Rio sem lei. Coluna Carlos Brickmann
Rio sem lei
COLUNA CARLOS BRICKMANN
EDIÇÃO DOS JORNAIS DE DOMINGO, 24 DE SETEMBRO DE 2017
Bandidos descem a pé da favela onde estão aquartelados, no Rio, carregando nas mãos, sem disfarce, armas de grande potência. Estão indo para invadir a favela ao lado, onde pretendem estabelecer nova base de fornecimento de drogas. Não que a favela que pretendem conquistar não tenha seus próprios traficantes armados, que fornecem todos os tipos de droga a quem quer que tenha dinheiro para comprá-la; o que os invasores querem é se apropriar do tráfico dos vizinhos, embolsando novos lucros.
Na luta pela conquista de novas áreas, as balas às vezes atingem seus alvos, às vezes matam seus inimigos. Mas boa parte das balas atinge casas de consumidores, ou de cidadãos que não têm nada a ver com o tráfico mas se transformam em vítimas. Algumas balas matam e ferem crianças, atingem mulheres grávidas, fazem vítimas que tiveram a má sorte de estar no lugar errado, na hora errada. Os bandidos não se preocupam com isso: o problema é das vítimas, da família das vítimas, do governo que tem de atendê-las e isso num momento em que o Rio está totalmente sem verbas.
Há Polícia nas ruas, há Forças Armadas nas ruas. Os bandidos os ignoram. Sabem que são mais fortes; que dirigentes das Forças Armadas e da Polícia brigam entre si para ver quem manda mais. Parecem não perceber que quem manda mais são os bandidos. A propósito, a favela que tenta invadir as outras é a Rocinha. Bem em frente ao belo Hotel Nacional.
As ações oficiais
Mas ninguém imagine que o Governo (federal, estadual, municipal, seja qual for) esteja inerte. Não! Os governos mudaram o nome das “favelas” para “comunidades”, politicamente mais correto. Claro que “comunidade” não é a mesma coisa que “favela”: qualquer condomínio fechado, por mais chique que seja, é também uma comunidade. Mas vá lá: daqui a pouco poderão dizer que o número de favelas se reduziu, já que várias já favelas não são, mas comunidades. Os governos investiram também em unidades de polícia pacificadora, UPP; mas não é só de polícia que a favela precisa. Cadê os postos de saúde, as escolas, as quadras esportivas? Se a presença do Estado nas favelas se limitar à Polícia, à pura e simples repressão ao crime, não há como impedir os bandidos de comandar os homens de bem.
Dúvida pertinente
Há alguns anos, o repórter Gilberto Dimenstein perguntou que é que faríamos se a Argentina tomasse um pedaço do Brasil. Haveria protestos, conclamações à guerra, tudo o que fosse necessário para reaver o território ocupado. Perguntava: os bandidos tomaram uma parte de nosso país, na qual não permitem nem a entrada da Polícia. E completava: em que é que os traficantes, que ninguém incomoda, são melhores que os argentinos?
Mar mineiro
O deputado Jair Bolsonaro disse que, se for eleito presidente da República, o Brasil vai explorar suas riquezas – “quem sabe até abrindo uma saída para o mar para Minas Gerais”. Para que? Minas exporta minério de ferro em grandes quantidades, já exportou ouro até provocar inflação em Portugal, exporta manganês. Não tem saída própria para o mar, mas utiliza os portos de outros Estados, sem precisar cavar um rio salgado para chamar de seu. Bolsonaro acha que pode ganhar. Pretende levar os militares de volta ao poder, com eleições. Mas, se tentar construir um mar interior, não haverá no país quem não fique de olho nas concorrências públicas.
Os outros
João Dória e Geraldo Alckmin, um dos dois sai pelo PSDB. Lula não deve sair, mas não se sabe quem é o poste que escolherá para substituí-lo. Álvaro Dias é candidato pelo Podemos, novo nome do PTN. Joaquim Barbosa é disputado por vários partidos, já que, imagina-se, tem bom potencial eleitoral. Henrique Meirelles é do PSD; se sua política econômica continuar dando certo, pode ser o candidato do Governo (ele ou Paulo Rabello de Castro, presidente do BNDES). Ciro Gomes gostaria de ser o candidato de Lula, mas é difícil. Carlos Ayres Britto, ex-presidente do Supremo, não tem partido nem voto. Mas traria respeitabilidade à eleição.
As chances?
Ainda não dá para saber nem quem será candidato, quanto mais as possibilidades de vitória de cada um: falta um ano para as eleições.
Atrapalhado
Há políticos capazes de atravessar a rua para escorregar numa casca de banana na calçada oposta. Michel Temer, por exemplo, resolveu colocar em estudos o fim do horário de verão. Num país que paga contas de energia mais altas porque é preciso ligar as termelétricas, Temer acha razoável desperdiçar a economia de eletricidade trazida pelo horário de verão. Vale pelas piadas: por exemplo, Temer não quer que o por do Sol ocorra uma hora mais tarde porque, com sua aparência de vampiro, tem de evitar o Sol.
