A terra em que nasceste. Coluna Carlos Brickmann
A terra em que nasceste
Coluna Carlos Brickmann
EDIÇÃO DOS JORNAIS DE DOMINGO, 11 DE JUNHO DE 2017
Vamos esquecer um pouco a bandidagem de colarinho branco, a insegurança nas ruas, os delatores premiados: trocando uns ou outros nomes, o jornal do dia é igual ao da véspera, os telejornais apresentam há um tempão as mesmas cenas, variando apenas os personagens. E todos negam com veemência aquilo que todos sabem que é verdade, e aguardam com serenidade o decorrer dos processos – enquanto esperneiam para que todos eles virem de cabeça para baixo. Esperneiam, mas nem disso sabiam.
Vamos à raiz de tudo: o tumulto da estrutura legal do país. Há poucos dias, o Congresso promulgou a Emenda Constitucional 96, que autoriza as vaquejadas em todo o país. “Práticas esportivas” e “manifestações culturais” com bichos deixam de ser tidas como cruéis, e a vaquejada passa a ser “bem de natureza imaterial”. Há quem ache que puxar um boi pelo rabo, obrigando-o a correr entre dois cavalos, até que alguém o derrube numa área demarcada, é cruel. Mas não entremos no mérito da questão. O que aqui se discute é a introdução da vaquejada na Constituição.
Tratar-se-á, perguntaria o presidente Temer, de tema constitucional? E por que não o futebol, praticado por mais gente, em mais lugares? Se tudo cabe na Constituição, por que não substituí-la por uma lista telefônica, ou uma Wikitituição, em que cada um vai botando aquilo que acha sobre tudo que quiser? Sai mais barato e o resultado é o mesmo: não funciona.
Nosso exemplo
Originalmente, a Constituição republicana brasileira foi baseada na americana. A Constituição americana nasceu em 1789 com sete artigos, definindo os Três Poderes (Executivo, Legislativo, Judiciário), os direitos e responsabilidades dos Estados. De lá para cá houve 27 emendas, sendo as dez primeiras conhecidas pelo nome de Bill of Rights, em tradução livre Lista de Direitos.
No Brasil, a Constituição de 1988 tem 250 artigos, que sofreram de lá para cá cento e poucas emendas. A Constituição americana tem 228 anos; a brasileira, de 1988, é a sexta da República para cá. Mais uma vez sem entrar no mérito, a deles parece mais durável que as nossas.
Vai, dinheiro!
O ótimo portal jurídico Espaço Vital (www.espacovital.com.br) traz uma informação interessantíssima sobre a ladroeira (que todos sabiam que existia mas que agora vem sendo mais bem conhecida). O economista Cláudio Frischtak, da consultoria Inter.B, estudioso da infraestrutura brasileira, levantou o custo da corrupção em obras públicas no país, nos últimos 45 anos. Em valores corrigidos para a moeda atual, mas sem juros, a ladroeira atingiu algo como R$ 2,1 trilhões de 1970 até 2015. Um número de 16 algarismos, observa o portal.
Uma comparação: o Impostômetro da Associação Comercial de São Paulo, que marca a quantidade de impostos municipais, estaduais e federais pagos a cada instante em todo o Brasil (https://impostometro.com.br/) , marcava até 9 de junho, às 19h06, muito menos da metade da quantia roubada nos últimos 45 anos.
Voa, dinheiro
Há um motivo pelo qual a Operação Lava Jato está tão interessada na delação premiada do ex-ministro Antônio Palocci, e que não envolve nem bancos nem outras grandes empresas: é, isso sim, levantar o processo de liberação de aproximadamente R$ 8 bilhões do BNDES para a J&F, dona do JBS, Friboi, Swift, Seara, Vigor, São Paulo Alpargatas, Osklen e outras, entre 2007 e 2015.
Todo o processo de obtenção e liberação de verbas do BNDES, acreditam os investigadores, passou pelas mãos de Palocci.
O mundo gira
Há dois anos, o J&F pensou em entrar no setor da iluminação pública em São Paulo. Hoje tenta vender a Vigor e a Alpargatas para fazer caixa.
Humor no TSE
Primeiro, um momento de descontração: o pessoal das redes sociais descobriu que o ministro Hermann Benjamin, relator do processo de cassação da chapa Dilma-Temer, é parecidíssimo com duas personalidades nacionais: a deputada Luiza Erundina e o maestro Tom Jobim. Outra semelhança parece ter passado despercebida até agora: Benjamin é a cara da senhora que aparece no logotipo da franquia Casa do Pão de Queijo.
Guerra no TSE
Algumas frases dos duelos travados no TSE, durante o julgamento:
Hermann Benjamin: “Só os índios não contactados da Amazônia não sabiam que a Odebrecht havia feito colaboração premiada”.
Gilmar Mendes: “Um Barusco corresponde a US$ 100 milhões nesta corruptocracia”.
Hermann Benjamin: “Vossa Excelência, senhor presidente Gilmar Mendes, tem de pedir desculpas a si mesmo, pelas suas contradições”.
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Creia-me: se Temer fosse uma vaca – ou um boi -, a vaquejada não passava. Gilmarzão invocaria sua própria natureza ruminante e negaria o pinduricalho ao texto constitucional.
Prezado Carlos Brickmann,
“A terra em que nasceste”, de sua lavra, foi o “input” e oportunidade para que eu expressasse minha opinião, através do acróstico que copio em seguida.
Muito Obrigado!
Anibal Tosetto
A COLCHA DE RETALHOS
Aquela colcha de retalhos que tu fizeste
Costurando, juntando pedaço em pedaço…
O cancioneiro popular – sem dúvida alguma, inspira os
Legisladores fazedores de leis e emendas na
Carta Magna, acionados por oportunidades e malfeitos.
Hábeis em criar e reformar, são precisos ao costurar
As indispensáveis brechas entre os retalhos,
De forma que, à primeira vista, permaneçam ocultas
E, na Corte, quando o mais inspirado e arguto Ator,
Ruborizado de vergonha – ou não, ao saca-las das Leis
E da Magna Constituição, uma das partes interessadas
Terá, naquele exato momento, a plena certeza que
A decisão lhe será favorável. E se a vítima for a Nação?
Logo, as decisões políticas e calcadas nessas brechas,
Horripilam os Valores Morais e Éticos da Nação;
O cinismo, juntado às justificativas, pisca para os
Seletos membros de impunes seitas.
AHT
11/06/2017