Todos em paz. Por Josué Machado

TODOS EM PAZ

Por Josué Machado

… o gosto pelo uso do verbo “restar”. Na longa sessão, os três desembargadores do Tribunal Regional da 4ª. Região o usaram algumas dúzias de vezes: restou confirmado, restou comprovado, restou publicado, restam demonstrados, restam provados, restou promulgada, restou condenado e por aí foi e foi e foi. Um cacoete jurídico, digamos.

Com o aumento da pena de prisão de Luizinácio, podem-se apontar duas curiosidades observadas no julgamento.
Do ponto de vista formal, apenas formal, a peculiaridade das penas de números quebrados: por que a rósea frescurinha dos anteriores “9 anos e 6 meses” e dos atuais “12 anos e 1 mês”?
Outra curiosidade foi o gosto pelo uso do verbo “restar”. Na longa sessão, os três desembargadores do Tribunal Regional da 4ª. Região o usaram algumas dúzias de vezes: restou confirmado, restou comprovado, restou publicado, restam demonstrados, restam provados, restou promulgada, restou condenado e por aí foi e foi e foi. Um cacoete jurídico, digamos.
Não se sabe por que a rejeição a “ficar”, um bom e honesto verbo de significado claríssimo, muito próximo de “permanecer”. Talvez considerem “ficar” simples demais, indigno de figurar em tão importantes peças.
Seja como for, estranho o gosto por “restar”, que tem como sinônimos ficar, persistir, manter-se, permanecer, faltar, escapar, resistir, sobrar e outros, a depender do contexto.
Estariam Suas Excelências — como gostam de ser chamados os desembargadores — tentando transmitir alguma mensagem pouco sutil a Luizinácio com a insistência no uso de “restar”? Ou a suposta mensagem seria inconsciente?
Porque esse verbo traz à lembrança imediatamente a sigla “R.I.P.”, de Requiescat In Pace (descanse em paz) em latim,  “Rest In Peace” em inglês e “Riposi In Pace” italiano.
Lembremos que o “rest” (to rest) inglês vem do francês “rester” (permanecer, ficar), filhote do latim “restare”, com o mesmo significado.
Os galicismos no inglês são lembrança que os ingleses não – NÃO – festejam nem um pouco dos 200 anos de dominação francesa da Inglaterra a partir do Século 11. É o que explica em parte o fato de o inglês, de base fundamentalmente anglo-germânica, ter uns 40% do vocabulário originário do francês e do latim, porque os romanos também dominaram a ilha.
Mas, de volta ao “restar” de Curitiba, nota-se que tudo isso é muito expressivo nestes dias solenes de esperanças e desesperanças, pois não?
Descansemos todos em paz. Mas bem vivos e alertas!

 

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JOSUE 2Josué Rodrigues Silva Machado, jornalista, autor de “Manual da Falta de Estilo”, Best Seller, SP, 1995; e “Língua sem Vergonha”, Civilização Brasileira, RJ, 2011, livros de avaliação crítica e análise bem-humorada de textos torturados de jornais, revistas, TV, rádio e publicidade

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