“O teatro e a falta de público”. Por James Akel*
Cada dia mais produtores de teatro se preocupam com a falta de público nos espetáculos em São Paulo, considerada a maior cidade teatral do Brasil, mas que vive uma situação de penúria em produções.
Artigo publicado originalmente na Folha de S. Paulo, edição de 27 de setembro de 2015, Tendências/ Debates
Não se pode considerar um ou outro grande musical como sendo a realidade do setor. Até comédias, que no passado sempre foram sucesso de bilheteria, hoje têm dificuldade em cobrir contas de produção.
Se uma peça não tem projeto aprovado pela Lei Rouanet, que lhe permita captar patrocinadores que vão ter benefícios de isenção fiscal, o empreendimento conseguir pagar as contas é um ato de mágica.
Se conseguir aprovação pela Rouanet, vai ter que perambular por grandes empresas que tenham lucro o bastante para permitir destinar as verbas. Mas o projeto aprovado pela lei está longe de ser garantia de patrocinadores.
Agora menos ainda, pois muitas dessas megaempresas estão preocupadas com investigações da Justiça e da Polícia Federal e não têm mais lucro verdadeiro que lhes permita investir em teatro ou em outros ofícios artísticos. Contam-se às dúzias os projetos aprovados pela lei que não têm patrocinadores.
Vejam que curiosa a triste situação do presente e a interessante situação do passado.
Nos anos 1970, uma peça de teatro ficava em cartaz de terça a domingo com oito apresentações na semana. Nos dias atuais, é uma epopeia colocar a peça em cartaz às sextas, sábados e domingos.
A música popular brasileira era o grande sucesso nas TVs e nas rádios naquela década, além de ter grande vendagem de discos.
Os ídolos eram cantores e cantoras como Elis Regina, Jair Rodrigues, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Chico Buarque e muitos outros que preencheriam toda uma página. Nos dias atuais, os ídolos são os sertanejos e os funkeiros. Nada contra, mas o perfil do público atual está longe de gostar de teatro.
No tempo do regime militar, o teatro era, ao lado dos livros, o único espaço no qual o povo tinha contato com manifestações de protestos políticos e sociais.
Também nas décadas de 1960 e 1970 a cidade era uma delícia de ser frequentada à noite, quer se desejasse ir a um piano-bar ou jantar fora. Os anos 70 marcaram o auge das casas de música popular brasileira. E existia segurança pública.
Nos dias atuais, a paranoia da falta de segurança em tudo tomou conta da população, que tem enorme medo de sair de casa à noite sem saber o que pode acontecer.
Perfil de cultura do povo e falta de segurança pública, em suma, pode ser o binômio que causa a fuga do público das salas de teatro.
Lógico que o grande aumento de custo imobiliário, com aluguéis de prédios ficando muito caros e obrigando os donos de teatros a cobrar altos aluguéis pelas salas, também faz parte do cenário. Muitas vezes o preço do estacionamento ao lado do teatro tem custo maior que o do ingresso da peça. Assim fica difícil.
JAMES AKEL– É jornalista, escritor, autor, produtor e diretor de teatro. É autor e diretor da peça “Democracia sem Vergonha”, que entra em cartaz no sábado (3), no Teatro Ruth Escobar