalidade. Não preciso criar inventar, pensar, muito menos proferir sábios aforismos para ser respeitado. Tampouco filosofar ou assumir o formato de intelectual midiático, comum na atualidade.
  Meu Sócrates não tem discípulos ou jovens seguidores para transviar. Na hora de morrer não vai precisar tomar cicuta e, muito menos, precisa do atlético Platão para escrever o que disse ou não disse ou o que inventaram para que ele fosse “imortalizado”, curiosamente por uma Atenas que dizem foi nascedouro de uma inexistente e sempre buscada e jamais alcançada… a tal da Democracia.

Os desmancha-prazeres:

Toda alegria e felicidade geram os desmancha-prazeres que adoram desmentir todo e qualquer laivo de felicidade.  
 Dizem: Quem tem um cão vai sofrer muito: eles vivem pouco e etc.
Retruco. Sabe por quê não?
“Cães são como santos. Vêm à Terra com missão determinada” e por isso acabam logo seu serviço e vão embora; eles, ao contrário do Homo sapiens, já trazem sua missão impressa no DNA. Agora é que nós humanos conseguimos decodificar o tal do DNA e vai levar muito tempo para decifrar o que está nele escrito.

             Epilogo (emprestado):

“Os cães são o nosso elo com o Paraíso. Eles não conhecem a maldade, a inveja ou o descontentamento. Sentar-se com um cão ao pé de uma colina numa linda tarde, é voltar ao Éden onde ficar sem fazer nada não era tédio, era paz.” Copiado do escritor Milan Kundera (1929).
Obrigado por ser um dos poucos leitores que aqui chegaram. Meu Sócrates também agradece.
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23/02/2011. Credito: Cecilia de Sa Pereira/DP/D.A Press. Recife/PE. Vida Urbana. Materia sobre a visita do presidente nacional da Associacao dos Diplomados da Escola Superior de Guerra, o brigadeiro Helio Goncalves a sede dos Diarios Associados PE. O brigadeiro esteve acompanhado pelos senhores Eudes Souza Leao e Meraldo Zisman (NA FOTO).

Meraldo Zisman – Médico, psicoterapeuta. Foi um dos primeiros neonatologistas brasileiros. Consultante Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha). Vive no Recife

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