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Caro Brickmann. Se me permite, eu gostaria de trocar aqui com os leitores algumas palavras sobre o Horário de Verão, que é coisa séria, embora normalmente tratada muito superficialmente. Eu apreciaria que este comentário fosse publicado, dada sua importância (modéstia às favas, como diz aquele sujeito.) Bem, vamos lá.
1 – Definitivamente, o Horário de Verão (HV) NÃO serve à economia de energia. Em certas circunstâncias, pode até aumentar o consumo. A única coisa que poupamos é lâmpada, e convém notar que as lâmpadas fluorescentes e as de LED, usadas atualmente, são extremamente econômicas, e, no conjunto, constituem no máximo 1% da eletricidade consumida numa residência, e é dessa parcela ínfima que economizaremos menos de 1% ao mês durante o HV (ou seja, a economia é menor que 1 centavo numa conta de eletricidade de 100 Reais). Os outros 99% do consumo elétrico ficam por conta de geladeiras, chuveiros, lavadoras, ar condicionado, TVs, computadores, rádios, decoders, modens, alarmes, micro-ondas, formos elétricos, ferros elétricos, rádios-relógios, telefones sem fio, carregamento de celulares, etc., etc. São coisas cujo consumo independe do HV (embora, nos EUA e no Canadá, haja pesquisas mostrando que o uso de ar condicionado é muito maior com o HV, pois as pessoas passam mais tempo expostas a calor no período mais quente do dia, que é a tarde. Isso aumenta o consumo de eletricidade, pois o ar condicionado é o aparelho que mais consome energia numa casa, ou num escritório). No que diz respeito ao consumo da iluminação pública, por outro lado, não pode haver economia alguma, pois que suas lâmpadas se acendem sozinhas, obedecendo ao clareamento e ao escurecimento dos dias e das noites, e não aos hábitos civis de consumo. Os postes públicos não sabem ler as horas…
2 – Além da economia de energia (que, como expus aqui, simplesmente inexiste), costumamos apresentar como vantagens do HV basicamente dois argumentos: A- temos mais tempo para praia, piscina ou coisas do tipo, B- a iluminação natural torna a volta para casa mais segura nas periferias. Pois bem, precisamos nos desfazer dessas lendas urbanas. Vamos lá. A- tempo maior para o lazer independe de haver ou não o HV. Quem chega à sua casa às 19:00hs continua chegando às 19:00hs, continua indo dormir no mesmo horário, e uma hora de luz natural a mais, por si só, mais não leva ninguém à praia ou à piscina. Quem quer ir, simplesmente vai, com mais ou menos luz. Deve-se ressaltar, porém, que praias e piscinas no fim da tarde são um privilégio de uma parcela pequeníssima da população, pois nem todos têm piscinas à disposição e nem todo mundo que mora no litoral quer ir à praia no final de um dia de trabalho. A maioria das pessoas, quando volta para casa, quer mesmo é descansar. B- Utilizar o HV como Política de Segurança é tão estúpido quanto desonesto. HV pode ser usado como medida de poupança de energia, e é medida ineficaz! HV pode ser usado como medida de saúde pública, visando expor certa população ao sol, para fins de prevenção de suicídio, por exemplo, como ocorre nos países nórdicos onde há pouquíssima luz natural. HV também pode ser usado como um incentivo à indústria do turismo, como ocorre na América do Norte e na Europa (embora aí também se use como prevenção a esse tipo de suicídio causado por carência de iluminação natural). Mas, definitivamente, HV não pode ser usado para evitar assaltos ou outras formas de violência. Aliás, alguém aqui sabe de um único assalto evitado por causa do HV? A bandidagem por acaso começa a trabalhar uma hora mais tarde? Mesmo? Querem que a gente acredite nisso? Vamos deixar claro: quem oferece segurança pública é a Polícia. São as Políticas de Segurança Pública consequentes. Usar o HV para diminuir a violência urbana é coisa de classes políticas incompetentes para produzir verdadeiras políticas de segurança (como, inclusive, vejam só!,iluminação pública decente).
3 – Por último, quero lembrar o seguinte: o HV expõe todo mundo que está ativo durante as tardes a mais sol e mais calor. Em países como o Brasil, naturalmente super-ensolarados e extremamente quentes, o HV contribui decisivamente para o aumento no número de casos de insolação, de desidratação e de câncer de pele. Assim sendo, além de não economizar um centavo de eletricidade, o HV tende a elevar os custos da Saúde Pública, principalmente a longo prazo, dada a necessidade de atendimento aos casos de melanomas e carcinomas cutâneos causados pela exposição excessiva ao sol. Até onde sei, no entanto, o governo não distribui água mineral de graça para a população que derrete à luz do sol escaldante, nem, muito menos, oferece bloqueador solar. O que nos resta, como sempre, é apenas o prejuízo…
4 – O argumento referente ao uso de usinas termelétricas pode ser desconsiderado de plano. O uso dessas tralhas poluidoras tem muito mais a ver com a escassez das chuvas do que com uma hora a mais no relógio. Se faltar chuva, faltará eletricidade, e isso independe de haver ou não HV. A economia proporcionada por este, aliás, é zero.