Daqui não saio. Por Josué Machado
DAQUI NÃO SAIO
Por Josué Machado
“DAQUI NÃO SAIO!
DAQUI NINGUÉM ME TIRA!
ONDE É QUE EU VOU MORAR?O SENHOR TEM PACIÊNCIA DE ESPERAR!”
Foi mais ou menos o que disse em entrevista a “Veja” Michel Miguel Elias Temer Lulia, expressando surpreendente firmeza considerada a corda bamba em que se equilibra. Só não falou cantando em ritmo de carnaval, que não ficaria bem.
O título da entrevista foi:
“Não saio daqui. Não saio mesmo!”
Já havia dito isso antes, apontando (“enristando”, diria ele) os dedos nervosos em todas as direções como floretes d’antanho.
É a resposta temeriana ao agito que se criou com a publicidade dada à gravação feita por Joesley Safadão da conversa indiscreta no escurinho da garagem do jaburual palácio onde mora. Isso, por hora. Ou será por horas?
Enquanto não sai – e espera que não saia – a delação do amigo e bom rapaz da mala, Rodrigo da Rocha Loures, Michel Miguel se sente com forças para repetir “Daqui não saio!”
A exclamação obstinada lembra a marchinha de carnaval “Daqui não saio”, de 1949, de Paquito e Romeu Gentil, gravada pelo grupo “Vocalistas Tropicais”. Um grande sucesso que apontava um dos eternos problemas sociais da Pátria Amada, a falta de moradia para os mais pobres.
“DAQUI NÃO SAIO
Daqui não saio!
Daqui ninguém me tira!
Onde é que eu vou morar?
O senhor tem paciência de esperar!
‘inda mais com quatro filhos,
Onde é que vou parar?!…
Sei que o senhor
Tem razão de querer
A casa pra morar,
Mas onde eu vou ficar?!
Nesse mundo ninguém
Perde por esperar,
Mas já dizem por aí
Que a vida vai melhorar.”
A diferença entre Michel Miguel e o pobre morador cantante do carnaval de quatro filhos é que Temer tem cinco, mas só um, Michelzinho Miguelzinho, de sete aninhos, depende diretamente dele. E a família Temer por certo terá onde morar.
O problema é que Michel Miguel teme talvez ser obrigado a morar sem a família — coisa difícil, mas não impossível. Teme também que sua futura moradia solitária quiçá não venha a ser das mais aprazíveis e donairosas, como ele próprio diria.
Sê-lo-ia se o deixassem em paz com suas duas gordas aposentadorias.
(Parecem estar sob a mesma ameaça de mudança compulsória de endereço outros dois ex-presidentes, conforme augúrio de alguns. Pessimistas ou otimistas – depende da perspectiva. Seria manchete universal.)
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Josué Rodrigues Silva Machado, jornalista, autor de “Manual da Falta de Estilo”, Best Seller, SP, 1995; e “Língua sem Vergonha”, Civilização Brasileira, RJ, 2011, livros de avaliação crítica e análise bem-humorada de textos torturados de jornais, revistas, TV, rádio e publicidade