“Suposto” é a mamãezinha querida. Por Josué Machado

“SUPOSTO” É A MAMÃEZINHA QUERIDA

Por Josué Machado

Por que há tantos “supostos” no vocabulário da moçada de jornais, rádios e TVs?

Está na moda no jornalismo usar o adjetivo “suposto”  e o advérbio “supostamente” em relação a ocorrências variadas, principalmente policiais e políticas que, aliás, se confundem gloriosamente com frequência.

Tanto que, há alguns dias, ao comentar as imagens de dois policiais do Rio atirando em pessoas caídas, a repórter de rádio disse:

“Foram presos o sargento e o cabo que supostamente atiraram nos homens caídos”.

Sim, “supostamente”.

Por que “supostamente”?

Houve imagens nítidas da claríssima execução. Foram imagens feitas de longe talvez com celular por um observador sem dúvida acostumado a incursões como aquela.

No entanto, a arguta repórter disse que os policiais “supostamente” atiraram, embora todos tenham visto sair faíscas das armas na hora dos disparos.

O que é suposto?

Diz o Houaiss que SUPOSTO é algo ser admitido por hipótese; dado ou apresentado hipoteticamente; conjecturado.

É também coisa falsamente atribuída a alguém.

Entre as acepções de uso mais comum, é também algo fictício, falso.

Daí o exemplo do dicionário: “julgado por supostos delitos.”

Isto é, delitos ainda não comprovados.

Esse mau uso frequente de “suposto” e derivados no jornalismo resulta do temor de que afirmações definitivas possam ser comprometedoras. Em alguns casos, perigosas.

De fato, convém ser prudente, mas a prudência não deve ser desculpa para o escorregão na baba deslizante do ridículo.

Aliás, como curiosidade, vale lembrar que “suposto” tem por sinônimo “supositício”. E supositício é sinônimo do também adjetivo supositório. Não o substantivo, nome do medicamento sólido ou semissólido de forma cilíndrica que se introduz em certos orifícios corporais discretos e quentinhos nos quais liberam substâncias curativas.

Trata-se da segunda acepção de “supositório”, o adjetivo que significa: baseado em ou que contém suposição; supositício, hipotético, suposto.

Por exemplo:

O advogado desenvolveu a defesa a partir de argumentos supositórios”, como bem ensina o Houaiss.

Considerando a vernaculidade, “supositório” cairia bem num discurso de Temer Lulia, que se regozija com palavras raras. Dará tempo de ele o fazer, e o fará e o usará como quiser, como diria ele, até dezembro de 2018, quando entrega seu posto oscilante, driblando o processo de cassação da chapa Dilma/Temer, que se alongará ao infinito, sabemos todos.

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JOSUE 2Josué Rodrigues Silva Machado, jornalista, autor de “Manual da Falta de Estilo”, Best Seller, SP, 1995; e “Língua sem Vergonha”, Civilização Brasileira, RJ, 2011, livros de avaliação crítica e análise bem-humorada de textos torturados de jornais, revistas, TV, rádio e publicidade

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